: Jae Ho Lee, da rede de bijuterias Balonè: Vender apenas para crianças e adolescentes não era o bastante para dar escala ao negócio (Fabiano Accorsi)
Da Redação
Publicado em 25 de julho de 2011 às 08h00.
Muitas vezes, mesmo quando o empreendedor acha que fez tudo certo, as vendas de uma empresa não decolam. Afinal, o que deu errado? "Vendas ruins quase sempre são consequência de um problema maior no planejamento dos negócios", diz Ricardo Jordão Magalhães, da consultoria Bizrevolution.
O problema, às vezes, está nas projeções sobre o tamanho do mercado, que pode ser mais restrito do que o previsto. Em outros casos, a empresa pode ter derrapado ao planejar como se comunicar com os clientes para fazê-los entender por que deveriam comprar seus produtos ou serviços.
Há ainda situações em que o modelo de negócios imaginado pelo empreendedor não gera os resultados esperados. Mesmo assim, é comum que, diante de cenários como esses, os empreendedores demorem a tomar uma atitude.
"É doloroso admitir o erro diante de problemas tão graves", diz Magalhães. "O empreendedor fica aguardando para ver o que vai acontecer no próximo mês, esperando pelo fechamento de um grande pedido ou de um cliente salvador que nunca aparece, em vez de ir logo atrás das razões que fizeram as vendas estagnar."
Para analisar por que o negócio vende abaixo da expectativa, na maioria das vezes a saída é simples: perguntar aos clientes o que há de errado e o que realmente eles querem. A seguir, cinco empreendedores contam como mudaram os rumos de seus negócios ao descobrir problemas no planejamento.
1 O mercado era menor do que o previsto
O administrador de empresas Jae Ho Lee, de 46 anos, era um empreendedor experiente quando decidiu, em 2007, criar uma segunda marca de bijuterias. Sua rede original, a Morana, contava na época com 60 pontos de venda no país. "Eu percebia que faltava nos shoppings uma rede de acessórios para adolescentes", diz Lee.
Com essa percepção, nascia a Balonè, para atender meninas de 8 a 16 anos. O catálogo começou com 500 itens, entre bijuterias, tiaras, cachecóis e lenços — quase metade com estampas de personagens. Nada disso foi suficiente para gerar o volume de vendas planejado por Lee quando abriu as primeiras quatro unidades.
A meta de franquear 30 lojas no primeiro ano foi adiada. Ele resolveu então ficar em frente às lojas observando o que acontecia. Anotava num bloquinho quantas pessoas apareciam, a idade que aparentavam ter, o que levavam. "As crianças e as adolescentes entravam na loja, mas compravam menos do que eu previa", diz.
Em sua espécie de pesquisa de campo, ele descobriu não apenas o problema mas também a solução. Alguns franqueados já haviam observado que mulheres adultas procuravam, em vão, por artigos na Balonè. Lee, no entanto, relutou em abrir mão de sua ideia inicial. "Eu achava que diversificar seria prejudicial", diz.
No ano passado, a Balonè mudou a faixa etária do público-alvo para entre 18 e 30 anos. Das 25 lojas da marca, algumas chegaram a duplicar as vendas depois da transformação. Com isso, a Balonè faturou 10 milhões de reais no ano passado, 57% mais que em 2009. Neste ano, 30 novas lojas devem ser inauguradas.
A lição :Minha maior falha foi não constatar que a base inicial de clientes era incapaz de dar escala ao negócio", diz Lee. "Hoje, temos um público maior, que nos permite crescer mais rapidamente."
Para não cair no erro Um nicho promissor na teoria pode ser um desastre na prática. Ao questionar “por que a concorrência não fez isso ainda?”, muitas vezes o empreendedor descobrirá que não é por falta de visão, e sim por limitações de mercado. E poderá então pensar em como contorná-las.
2 O consumidor não queria inovação
O paulistano Vicenzo Barrella, de 46 anos, nunca havia trabalhado com cosméticos quando decidiu fundar, em 2001, a fabricante de esmaltes Speciallità. Ele se inspirou nos vidros de esmalte grandões que via fazer sucesso entre as mulheres italianas para lançar no Brasil frascos de 14,5 mililitros — mais que o dobro do tamanho convencional.
Barrella também encomendou tintas e resinas importadas que se fixavam melhor nas unhas do que as usadas pelos concorrentes. "Achei que as consumidoras iam adorar a novidade", afirma Barrella.
Engano. Dos poucos varejistas para os quais conseguiu vender, nenhum renovou o pedido. O esmalte encalhou nas prateleiras. Numa tentativa de sair do vermelho, ele passou a vender os esmaltes para manicures e salões de beleza.
Também não deu certo. Depois de mais de cinco anos de tentativas, Barrella decidiu voltar atrás e reduzir as embalagens para 6 mililitros, padrão dos outros fabricantes. Entre 2009 e 2010, as vendas quadruplicaram e o faturamento subiu 140%, chegando a 10 milhões de reais. "Aprendi a entender melhor minha consumidora e a me comunicar com ela", afirma Barrella.
A lição: "A última coisa que queria era voltar atrás"diz Vicenzo Barrella. "Mas eu aprendi a importância de deixar o orgulho de lado e ouvir o consumidor."
Para não cair no erro Muitos empreendedores cometem o equívoco de achar que um novo produto ou serviço vai vender só porque eles os consideram tecnicamente superiores aos do concorrente. A melhor forma de evitar esse problema é prestar atenção no que o cliente realmente quer.
3 Faltava falar a língua do mercado
A paulista Nanox atua em um dos setores mais promissores da atualidade, a biotecnologia, que cria produtos da manipulação de partículas 100 000 vezes mais finas do que um fio de cabelo.
Fundada em 2005 por quatro estudantes de química da Universidade Federal de São Carlos, a empresa vende uma substância que combate fungos e bactérias e que pode ser inserida em objetos fabricados com plástico, tinta e resina, criando uma barreira de proteção.
O problema é que, como o produto não é visível, os clientes não o compreendiam. "Tínhamos nas mãos um produto com infinitas possibilidades, mas não conseguíamos explicar como poderia ser úti", diz Gustavo Simões, de 31 anos, sócio da Nanox. Por alguns meses, Simões e seus colegas não conseguiram sequer marcar reuniões com potenciais clientes.
Por isso, foi uma festa quando convenceram a indústria de secadores e chapinhas para cabelo Taiff a testar num lote de seus equipamentos a substância, com a promessa de livrar de impurezas o jato de ar emitido. "Quando os executivos da Taiff receberam as peças de volta, a reação foi apática", diz Simões. "Eles nos perguntaram onde estava a tal da tecnologia que não estavam vendo."
Foi quando a Nanox desenvolveu um selo com a marca Nanox Clean para afixar nos secadores de cabelo. "Compreendemos que só conseguiríamos vender se ajudássemos nosso cliente a mostrar o valor do nosso produto para os clientes dele", afirma Simões.
Os selos ajudaram a Nanox a reduzir de 12 para quatro meses no tempo médio entre o começo de uma negociação e o fechamento do contrato. "Nos últimos dois anos, entramos em setores como os de produtos odontológicos e de eletrodomésticos", diz Simões. No ano passado, a Nanox faturou 2 milhões de reais, um crescimento de 40% em comparação a 2009.
A lição: "Aprendi que aquilo que eu vendo representa apenas 1% do sucesso do negócio", diz Gustavo Simões. "Os outros 99% dependem da forma como eu vendo."
Para não cair no erro Sempre há um jeito de vender um produto ou serviço para o qual existe demanda de mercado. A questão é descobrir o caminho. No caso de tecnologias complexas, formas de divulgação didáticas ajudam, assim como um trabalho de construção de marca.
"O desafio de vender tecnologias invisíveis ao consumidor já foi enfrentado por empresas que se transformaram em grandes corporações, como Intel, Lycra e Teflon", diz Danilo Fiorini, consultor da HSDealer.
4 O cliente achou o produto incompleto
Há quatro anos, o engenheiro Alexandre Soncini, de 29 anos, estava insatisfeito com os resultados de seu negócio de montagem de lojas virtuais. Ele era então dono da WX7, que se fundiu neste ano com a concorrente Vtex. "Nas concorrências, só ganhávamos as contas quando oferecíamos preços baixos e prazos longos de pagamento", afirma Soncini.
"Era preciso encontrar um jeito de oferecer algo diferente". Para descobrir exatamente o quê, ele instruiu seus funcionários a manter uma nova conduta durante as negociações. "Em vez de chegarmos à reunião apresentando nossos produtos, incentivamos o cliente a falar primeiro", diz Soncini.
"Com as informações coletadas, poderíamos definir as ferramentas que iríamos oferecer depois." Foi assim que descobriu que a maioria dos clientes não quer apenas uma loja online. Eles precisam transferir o cadastro de produtos para o ambiente virtual, contratar um sistema de pagamentos, outro de criptografia de dados, e ainda adquirir certificados que garantam a idoneidade da empresa.
Tudo isso demanda negociações com diferentes fornecedores. A WX7 detectou essa necessidade e passou a oferecer não apenas a sua plataforma, mas tudo o que está correlacionado a uma loja virtual.
"Depois que o cliente relata suas necessidades, adotamos o seguinte discurso: você não tem familiaridade com esse mercado, mas nós conhecemos todos os fornecedores. Podemos negociar essas tecnologias e entregá-las todas juntas para você", diz Soncini.
Ele passou a vender até serviços de concorrentes similares aos seus. "Se alguém quiser um sistema de busca melhor do que o nosso, vou atrás do Google ou de quem for para oferecer a ferramenta ideal para o negócio do cliente", afirma.
Desde que adotou essa filosofia, o tempo médio entre o começo de uma negociação e o fechamento do contrato caiu de sete para quatro meses. Por sua vez, o crescimento médio da empresa aumentou de 4% para 15% ao ano. Em 2011, o faturamento deve alcançar 14 milhões de reais.
A lição: "Aprendi que todo cliente quer aumentar suas receitas, diminuir seus custos ou aumentar sua participação de mercado", diz Soncini. "O que norteia a minha proposta é pensar no que posso oferecer para ajudá-lo a atingir seus objetivos."
Para não cair no erro Nos casos em que o negócio envolve concorrências e serviços e produtos complexos, é preciso ter jogo de cintura na negociação e prestar atenção se a empresa consegue entregar, sozinha, a solução desejada.
5 O modelo de negócios não funcionou
Por quase dez anos, a paulista Solvo atuou em projetos esporádicos de TI. Sua missão era solucionar problemas emergenciais de tecnologia em grandes empresas, panes com as quais ninguém mais no mercado sabia lidar. Não faltavam novos clientes, mas isso não era suficiente para fazer os negócios engrenar.
O problema é que, a partir de 2006, novos contratos apenas substituíam os que estavam chegando ao fim. "Como éramos remunerados por projetos temporários, nosso faturamento ficou estacionado", diz Marcos Peigo, de 31 anos, um dos sócios da Solvo. O modelo de negócios não estava funcionando.
Peigo então decidiu que a Solvo deveria deixar de ser uma empresa que atuava em projetos pontuais para oferecer serviços que proporcionassem receitas recorrentes. Mas como fazer isso? Para descobrir, ele passou um mês grudado no telefone contatando ex-clientes.
A pergunta era sempre a mesma: no dia a dia de sua operação, quais os problemas de tecnologia mais comuns? Assim, Peigo conseguiu estruturar pacotes de serviços, que são cobrados mensalmente dos clientes, como suporte técnico a usuários finais, manutenção de servidores e monitoramento de segurança na troca de informações online.
A estratégia fez a Solvo crescer 50% ao ano nos últimos dois anos. Em 2010, a empresa faturou 15 milhões de reais. "Hoje, 60% de nosso faturamento vem de contratos que se estendem por dois a cinco anos", diz Peigo. "A meta é elevar esse índice para 70%."
A lição : "Acredito que o ser humano é resistente a mudanças por natureza", diz Marcos Peigo, da Solvo. "Mas alterar as regras no meio do jogo foi o que nos levou a crescer."
Para não cair no erro É preciso rever de tempos em tempos o modelo de negócios e assegurar que seja capaz de sustentar as vendas no longo prazo. "Os primeiros sinais de que o atual modelo se esgotou aparecem num fluxo de caixa cada vez mais estrangulado", diz Adriano Ribeiro, da Evello.