Dentro do Chilli Mob Cruise
Desfiles de moda. Shows de Marina Sena, Xamã e Pedro Sampaio. Uma premiação. Um episódio de Flow Podcast ao vivo. Jack Sparrow como cicerone. Uma penca de influenciadores e ao menos quatro ex-BBBs – misture tudo isso em um cruzeiro de três dias e você terá o Chilli Mob Cruise, o plano de Caito Maia para estimular a cultura da Chilli Beans entre os funcionários.
Faz dois meses desde que o Chilli Mob Cruise esteve em alto mar. É um evento corporativo com disfarce de festa – ou vice-versa, não há certeza sobre isso –, mas há a garantia de que todos os colaboradores fiquem por dentro dos planos da “marca da pimenta” para o ano seguinte.
Em sua essência, o Chilli Mob Cruise é para os atendentes de loja, supervisores e gerentes. “Num navio como esse volta todo mundo cansado no dia seguinte, mas dois dias depois tá com a energia lá em cima e com a Chilli Beans no pulso. Isso não tem preço”, afirma Maia.
Para o ano que vem, o descolado CEO almeja mais workshops, novos estilos musicais e dobrar o resultado de 2023, que teve, ao todo, 25 patrocinadores. Será a primeira vez do navio no azul. Nas outras edições, o evento deu prejuízo para a Chilli Beans mas, segundo Maia, garantiu reforço no branding.
“De tanto tomar porrada do financeiro, este ano equilibrei as contas”, disse Maia, destacando o bom momento da companhia. Em 2022, faturou em torno de R$ 1 bilhão, cerca de R$ 200 milhões a mais do que no ano anterior. “O exercício de investimento em marca é o que faz a diferença e muitas vezes a conta não fecha. O retorno não é na hora, é a longo prazo”.
Viciados na pimenta
O fundador da maior marca de óculos escuro da América Latina se vende como um empreendedor não-convencional, que passou longe de um bacharel em Administração (“nada contra, mas eu vim de outro mundo”) e que não espera o ‘’comum’’ vindo dos funcionários da Chilli Beans. Hipsters, tatuados e coloridos, quem trabalha nas lojas e estandes de shopping da marca, quando junto dos colegas, se enxerga como membro de uma grande tribo de alternativos, com apoio da empresa para que sejam como quiser.
Por isso mesmo, nos corredores do navio Costa Favolosa, circulam com ar de celebração - ir ao Chilli Mob Cruise, hoje em sua quinta edição, é mais do que uma viagem. “Quem é vendedor e vem pela primeira vez fica com a sensação de conquista. Para os gerentes, é um incentivo para continuar e, para os supervisores, é tipo “olha só tudo que você fez”, sabe?”, resumiu Roberta Garruti, gerente da região de Itaquera, em São Paulo.
Eles ainda têm de pagar pelo passeio, mas o preço é consideravelmente menor em comparação com o valor do ingresso, a partir de R$ 2.800. Segundo relatos, dividir quartos com colegas de trabalho e parcelar o quanto possível acaba sendo uma boa saída, mas definitivamente não é um problema. Estar no cruzeiro e ir na Superdose faz tudo valer a pena.
Superdose
Não é nem meio-dia quando um homem vestido de Jack Sparrow sobe ao palco e passa a animar o público que adentra o teatro do Costa Favolosa, que se aproxima de Angra dos Reis. O dia é de sol e o dress code não está definido: os convidados para o evento da Superdose se dividem entre os que se conformaram ao jeans e tênis e aqueles que, na esperança de um pulinho na piscina durante o intervalo, já estavam uniformizados de shorts e chinelo.
Maioria na plateia, os funcionários da Chilli Beans participam do evento como uma torcida organizada. Cada região do Brasil é uma cor de camiseta, com exceção da Chilli Ótica, que ficou no papel de estado independente. Eles levantam bandeiras da marca e mexem os abadás com a música: “Eu só quero é ser feliz, andar tranquilamente vendendo Chilli Beans… e poder me orgulhar, e espalhar pimenta porque o Rio é o meu lugar”.
Caito Maia entra em um colete branco sem mangas coberto de luzes LED vermelhas. O rosto dele está ofuscado pelo brilho das faixas em volta do torso, mas a plateia vibra. O Superdose, evento que dá sentido à experiência Chilli Mob Cruise, está começando. É um dia inteiro de apresentações de todos os produtos e campanhas que chegam em 2023, mas com prêmios, performances de dança e até a banda Monobloco transformando clássicos do samba e do rock em hinos da Chilli Beans.
Sabendo ou não, Caito Maia se aproxima muito de outros CEOs como Steve Jobs, Tim Cook e Sundar Pichai. As mentes por trás das maiores big techs do mundo transformam os anúncios de marca em eventos poderosos de marketing, que sinalizam para o consumidor que a Apple ou o Google são mais do que produtos cobiçados – são lugares mágicos para se trabalhar.
A ideia de apresentar o portfólio da marca entre shows de Vitão e Priscilla Alcântara, é certeira. Na noite anterior à Superdose, a gerente de Itaquera contava como tinha orgulho da forma com qual lidava com os clientes: “Eu chego para um cliente e falo: “cara, você conhece a Chilli Beans? Não? É, então você vai usar o melhor óculos da América Latina, presente em 26 países, inclusive Dubai. Eu vou desmembrando [sic] toda a história da marca… “ih, você já assistiu Shark Tank? Aquele maluco é o dono!”, sabe?”.
Conversando com Maia, toda ideia por trás da Superdose – cujas apresentações foram coordenadas pelo diretor de arte do Cirque Du Soleil – e do Chilli Mob Cruise parece simples: “É sobre entender a linguagem do funcionário. Eu vejo que muitas empresas estão distantes dos colaboradores em relação a tudo. No que eles pensam, no que eles querem”.
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Chefe ou rockstar?
Andar pelos corredores do navio durante a noite é como caminhar num sonho: as pernas se movem lentamente e os pés parecem anestesiados. Não é a beleza do lugar, e sim a água do mar batendo contra o barco e fazendo o estômago revirar. Talvez o jeito mais fácil de fazer amizades num cruzeiro, além do clássico álcool, é ter remédio para enjoo no bolso.
Mas quando Caito Maia passa pelas atrações do cruzeiro, tudo fica estável. A cena se repete algumas vezes. Um caminho parece abrir em sua frente. Sorriso estampado no rosto e acompanhado da esposa, o empreendedor para, tira fotos e conversa com quem se aproxima. Conversando com os trabalhadores da Chilli Beans, existem alguns adjetivos mais comuns quando o assunto é o fundador: gênio, “diferentão”, visionário, “daora”, empreendedor. E Maia faz pouco uso da modéstia. “Acho que eu sou o único CEO do mundo que fala os “speech” [discursos] com música atrás. Botei Pink Floyd, “Another Brick in the Wall”. Eu passo a mensagem com música. Agora só vou fazer desse jeito”.
Mas como qualquer chefe, existe uma versão mais dura de Caito Maia na hora da tomada de decisões. “Eu sou meio radical. Falo bem simples e objetivo: “isso não é legal, isso não é o caminho, é isso que tô esperando…”, e às vezes gostaria de ser um pouco mais leve. Na maioria das vezes sou intenso demais”, disse o fundador. Na defesa do seu papel de chefe, recorre à astrologia: “Eu sou áries com áries, mas depois eu peço desculpas, entendeu?”
Preso junto dos funcionários em uma banheira gigante de metal no meio do oceano, Maia correu o risco de que, em algum momento, os astros se alinhassem e trouxessem à tona o seu lado mais abrasivo. Um comentário ríspido no ouvido de algum funcionário, um olhar de desinteresse durante as performances – talvez até uma fala problemática. Não se viu nada assim. Mas os maneirismo na fala e as atitudes um pouco excêntricas do dono da Chilli Beans são definitivamente sua essência, o que reflete (sem trocadilhos) na cultura da marca de óculos. Mesmo regido pelo signo de Marte, Caito Maia guia seu navio para águas calmas.
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Créditos
Laura Pancini
Repórter
Formada pela PUC-SP. Começou como estagiária na Exame em 2020. Já passou pela Home do site e as editorias de Pop, Ciência, Tecnologia e IA. Hoje, cobre startups, fundos de investimento e empresas de tecnologia em Negócios.