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Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2011 às 11h40.
Jogos de empresas não são novidade no treinamento de executivos. Mas não é todo dia que se encontram operários aprendendo como os custos de produção podem ter impacto nas vendas. Ou então simulando o desenvolvimento de estratégias de marketing para os produtos da companhia. Desde o ano passado, os 3 000 funcionários da 3M do Brasil estão envolvidos em um treinamento destinado a fazer com que conheçam o negócio da empresa como um todo, e não somente aquela pequena parcela de sua contribuição individual no processo produtivo. Informação mais participação é igual a motivação, acredita a 3M: quanto mais os funcionários conhecerem a empresa, melhor a entenderão, e, quanto melhor a entenderem, melhor se sentirão no trabalho.
Dentro do mesmo espírito, os resultados da subsidiária da 3M - Minnesota Mining and Manufacturing - estão expostos na entrada do restaurante da fábrica de Sumaré, em São Paulo, onde fica a sede da companhia. Lá, todos podem acompanhar o desenvolvimento das vendas e checar quanto falta para que a empresa atinja a meta de crescer 20% em 1997, alcançando uma receita de 502 milhões de dólares. O cumprimento desse objetivo, é claro, está diretamente ligado ao bônus anual de participação nos lucros recebido por todos os empregados. "Ao contrário do que acontece em outras empresas, os números da 3M não são uma caixa-preta", diz Luiz Antonio Ikuno, engenheiro da área de projetos mecânicos
Abertura e transparência são importantes, mas o que chama a atenção na 3M, sobretudo nos dias de hoje, é sua quase teimosa insistência em continuar seguindo uma política conservadora de manutenção do emprego. Nenhum funcionário que tenha errado em alguma coisa é demitido antes de ter tido a chance de planejar com seu chefe uma estratégia para consertar o erro e se conscientizar da necessidade de mudar. Desde que não se trate de algo que mereça demissão por justa causa, todos têm direito a duas oportunidades de se recuperar. Somente ganhará o bilhete azul quem não conseguir se emendar.
Funcionários com mais de 10 anos de casa só podem ser dispensados com autorização da matriz, em Saint Paul, nos Estados Unidos. Se a dispensa não puder ser evitada, a empresa tenta minimizar seu impacto psicológico. Quando a 3M fechou uma unidade, em 1990, os empregados foram sendo transferidos ou dispensados aos poucos, enquanto trabalhadores temporários eram colocados em seus lugares. Objetivo: não ter nenhum funcionário da 3M trabalhando no dia em que a unidade fechasse as portas.
A estabilidade favorece carreiras longas e lentas, que vão sendo desenvolvidas com base em muito treinamento e chances de mudança de área. A empresa tem por política anunciar qualquer nova vaga entre os funcionários durante uma semana. Somente se não houver candidatos habilitados é que se buscarão talentos externos. Os chefes não podem impedir uma transferência se o funcionário desejar mudar de área. Mas não confunda estabilidade com marasmo. Na 3M, os empregados são constantemente incentivados a dar idéias que possam melhorar o negócio. "Todos aqui aceitam desafios e são incentivados a dar opiniões sobre o trabalho", diz o operador de máquinas Odair Frizoni. Além das promoções internas, a 3M recruta anualmente trainees nas universidades. No primeiro ano de trabalho, eles dividem o expediente entre as suas funções e cursos nos quais se familiarizam com técnicas de administração. Somente um ano depois começam a participar de projetos nas suas áreas.
A ideologia da empresa reza que não se deve descartar nenhuma idéia apresentada, mesmo que ela possa, à primeira vista, parecer fora de propósito. E se der certo? Este, na verdade, é um dos credos fundamentais da 3M em todos os países onde atua - e sobre o qual construiu sua reputação de ser uma das empresas mais inventivas do mundo, capaz de lançar no mercado uma novidade e meia por semana. (No Brasil a 3M fabrica 25 000 itens diferentes, de fitas adesivas a painéis para caminhões. Em todo o mundo são 60 000 produtos.)
Seguindo esse catecismo, as pessoas que trabalham em laboratórios de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos têm 15% de seu tempo livre para desenvolver projetos diferentes daqueles nos quais estão trabalhando no dia-a-dia. Muitas descobertas acontecem por acaso nas sessões de experiências sem compromisso. Foi assim, por exemplo, que um pesquisador da matriz descobriu o impermeabilizante Scotchgard. Ele derramou um pouco de uma nova mistura sobre seus tênis e, mesmo quando pisou na neve, ficou com os pés secos. A lixa d água e os adesivos Post-It também foram fruto da abertura dos funcionários para novas oportunidades.
A obediência a um código de ética é outro forte componente da cultura da empresa. Todos os executivos comprometem-se por escrito a cumpri-lo. O lema da 3M "Nunca se perde um bom negócio por manter uma postura ética". Pesquisas de clima feitas pela empresa mostram que esses traços básicos da personalidade da 3M trazem satisfação para os empregados. De acordo com Pedro Gomes Filho, diretor de recursos humanos, 77% dos funcionários dizem acalentar um sentimento de realização pessoal por trabalhar na subsidiária brasileira. Mais: 87% sentem-se comprometidos com a empresa e 91% afirmam gostar do tipo de trabalho que fazem. No vocabulário da companhia não existe, por exemplo, a palavra problema.
"A cultura da 3M nos leva a preferir falar em oportunidades de melhorias", diz Carlos Henrique Machado, gerente da área de abrasivos. Do chão de fábrica aos escritórios, fala-se em "oportunidade para criar melhorias". A bíblia da empresa contém os princípios de delegação de responsabilidade e incentivo à criatividade elaborados em 1948 por Willian McKnight, um dos presidentes da companhia, que são citados freqüentemente pelos funcionários.
Outra característica da 3M é a sua informalidade. Nada de ternos, a não ser que a ocasião exija seu uso. Cada funcionário pode escolher ter no crachá seu nome ou apelido. Machado, por exemplo, é mais conhecido como Ike, nome que aparece em sua identificação. Há apenas um refeitório para todos, dos operários ao presidente. O americano Paul Husby, que está no cargo desde 1995, é freqüentador contumaz. Ele aproveita a hora do almoço para sentar-se com os funcionários e praticar o português. Husby também ostenta o curioso título de único americano a disputar os Jogos Operários do Sesi paulista. Ele é ala do time de basquete da 3M. Na última temporada, a equipe ficou com a vice-liderança do campeonato estadual, depois de levar para a fábrica dois troféus regionais. "Trabalhar não tem que ser um sacrifício", diz Husby.
A informalidade e as carreiras longas fazem os funcionários desenvolver laços de amizade que ultrapassam o horário comercial. "Não existe distinção entre a família e o emprego", diz Júlio Portela, gerente da área de fitas. O clube da empresa é freqüentado por cerca de 1 200 pessoas nos fins de semana. Durante as férias escolares, os filhos de empregados visitam a fábrica e passam três dias acampados no clube. Funcionários aposentados são convidados a participar de atividades no Clube da Bengala, entidade que congrega aqueles que completam 20 anos de casa.
A 3M também incentiva o pessoal a participar de programas comunitários: há, inclusive, a permissão para que usem o horário de trabalho nesses projetos. A empresa mantém um lar de idosos em Campinas e traz jovens carentes para trabalhar na empresa como contínuos. Muitos ficam, como Edson Luiz Lau, que entrou na empresa há 17 anos como "patrulheiro" - nome pelo qual os adolescentes são chamados - e hoje é funcionário da área de administração de vendas.
O comprometimento entre funcionários e empresa é estimulado pelos benefícios oferecidos. O plano de saúde, que inclui tratamento odontológico, é totalmente bancado pela 3M, assim como o fundo de aposentadoria (que garante a todos a complementação entre o benefício pago pelo INSS e os 60% da média de seus últimos dois anos de salário). O pacote inclui tratamento gratuito para dependentes químicos. A empresa fornece transporte gratuito. A frota de ônibus tem no máximo três anos de idade e os empregados, se não são deixados na porta de casa, ficam o mais próximo possível do seu destino. No refeitório, paga-se a simbólica quantia de 30 centavos por refeição, com direito a repetir o prato quantas vezes desejar. Os funcionários podem comprar produtos da empresa a preço de custo e descontar o valor no pagamento.
A aplicação do jogo de empresas para todos os funcionários faz parte de uma estratégia de mudança que a empresa está implementando. "Temos um novo mercado no Brasil", diz Husby. A abertura das importações e o aumento da concorrência fizeram com que a empresa começasse a se adaptar a essa nova realidade. Para evitar que a mudança criasse um ambiente tenso, Gomes, do RH, criou um programa chamado "Face a Face", no qual todas as chefias recebem as informações sobre o programa de mudança por meio de fitas de vídeo. Em seguida, têm que se reunir com seus subordinados para repartir as informações. Além de fazer com que todos conheçam o negócio, a 3M também está implantando a avaliação 360 graus no segundo semestre. "Precisamos sempre melhorar o ambiente de trabalho e o relacionamento do pessoal", diz Husby.