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Na Califórnia, a competição é uma droga

Plantadores legais de maconha da Califórnia foram contra a liberação da droga. Para eles, a legalização é sinônimo de mais produtores e menos lucros

Maconha na Califórnia: todos contra a "walmartização" do setor (Justin Sullivan/Getty Images)

Maconha na Califórnia: todos contra a "walmartização" do setor (Justin Sullivan/Getty Images)

DR

Da Redação

Publicado em 17 de março de 2011 às 10h14.

Para o restante dos americanos, os californianos são considerados excêntricos, criativos, vanguardistas e libertários. Por isso, causou certa surpresa quando, no começo de novembro, o “não” venceu o referendo sobre a legalização da maconha para uso recreativo — contrariando inclusive pesquisas de opinião.

Mais estranho ainda foi o resultado em algumas localidades com forte presença de produtores legais de maconha, vendida em lojas autorizadas para pacientes com problemas como falta de apetite, dor crônica, alta pressão nos olhos ou insônia. Na região conhecida como Emerald Triangle, o celeiro da maconha americana, localizado ao norte de São Francisco, o “não” venceu nos três condados, inclusive em Mendocino, onde mais da metade da economia depende da erva.

“Esse foi o resultado que nos deixou mais frustrados”, diz Dale Sky Clare, porta-voz do movimento Sim, que formulou a campanha e recolheu as assinaturas para a realização do referendo.

Independentemente do juízo que se faça sobre a legalização de uma droga como a maconha, o caso californiano lança luz sobre os efeitos da economia de escala. A recusa dos atuais produtores em ampliar o mercado consumidor tem uma explicação economicamente lógica — nada a ver com as piadas maldosas que ligaram o resultado da votação nesses condados com supostos efeitos alucinógenos da droga.

O setor está nas mãos dos chamados mom and pop growers — “produtores papai e mamãe”, numa tradução livre. São famílias donas de pequenas propriedades agrícolas, uma das exigências da atual lei. Para elas, a ampliação do mercado significaria o início do que chamam de processo de “walmartização”: grandes produtores entrariam no mercado, a competição certamente aumentaria e o preço da maconha despencaria.

“Os produtores ficaram com medo de perder seu sustento”, diz Dale Geiringer, Ph.D. em regulação de drogas pela Universidade Stanford e um dos autores da lei que legalizou a maconha medicinal na Califórnia em 1996, a primeira do país. Hoje, outros 14 estados permitem a venda da droga para pacientes com prescrição médica.


Uma pesquisa do centro de pesquisas americano Rand Corporation dá razão aos pequenos produtores. Uma eventual legalização para fins recreativos faria o preço de 1 grama de maconha cair dos atuais 16 dólares para pouco mais de 1 dólar. A queda não viria dos mom and pop growers, cujos custos se manteriam os mesmos.

Viria dos proprietários de grandes fazendas mecanizadas e com mais poder para negociar preços de adubos e sementes. Os pequenos agricultores teriam perdas também no front fiscal. “Com a legalização, viriam taxas altíssimas, comparáveis às do álcool e do tabaco — e o fim de nossos lucros”, diz o agricultor Tucker Jones, de 62 anos, fornecedor de maconha para lojas autorizadas no condado californiano de Trinity.

Saída pelo turismo

Outro fator que mobilizou apoio ao “não” foi o temor de que, com a legalização, a droga californiana pudesse abastecer o mercado negro de outros estados. “A queda do preço da maconha provavelmente faria com que muitos dos atuais pequenos produtores fossem buscar consumidores no restante dos Estados Unidos, onde o uso da droga para fins recreativos continua sendo proibido”, diz Joseph Burguer, presidente da Associação dos Produtores do condado de Humboldt, também no Emerald Triangle.

Apesar de toda a resistência dos mom and pop growers, o movimento em favor do “sim” não desistiu. Pretende colher novamente as 380 000 assinaturas necessárias para a realização de outro referendo. De acordo com o raciocínio deles, se a votação ocorrer no mesmo dia da eleição presidencial de 2012, o comparecimento em maior número de jovens será capaz de reverter o resultado.

A jornalista e ativista do movimento pró-legalização Kym Kemp já tem até um plano de salvamento para os atuais produtores. Segundo ela, o Emerald Triangle, colado ao Napa Valley, região de vinhedos na Califórnia que atrai mais de 4 milhões de visitantes por ano, poderia seguir o mesmo caminho, com direito a visitas às plantações de maconha e sessões de degustação.

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