Camila Fremder: escritora, roteirista e podcaster do "É Nóia Minha?" (Jessica Pauletto/Divulgação)
Repórter
Publicado em 20 de abril de 2025 às 09h10.
Última atualização em 20 de abril de 2025 às 15h08.
Escrever é o refúgio de Camila Fremder desde jovem. Mas nos últimos cinco anos, a escritora e roteirista encontrou nos podcasts um novo jeito de colocar para fora curiosidades, críticas e até alguns pensamentos inusitados que sempre restringiu aos textos. Dessa ideia, nasceu o "É Nóia Minha?", um dos podcasts mais ouvidos do último ano e oportunidade ideal para empreender na internet.
Com mais de 400 episódios, acumulando mais de 60 milhões de reproduções e cerca de 1 milhão de ouvintes mensais, o programa foi destaque em um levantamento da plataforma Rephonic, por registrar rápido crescimento global no Spotify em 2024. O pico foi em agosto do ano passado, quando o número de seguidores do podcast saltou de 273 mil para 396 mil — um aumento expressivo de 45%. Apenas no YouTube, o "É Nóia Minha?" conta com quase 200 vídeos e mais de 21,7 mil inscritos.
"O podcast foi uma transição da escrita de livro para a escrita de roteiro de programas em áudio. Comecei a consumir muitos podcasts e a gostar. Então, resolvi testar. Tinha guardado um dinheiro que dava para pagar 3 episódios, e muito rápido o podcast começou a dar certo", recorda a roteirista em entrevista à EXAME.
Desde a estreia em 2019, o "É Nóia Minha?" leva os ouvintes a refletir, muitas vezes de forma inusitada e cheia de humor, questões que vão desde ansiedade a relacionamentos, amadurecimento e outras pautas que, à primeira vista, podem até parecer banais, mas em um conversa franca se mostram mais complexas do que parecem.
"Eu queria entender se algumas das minhas crônicas poderiam ser aproveitadas para o podcast. Então, percebi que tudo que eu escrevia se baseava em 'paranoias' da minha cabeça, questões que estavam me perturbando de alguma maneira e que sentia a necessidade de levar para os textos", conta ela. "Naquele momento, eu comecei a sentir a necessidade de falar, porque escrever é algo muito solitário".
De olho em mercado bilionário, Flow aposta em creators — e quer ser mais que um podcastOs convidados, que ajudam a ampliar o debate, tornaram o podcast em um programa único e, nos últimos cinco anos, Fremder conquistou um público cativo. Assim como Lady Gaga, que coleciona milhares de fãs intitulados "little monsters", Camila conta com uma crescente leva de admiradores apelidado de "noiers" — já são mais de 13 mil membros no Telegram, uma comunidade ativa que compartilha conteúdos para os episódios.
E a curadoria do podcast, que antes trazias experiências e conhecimentos adquiridos diariamente, passou a incluir como também insights e histórias compartilhadas pelos seguidores.
A evolução da audiência transformou o podcast de Camila em um negócio lucrativo, especialmente por atrair patrocínios e anunciantes de peso, como Listerine, Emma, Natura, LivUp, Amazon, Cadence e Wise. Nos últimos três meses, o programa acumulou 13 inserções publicitárias, com preços que vão de R$ 20 mil para anúncios simples até R$ 60 mil em ações de branded content.
"Começamos essa parceria em outros formatos, principalmente no meu perfil no Instagram, e a partir do momento que a gente passou a fazer inserções no podcast para branded, acho que a gente só complementou o que já fazia em outros canais", explicou. "São marcas que, na maioria das vezes, nunca trabalhamos uma vez só. Acompanham minha trajetória desde antes do 'Nóia' e já confiam na maneira como eu comunico". Por questão de compliance, a influenciadora não apresenta dados de faturamento.
Viver da creator economy é o sonho de muitos brasileiros. Transformar o carisma em negócio, a rotina em conteúdos e a opinião em audiência são algumas das principais expectativas de quem quer ganhar com esse mercado, que movimenta atualmente cerca de US$ 250 bilhões por ano, segundo estimativas recentes do banco Goldman Sachs. Mas o sonho não é assim tão simples de ser conquistado.
De acordo com o relatório "The Creator Revolution", da consultoria Creative Class Group, que analisou o mercado de influenciadores em 20 países, existem cerca de 362 milhões de criadores de conteúdo no mundo. No Brasil, esse número gira em torno de 10 milhões de pessoas que, em diferentes níveis, produzem material original para as redes sociais — o equivalente a 1 em cada 20 brasileiros. Menos de 4% deles, no entanto, conseguem viver apenas dessa atividade.
Em um setor já saturado e, principalmente, que lida com a pressão imposta pelas plataformas, poucos deles conseguem monetizar seus trabalhos.
"Acho que o "É Nóia Minha?" ter começado 6 anos atrás é uma vantagem, porque os anunciantes preferem produtos que já têm uma audiência sólida. Então, para quem está começando um podcast do zero agora pode encarar mais dificuldades para monetizá-lo, principalmente porque os criadores ainda não têm o resultado que dão às marcas segurança para investir. O 'Nóia' estabeleceu sua marca e comunidade no tempo certo, e esse é um importante diferencial."
Em 2024, o mercado global de podcasts movimentou cerca de US$ 4 bilhões, valor impulsionado principalmente pela receita gerada com publicidade, segundo projeções do Interactive Advertising Bureau (IAB) e da consultoria PwC. Esse desempenho acompanha as transformações que o formato tem experimentado nas plataformas de streaming.
Camila Fremder: escritora, roteirista e podcaster do "É Nóia Minha?". (Jessica Pauletto/Divulgação)
À medida em que o progama fez sucesso, o formato foi ganhando novas peculiaridades. No começo do podcast, ela produzia tudo sozinha. "Mais tarde, eu contratei uma roteirista, a Mari Faria, que é diretora também do 'Foro de Teresina' (podcast da revista Piauí), e a gente constrói as pautas juntas", conta.
Para Camila, uma das maiores conquistas é o engajamento dos ouvintes, que não apenas buscam o programa como uma entretenimento, mas também como um local onde a representatividade não é tabu. No "É Nóia Minha?", são discutidas inquietações que, muitas vezes, podem parecer banais — e justamente por isso muita gente evita falar sobre elas abertamente. Mesmo assim, o humor também ganha impulso para tratar de temáticas densas, uma das estratégias para que o público possa se conectar com as narrativas de cada episódio.
"Os convidados mandam mensagens opinando sobre cada episódio e muitos deles se veem nas situações que entram em debate. Alguns deles até falam 'eu quero ir lá no Nóia, porque eu tô com uma nóia…'. E virou esse lugar onde todo mundo traz a sua nóia também. Como são muitas nóias, é sempre aquela máxima: nenhuma experiência é individual", explica Fremder. "No quadro 'Não Desconversa', reservamos espaço para debater temáticas mais sérias e que mexem muito com as diversas realidades do Brasil. Lá, a gente já falou sobre racismo, capacitismo e outros assuntos sobre os quais o público precisa abrir os olhos e aprender mais."
Na hora de planejar um bate-papo com convidados, a regra é furar "bolhas" e dar preferências às diversidades. Trazer pessoas de diferentes faixas etárias para se conectar com várias gerações, disse a roteirista, foi uma das nossas decisões mais acertadas.
Além de estreitar os laços com grandes empresas, Camila Fremder também se aventurou em novas empreitadas nos últimos meses. Para fisgar os mais jovens, "É Nóia Minha?" expandiu para o TikTok, onde a criadora ganhou o apelido de "Mãe do TikTok".
Em 2024, o Grupo Opus enxergou a chance de fazer do podcast uma experiência presencial. Foi assim que nasceu o projeto "É Nóia Minha? – Ao Vivo com Camila Fremder", que levou a gravação do programa aos palcos do Teatro Sabesp Frei Caneca entre outubro e dezembro. Agora, a escritora se prepara para novas apresentações em 2025.
"Demos um passo importante ao levar o projeto para o teatro, com encontros presenciais. Já fizemos quatro apresentações em São Paulo, além de passagens por Curitiba e Porto Alegre. Agora teremos mais duas datas em SP, vamos para Belo Horizonte e estamos negociando outras cidades. Estou curtindo muito esse formato, principalmente por apresentar o 'Nóia' ao vivo, com retorno imediato do público."
No último semestre, a podcaster também passou a comandar a segunda temporada do "Amor na Influência", videocast da Amazon, que marcou a estreia de Camila como apresentadora ao lado do ator Gabriel Santana, substituindo Regina Volpato.
À EXAME, Camila Fremder também conta sobre seu novo projeto, o 'Close Errado', programa que vai apresentar ao lado escritora Jana Rosa na DiaTV (operada pelo Dia Estúdio) "As gravações começaram no início de maio, com estreia prevista para o fim do mês".
Fora da internet, ela continua se dedicando à literatura. Em outubro, ela estreia nas livrarias com "Quibe e o tesouro das abelhas", publicado pela Companhia das Letrinhas. A obra dá continuidade ao livro infantil "Quibe, a formiga corajosa", que contou com a colaboração de seu filho, Arthur, fruto do casamento da escritora com a Antonio Lee, o caçula da cantora Rita Lee. E a lista de projetos não para.
"Já tenho seis livros publicados. Agora estou escrevendo um novo. Tive uma newsletter semanal até o fim do ano passado, o 'Associação dos Sem Carisma', mas ela entrou em pausa por causa da rotina intensa com gravações e teatro", detalha. "Também tenho uma linha de produtos. Voltamos com as camisetas, mas já tivemos cadernos, canecas, pratos, e agora lancei o edredom 'Coberta de Razão', que está disponível online. Então, além do podcast, sigo atuando em várias frentes criativas".