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A nova era da China deve ser marcada pela mão forte do regime

Com o fortalecimento de Xi Jinping no comando da China, o país entra em uma nova fase de expansão e busca aumentar ainda mais sua influência global

O presidente chinês Xi Jinpingno Congresso do Partido Comunista: o líder mais<br /> importante desde Deng Xiaoping | WANG ZHAO/AFP PHOTO /

O presidente chinês Xi Jinpingno Congresso do Partido Comunista: o líder mais<br /> importante desde Deng Xiaoping | WANG ZHAO/AFP PHOTO /

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Da Redação

Publicado em 2 de novembro de 2017 às 05h34.

Última atualização em 2 de novembro de 2017 às 05h34.

Os líderes das duas maiores economias mundiais vivem momentos políticos opostos. No Ocidente, o presidente americano, Donald Trump, se vê ameaçado pelo avanço da investigação que analisa o possível envolvimento da Rússia na campanha eleitoral americana. No fim de outubro, o ex-chefe de campanha do republicano, Paul Manafort, foi indiciado por lavagem de dinheiro e evasão fiscal por causa de pagamentos recebidos de políticos ucranianos pró-Rússia. Já no Oriente o presidente chinês, Xi Jinping, só aumenta seu poder e estará mais fortalecido do que nunca quando se encontrar com Trump no início de novembro, durante a viagem do presidente americano pela Ásia. No Congresso do Partido Comunista na China, ocorrido em outubro — o maior evento político do país —, Xi Jinping firmou-se como um dos maiores líderes desde a Revolução Comunista de 1949, ao lado de Mao Tsé-tung (1893-1976) e Deng Xiaoping (1904-1997). Nada mal para quem governa um país de 1,3 bilhão de habitantes e uma economia de 11 trilhões de dólares.

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O Congresso do Partido Comunista ocorre a cada cinco anos e nele são definidos os ocupantes dos cargos mais altos do regime e os rumos que o país deve tomar nos cinco anos seguintes. O encontro deste ano delegou ao líder chinês o controle absoluto da guinada econômica, estratégica e militar do país. Os analistas do Ocidente já falam até numa nova era chinesa, a “xitocracia”. A julgar pelos primeiros cinco anos de Xi no poder, a nova fase deverá ser marcada pela mão forte do regime. “A intervenção estatal na economia deve aumentar ainda mais neste segundo mandato de Xi, com estímulo a setores estratégicos, como o de alta tecnologia, seguindo uma lógica de governo, e não de mercado”, diz Scott Kennedy, especialista do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, de Washington.

Apesar da desaceleração no crescimento do PIB nos últimos anos, a renda per capita dos chineses aumentou 30% na era Xi. O enriquecimento, complementado pelo combate à corrupção, rendeu popularidade ao líder chinês, que tratou de aproveitar o primeiro mandato para se livrar de desafetos políticos. Cerca de 70% dos 400 integrantes do Comitê Central do Partido Comunista foram trocados.

No Congresso, o partido dobrou a aposta em Xi para tocar esta segunda fase da abertura econômica iniciada em 1978 por Deng Xiaoping. O nome e as ideias de Xi foram incluídos no estatuto do partido, uma forma simbólica de equipará-lo ao líder revolucionário Mao Tsé-tung. Outro sinal de prestígio foi a nova configuração da cúpula partidária. Não houve o anúncio de um sucessor, como costuma acontecer. É um indicativo de que Xi pode ficar no poder além de 2022, quando termina seu mandato — o que abriria uma exceção às regras em vigor desde o fim dos anos 80.

O escolhido

O fenômeno Xi é fruto de uma crise no partido que eclodiu em 2012, quando o regime estava acuado. Na área econômica, o baque da crise de 2008 reduziu as exportações chinesas, colocando em xeque o modelo que sempre ancorou o crescimento do país. No plano político, a hegemonia do partido estava ameaçada pelos escândalos de corrupção, pelo surgimento de políticos reformistas e, em especial, pelo temor de que movimentos pró-democracia, como a Primavera Árabe, contaminassem os jovens chineses.

Obra em Xangai: o desafio de Xi é estimular a China a investir menos e consumir mais | Johannes Eisele/AFP PHOTO

A queda de um importante líder reformista e popular, Bo Xilai — afastado após sua esposa ser acusada pela morte de um empresário inglês —, facilitou a nomeação de Xi para comandar o país. Blindado, ele assumiu o posto no final de 2012, acumulando o cargo de secretário-geral do Partido Comunista, o comando do Exército e a Presidência do país. Desde Mao, nenhum outro líder havia concentrado tanto poder. Xi usou sua autoridade para fazer reformas e lançar uma ofensiva contra a corrupção. De 2012 para cá, mais de 1,2 milhão de pessoas foram investigadas e punidas. O líder chinês aproveitou a faxina para reestruturar setores-chave.

Na área militar, afastou 60 generais do Exército, unificou as Forças Armadas e, sem alarde, aumentou a frota naval no Mar do Sul da China, por onde passam 90% das exportações chinesas, numa clara ameaça à hegemonia militar americana no Pacífico. A maior atuação, porém, foi na área econômica. Xi liderou um processo de transição do modelo chinês com o objetivo de fazer o país deixar de ser um exportador de produtos. Entre as medidas tomadas, duas se destacam: a primeira foi o estímulo ao consumo interno e ao setor de serviços. Para isso, desvalorizou o -iuane e facilitou o acesso ao crédito para empresas e pessoas físicas. Tudo bancado com parte das reservas de 4 trilhões de dólares, acumuladas durante décadas de superávit comercial. Mesmo com a queda nas exportações dos últimos anos, a economia chinesa cresceu 6,7% em 2016.

No plano internacional, Xi lançou um projeto para construir uma gigantesca rede de infraestrutura com corredores comerciais inspirados na antiga Rota da Seda, conectando a China, por terra e mar, a 60 países da Ásia, da Europa e da África. A iniciativa, batizada de “Um Cinturão, Uma Rota” (One Belt, One Road, em inglês), prevê a execução de 900 obras, entre portos, rodovias, aeroportos, ferrovias e usinas, para exportar os produtos chineses e ampliar a influência nesses países. Os investimentos poderão chegar a 5 trilhões de dólares até 2049.

Outras medidas estruturais reforçaram a transição do modelo econômico chinês. Uma delas foi o estímulo ao desenvolvimento de energia renovável para reduzir a poluição e a dependência da China dos combustíveis fósseis. Um exemplo é a geração de energia solar. Apenas no ano passado, a produção aumentou em 35 gigawatts, praticamente a mesma  produção de energia solar da Alemanha. Outra medida foi o estímulo de investimentos estatais em empresas privadas — uma estratégia polêmica que lembra a usada pelos governos do PT no Brasil com recursos do BNDES. Conglomerados privados foram estimulados a fazer aquisições no exterior com empréstimos de bancos estatais.

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Economistas, no entanto, alertam para as consequências da gastança. Segundo dados do FMI, o nível da dívida, incluindo governo, famílias e empresas, dobrou nos últimos dez anos e hoje equivale a 265% do PIB. Mesmo com o alto endividamento, o governo não deve mudar a política para as empresas estatais, que respondem por metade da produção. “O governo Xi claramente pretende canalizar os recursos do setor privado para o estatal, seja para financiar a construção da rede de infraestrutura na antiga Rota da Seda, seja para preservar o risco de calote aos bancos estatais que liberaram empréstimos para as aquisições no exterior, que não estão dando o retorno esperado”, diz Heiwai Tang, economista da Universidade Johns Hopkins, de Washington.

Mais preocupantes para o Ocidente são as ambições estratégicas de Xi anunciadas no encerramento do Congresso: a de transformar a China numa potência com alcance global até 2049, ano do centenário da revolução. Xi foi claro. Seu lema, “Socialismo com características chinesas para a nova era”, inscrito no estatuto do partido, passará a ser oferecido “como uma opção a outros países” — numa ameaça à hegemonia dos Estados Unidos. O maior desafio, porém, ainda está dentro de casa: manter um crescimento econômico elevado sob um regime que sufoca o setor privado e controla a sociedade. 

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