Revista Exame

Por que os produtores franceses de vinho estão arrancando seus vinhedos?

A Europa enfrenta crise na produção de vinho. O foco em rótulos mais célebres — e caros — pode ser o futuro do Velho Mundo

 (Catarina Bessell/Exame)

(Catarina Bessell/Exame)

Publicado em 14 de setembro de 2023 às 06h00.

O governo francês anunciou uma verba de cerca de 200 milhões de euros para subsidiar vinicultores que arranquem vinhedos. O presidente Emmanuel Macron pelo jeito não gosta de vinho. Ou será que foram os consumidores que diminuíram seu apetite pelo vinho francês? Outra má notícia para a França, eterno centro mundial de vinhos, é que perdeu a coroa de maior mercado de vinhos do planeta para os Estados Unidos, com seus exuberantes cerca de 70 bilhões de dólares anuais em vendas.

Bom, mas a Itália produz ainda mais vinho do que a França. E até agora não consta que esteja arrancando os cabelos, ou melhor, parreiras. Ou será questão de tempo?

Mas vejam o paradoxo. Da Champagne e da Borgonha ouvimos que ambas sofrem pressão contrária, para aumentar sua área em vinhas. Isso porque o prestígio com os consumidores e os preços de seus vinhos têm subido rapidamente. Os hot spots (e ponha quente nisso) são os produtores ícones da Borgonha e seus grand cru classées, sendo um ícone o Domaine de la Romanée-Conti. No grupo de rótulos mais especiais, eles triplicaram ou mais seus preços em dólares nos últimos dez anos. Também o Champagne, especialmente no nicho das cuvées especiais, tem visto preços para cima.

A revolução do vinho a partir de 1960

O problema parece concentrar-se, quem diria, na toda poderosa Bordeaux. Porém, o arranca vinhas é inimaginável para supressão de vinhedos do Château Lafite -Rothschild ou de qualquer grand cru classé e vinhedos bordaleses de maior qualidade. A crise pegou na gama baixa, dos vinhos mais correntes e vulgares. Onde no passado recente houve grande incentivo para aumento de área de vinha. O pêndulo mudou de lado, e no movimento reverso os excedentes de vinhos vulgares foram primeiro à queima, isto é, à destilação para virar álcool. Mas nem assim o excesso de liquidez, o lago de vinhos, enxugou. Precisaram de uma pegada mais hawkish. Agora a ordem é arrancar as vinhas.

Bom, mas a maré verdadeira ao fundo desse movimento foi a revolução da indústria e do consumo de vinhos que ocorreu no mundo a partir da década de 1960. As curvas de consumo per capita são discrepantes nos segmentos dos vinhos correntes e dos mais qualificados. Caiu o consumo de vinho vulgar e cresceu o dos diferenciados.

Paralelamente, aumentou drasticamente a área de vinhas no planeta, com a afluência da produção do Novo Mundo e também maior na Europa. Nos vinhos mais qualificados, o crescimento da oferta foi acompanhado pela demanda. Nos mais correntes, não. Formou-se uma represa de vinho sem mercado no mundo. E nesse segmento o vinho francês apanha ainda mais, pois seus congêneres do Novo Mundo e das regiões europeias mais quentes, tudo indica, são mais procurados pelos consumidores mundo afora. Sem falar no custo de produção francês mais elevado.

Fato é que franceses e europeus em geral bebem cada vez menos vinho — especialmente os mais de entrada. Assim, como jamais pregaria aos franceses para fazerem melhor vinho, pois são indiscutivelmente os top do mundo, em vez de pagar para arrancar vinhas, Macron deveria dizer a seus compatriotas para beberem mais vinho! 

Acompanhe tudo sobre:VinhosFrançaItália

Mais de Revista Exame

Linho, leve e solto: confira itens essenciais para preparar a mala para o verão

Trump de volta: o que o mundo e o Brasil podem esperar do 2º mandato dele?

Ano novo, ciclo novo. Mesmo

Uma meta para 2025