Fábrica da BMW em Santa Catarina: a companhia vai exportar parte da produção local (Germano Luders/Exame)
Da Redação
Publicado em 1 de julho de 2016 às 16h25.
São Paulo — No auge do intervencionismo do governo Dilma Rousseff em diferentes setores da economia, no fim de 2012, foi lançado mais um plano de incentivo para as montadoras. O objetivo era gerar empregos no Brasil dando benefícios fiscais às empresas que montassem fábricas de automóveis aqui e usassem conteúdo nacional em peças e serviços.
Assim que o plano foi anunciado, as montadoras correram para dizer que a medida seria boa para os consumidores, porque permitiria a redução dos preços de uma série de carros. Como a ajuda valia mesmo antes de a fábrica ficar pronta, Audi, BMW e Mercedes-Benz aproveitaram o alívio tributário para baixar até 30% dos preços de alguns modelos e, assim, elevar as vendas.
A alegria dos consumidores, porém, durou pouco. Justamente quando as fábricas ficaram prontas, as montadoras voltaram a reajustar as tabelas. Em muitos casos, o efeito do incentivo fiscal praticamente sumiu. Apenas neste ano, os preços aumentaram de 6% a 8%, em média. Uma combinação de fatores levou as montadoras a frustrar o sonho do carrão acessível.
A alta da inflação e das tarifas de energia e a desvalorização do real — que fez aumentar o preço das peças importadas — elevaram os custos das empresas. Além disso, com a queda nas vendas, a maioria das fábricas está com capacidade ociosa, o que dificulta a redução dos preços, já que torna as operações menos rentáveis.
“Estamos revisando para baixo nossa projeção de resultados para este e para o próximo ano. Deveremos vender menos”, diz o alemão Jörg Hofmann, presidente da Audi no Brasil, montadora alemã de luxo que voltou a fabricar no país no fim de 2015. As vendas da marca caíram 24% de janeiro a maio de 2016. No mesmo período, a BMW vendeu 30% menos; a Jaguar Land Rover, 8%; e a Mercedes, 28%.
As empresas não dizem o que pretendem fazer com os preços daqui para a frente, mas a Land Rover, que inaugurou sua fábrica em Itatiaia, no sul do Rio de Janeiro, no dia 14 de junho — a primeira fora do Reino Unido —, já começa a vender sem descontos.
Apesar da piora nos resultados, as montadoras de carros de luxo — que custam de 100.000 a 300.000 reais — não estão revendo seus planos de negócios de forma drástica. Nenhuma delas fez demissões em massa nem deu férias coletivas aos funcionários, como ocorreu com praticamente todos os concorrentes mais populares.
A BMW decidiu aproveitar a capacidade ociosa de 50% na fábrica de Araquari, em Santa Catarina, para produzir um lote de 10.000 automóveis modelo X1 XDrive 28i, a ser exportado para os Estados Unidos. Além disso, parou de abrir concessionárias. A Land Rover disse não ter alterado seus planos.
A capacidade de produção da fábrica — que fará dois modelos, Range Rover Evoque e Discovery Sport — é de 24.000 unidades por ano. A montadora vendeu pouco mais de 10.000 veículos no país em 2015. “Confiamos no potencial do mercado brasileiro.
As vendas de veículos premium respondem por uma pequena fatia do mercado aqui e deverão crescer no futuro”, afirma Frank Wittemann, presidente da Land Rover na América Latina. As vendas de carros de luxo representam apenas 3% do total de automóveis comercializados no Brasil. Nos Estados Unidos e na China, a proporção está em torno de 10%. Na Alemanha, chega a 30%.
A Audi e a Mercedes já haviam tentado aproveitar esse potencial no passado — sem sucesso. Em 1999, a Mercedes passou a produzir o modelo Classe A na fábrica de Juiz de Fora, em Minas Gerais — o primeiro carro fabricado pela empresa no Brasil. Mas as vendas ficaram abaixo do esperado, em parte porque o carro era visto como caro demais pelo que oferecia.
A montadora acabou suspendendo a fabricação local em 2010. Hoje, a unidade de Juiz de Fora produz apenas caminhões. Por que agora a Mercedes espera um desempenho melhor? “Apostamos em modelos Classe C e no GLA, que já são sucesso de vendas”, diz Holger Marquardt, diretor-geral da divisão de automóveis da Mercedes-Benz na América Latina e no Caribe .
A Audi começou a produzir seu modelo de entrada, o A3 Sedan Attraction 1.4, em São José dos Pinhais, no Paraná, também em 1999. As projeções de vendas, porém, eram otimistas demais para a época, e a demanda fraca não tornou a operação rentável. “Naquele momento, carro com ar-condicionado era de luxo. Hoje, o equipamento está presente em praticamente todos os modelos.
O aumento do poder aquisitivo dos consumidores abriu espaço para montadoras como Audi e Mercedes, que têm como vender mais no Brasil de hoje”, diz Augusto Amorim, diretor da consultoria especializada no setor automotivo IHS. A relativa tranquilidade das montadoras de carros de luxo em meio à crise se devia ao fato de que seus resultados só começaram a piorar de fato neste ano.
Em 2015, enquanto as vendas de automóveis caíram 24%, as de Audis e Mercedes aumentaram mais de 40%. A BMW cresceu 5% e a Land Rover teve retração de 6% (ainda assim, mais branda do que a média do mercado).
“Em geral, quem compra esses carros não usa financiamento e, portanto, não deixa de comprar quando os juros sobem, o que acontece no segmento econômico”, afirma Raphael Galante, consultor da Oikonomia, especializada no setor automotivo. Recentemente, o agravamento da crise levou muitos desses consumidores a cortar gastos e, por isso, as vendas de carros mais caros caíram.
Também conta a favor dessas empresas o fato de o investimento necessário para montar fábricas de carros de luxo ser menor do que o gasto nas de automóveis populares, porque a produção é maior no segundo caso. A expansão da unidade da Nissan em Resende, no Rio de Janeiro, custará 750 milhões de reais, o mesmo valor que a Land Rover usou para construir sua fábrica inteira.
Além disso, pelo menos até agora, elas contam com o incentivo fiscal do governo. Aos consumidores que sonharam em pagar mais barato para ter seu carrão, só resta mesmo um lembrete: quem mandou acreditar no governo?
Atualização: Texto corrigido em 1º/jul/2016 com o cargo correto do executivo Holger Marquardt.