CEO da Telite: nossa missão é aliar sustentabilidade à geração de energia sustentável (Telite/Divulgação)
Karina Souza
Publicado em 31 de maio de 2021 às 15h00.
Última atualização em 1 de junho de 2021 às 13h36.
Reciclar plástico e transformá-lo em telhas para casas. Essa é a proposta da Telite, empresa fundada em 2011 por Leonardo Retto e que atua no interior do Rio de Janeiro. Hoje, a Telite vende cerca de 25.000 telhas por mês, a um preço médio de 80 reais — em 2017, a quantidade mensal de vendas era de 5.000. Com foco em tecnologia e sustentabilidade, a empresa estima faturar 50 milhões de reais em 2021 — 12 milhões a mais do que no último ano —, por causa de um novo produto: telhas de plástico reciclado, capazes de gerar energia solar.
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Mesmo assim, a empresa acredita que será possível vender mais. A chave para isso está na telha com energia solar, que possui grafeno em sua composição. Com o material — fino como carbono —, a empresa conseguiu desenvolver uma telha que é capaz de gerar até 30 KW por mês, considerando uma residência média. De acordo com a empresa, ao utilizar quatro telhas, a casa pode se tornar autossuficiente em produção de energia.
A autossuficiência pode ser um ponto fundamental no Brasil. Além de economizar energia, pode significar a garantia dela — algo que está em xeque diante da emergência hídrica para o período de junho a setembro em cinco estados brasileiros, que levanta até mesmo a hipótese de apagão.
Garantir a energia solar para cada casa deve ter um preço alinhado à média de mercado: o preço de cada telha deve ficar entre 140 e 150 reais. “Hoje, meus concorrentes vendem telhas comuns a esse preço, o que nos torna bastante competitivos, com uma telha leve, capaz de ser transportada para todo o Brasil. Em projetos como o Minha Casa Minha Vida, por exemplo, isso poderia trazer muita eficiência”, diz Leonardo Retto, CEO e fundador da Telite.
De acordo com a empresa, as telhas de plástico reciclado devem ser colocadas à venda ainda em 2021. Para viabilizar o projeto, a empresa aguarda, agora, a certificação do Inmetro (algo que deve ser concluído entre junho e julho, segundo o fundador) e, depois dessa etapa, a ideia é testar a nova telha com pouco mais de cinco clientes a fim de aperfeiçoá-la e identificar possíveis problemas antes de ir ao mercado.
A empresa segue os passos de outras já consolidadas no país, como a Eternit. Em março deste ano, a empresa recebeu certificado do Inmetro para a produção do material e já começou a instalá-lo em quatro cidades: Ourinhos e Marília, no estado de São Paulo; Itaipava, no Rio de Janeiro; e Cambé, no Paraná. Cada telha solar, cujo tamanho é de 36,5 cm por 47,5 cm, tem potência de 9,16 watts, o que se reflete em uma capacidade média mensal de produzir 1,15 Quilowatt-hora (Kwh) por mês. “Estamos seguindo com sucesso as etapas do plano de desenvolvimento”, afirmou Luís Augusto Barbosa, presidente do Grupo Eternit.
No caso da Telite, para viabilizar o projeto, a empresa ainda enfrenta alguns obstáculos. O primeiro é encontrar um fornecedor seguro de grafeno, material que vai nas telhas com energia solar. Caso encontre um parceiro, a Telite espera captar de 8 milhões a 9 milhões de reais em uma rodada com investidores para começar a produção em escala das telhas. Caso a empresa tenha de verticalizar o processo, será necessário captar algo em torno de 30 milhões de reais.
“Nossa principal preocupação é garantir uma produção em escala do grafeno. Em nossas conversas com fabricantes desse componente, não encontramos, ainda, algum lugar que possa nos fornecer esse tipo de material em larga escala. Por isso, temos esses dois planos de negócio previstos. A extração do grafeno é muito cara, no Brasil, por isso o valor da captação varia tanto”, diz Leonardo.
Uma matéria feita pela revista Pesquisa Fapesp no último ano mostrou que as duas primeiras plantas industriais de grafeno entraram em operação no último ano. Uma das fábricas pioneiras é resultado de uma parceria entre a Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e o Centro de Desenvolvimento da Tecnologia Nuclear (CDTN). E, a outra, é o UCSGraphene, fruto de um projeto do Parque de Ciência, Tecnologia e Inovação da Universidade de Caxias do Sul (TecnoUCS), no Rio Grande do Sul.
Outro obstáculo é o atendimento ao cliente. No Reclame Aqui, portal dedicado a registrar reclamações de consumidores, há pelo menos 65 queixas a respeito da empresa desde 2015 — a maior parte relacionada à falta de entrega dos produtos ou à falta de atendimento em relação aos pedidos feitos. Um antigo cliente informou à EXAME que teve um prejuízo de 1.200 reais e que foi até mesmo ameaçado de processo ao cobrar de forma mais incisiva a entrega dos produtos.
Em resposta, a empresa afirma: "Fabricamos 25 mil telhas por mês , 300 mil por ano. São 10.000 pedidos por ano. Se colocarmos a nível de 5 anos , são 50.000 pedidos para 60 reclamações".
Essa não é a primeira vez que a Telite participará de uma rodada de captação. Pouco tempo depois de ter sido fundada, em 2013, a empresa recebeu um aporte de 700.000 reais da rede de investidores Gávea Angels para começar a funcionar, em uma rodada com 11 investidores.
Agora, o plano é ampliar ainda mais a atuação no país. Além de aliar o processo de produção do grafeno à linha de produção — que hoje recicla mais de 200 toneladas de resíduos por mês — a Telite quer trazer total transparência para seus clientes. Tudo deve acontecer por meio de mais funções no aplicativo, em que ao colher cada quantidade de resíduos nas empresas clientes, será possível rastrear, usando QR Code, todo o processo de reciclagem daquele resíduo, até saber quantas telhas foram fabricadas com ele e para onde foram vendidas.
Além disso, sair da atuação regional e poder conquistar clientes em grandes cidades também está nos planos da empresa. Dependendo do porte do novo cliente, a Telite cogita construir novas instalações na cidade em que o cliente estiver localizado ou, ainda, fretar vagões para trazer os resíduos através de vias férreas para o Rio de Janeiro.
“Queremos ser referência em sustentabilidade e, agora, em energia limpa. O investimento deve nos ajudar a chegar em ainda mais cidades e sabemos que temos potencial para crescer”, finaliza Leonardo.
Potencial para a energia solar, não falta. Um levantamento divulgado recentemente pela Associação Brasileira de Energia Fotovoltaica (Absolar) mostra que a capacidade instalada de energia solar no país é de 8 GW, aproximadamente, valor que é similar a metade da energia gerada por Itaipu.
Destes, 4,4 GW são produzidos via geração distribuída (pequenos produtores de energia solar). A entidade estima que, em 2021, esse volume praticamente dobre, passado a representar sozinho 8 GW. A justificativa está no potencial a ser explorado: de acordo com a entidade, dos 86 milhões de consumidores de energia elétrica, apenas 0,6% utiliza a geração solar.
Ou seja, em mercado no qual a aplicação dos painéis fotovoltaicos ainda tem espaço para conquistar, a Telite pode ter espaço de sobra para crescer no país.