Agência do Itaú: o banco passou a priorizar as linhas com menos risco de calote (Alexandre Batibugli/Exame)
Raphaela Sereno
Publicado em 29 de junho de 2017 às 07h00.
Última atualização em 29 de junho de 2017 às 07h00.
São Paulo — Durante os governos do PT, os bancos públicos serviram de instrumentos para expandir a oferta de crédito no mercado. Foi assim na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, que acionou o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal para ampliar a oferta de dinheiro e reativar a economia após a eclosão da crise financeira global de 2008. Foi assim também na administração de Dilma Rousseff, que recorreu aos bancos públicos para forçar a queda dos juros em 2012 e tentar gerar crescimento. A crise fiscal, porém, obrigou o governo a cortar programas e subsídios, e os bancos públicos refrearam a atuação. Uma pesquisa feita para a edição de MELHORES E MAIORES 2017 aponta que, no ano passado, o Banco do Brasil e a Caixa cortaram a concessão de crédito tanto para pessoas quanto para empresas. Os bancos privados também reduziram a vazão do dinheiro, dando prioridade às linhas com menos risco de calote. Ao final, quem perdeu mais foram as empresas de menor porte. A concessão de crédito para aquelas consideradas médias e pequenas pelos bancos (o critério de classificação varia de banco para banco) caiu 16% em 2016 em comparação com o ano anterior — para empresas grandes, os empréstimos cresceram 5% em termos reais.
O encolhimento do mercado de crédito tem como pano de fundo o fato de a taxa básica de juro Selic ter permanecido elevada por longo período, em uma situação de atividade econômica debilitada e minada pela baixa confiança. Ao final de 2015, a Selic atingiu 14,25% ao ano, e os cortes só começaram em outubro do ano passado. “O esforço do Banco Central para conter a inflação, mantendo a Selic alta, retraiu o crédito, desestimulou o consumo e desencorajou os investimentos das empresas”, diz Luiz Rabi, economista da Serasa Experian, empresa de análise de crédito. Além disso, a crise econômica provocou o aumento do desemprego — hoje, 14 milhões de brasileiros estão sem trabalho no país. Nesse cenário, mesmo as pessoas que não perderam o emprego ficam com receio de se endividar e não conseguir honrar os compromissos.
Com a desaceleração da economia e com o risco de aumento da inadimplência, os bancos subiram as taxas, encurtaram os prazos e passaram a exigir mais garantias. As micro, pequenas e médias empresas são as que mais se ressentiram dessas mudanças. “As grandes companhias têm mais facilidade de acesso a linhas externas de financiamento e aos recursos do BNDES”, diz o economista Roberto Troster.
No Itaú Unibanco, a carteira de crédito somava 552 bilhões de reais em dezembro de 2016, uma redução de quase 10% em relação ao final do ano anterior. Desde 2012, o Itaú tem privilegiado as linhas de menor risco. “No caso de pessoas físicas, enfatizamos os créditos consignado e imobiliário, linhas de menor risco e que apresentam menores taxas de juro”, diz Marcelo Kopel, diretor de relações com investidores do Itaú. O Bradesco adotou a mesma estratégia. Somando os dados do HSBC, adquirido em meados de 2016, o total da carteira de crédito do banco no final do ano passado atingiu 515 bilhões de reais, quase 9% mais que em dezembro de 2015. Na área de pessoas físicas, o crédito consignado também é o foco. “Para a carteira de cartões, adotamos uma política mais criteriosa na concessão de crédito para novos clientes”, diz João Carlos Gomes da Silva, diretor executivo do Bradesco. No crédito imobiliário, o banco aumentou a força de vendas por meio de parcerias com imobiliárias. “Simplificamos processos, diminuindo o prazo para contratações, e aproveitamos o volume de empreendimentos financiados pelo banco para impulsionar as vendas às pessoas físicas”, afirma Silva.
Neste ano, as perspectivas para o mercado de crédito continuam nebulosas em razão das incertezas com a crise política. Segundo o Banco Central, o estoque de empréstimos bancários em relação ao PIB chegou a 48% em abril deste ano, uma queda significativa em comparação com a fatia de 54% no final de 2015. A expectativa da Serasa é de um crescimento nominal de apenas 1% no volume de crédito do sistema financeiro. “Descontando a inflação, o resultado da carteira deverá ser negativo”, diz Rabi. “Nas linhas para pessoas físicas, o crescimento poderá ser acima da inflação, mas para as empresas ainda não haverá retomada.” Se a previsão se confirmar, será mais um ano de pouco crédito na praça.