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Maio/2011 - O empreendedor da Fugini que veio da roça

Kogi Fugita cultivava cebola, milho e goiaba quando abriu uma fábrica de molhos, doces e conservas. Nascia a Fugini, que em 2010 faturou mais de 250 milhões de reais

Koji Fugita ,67, sócio proprietário da Fugini Alimentos. (Fabiano Accorsi)

Koji Fugita ,67, sócio proprietário da Fugini Alimentos. (Fabiano Accorsi)

Da Redação
Da Redação

Redação Exame

Publicado em 3 de maio de 2011 às 20h48.

Última atualização em 30 de março de 2023 às 10h33.

Como muitas crianças que cresceram na roça, o empreendedor Kogi Fugita, de 67 anos, começou a trabalhar ainda pequeno no sítio de seus pais em Monte Alto, no interior paulista. No campo, Fugita fez uma trajetória que o levou a criar a Fugini, fabricante de alimentos que no ano passado faturou mais de 250 milhões de reais vendendo doces, conservas e molhos.

Nos últimos anos, a Fugini aproveitou as oportunidades que surgiram com a expansão da renda das famílias de menor poder aquisitivo, hoje seus principais consumidores. “Nossa fábrica parece até um canteiro de obras”, diz ele. “Faz quase quatro anos que sempre temos alguma ampliação em andamento.” Neste depoimento a Exame PME, Fugita conta como construiu a empresa e quais são seus planos para o futuro.

Sou filho de um casal de imigrantes japoneses. Meus pais chegaram ao Brasil nos anos 30 e trabalharam em fazendas de café até conseguirem juntar dinheiro para comprar um pequeno sítio na cidade de Monte Alto, onde havia uma colônia japonesa. Era uma propriedade pequena, onde eles começaram a plantar cebolas. Foi nessa fazendinha que nasci.

Ainda pequeno comecei a ajudar meus pais na lavoura. Passei boa parte da infância trabalhando mais do que estudando. A escola ficava longe de casa, e lá havia uma professora que não gostava de mim. Quando eu não tirava boas notas, ela me batia e me chamava de burro. Saí da escola depois de completar o 4º ano.

Éramos sete irmãos e nem sempre a colheita dava dinheiro suficiente para manter a casa. Meu irmão mais velho era um bom aluno e havia entrado na faculdade de engenharia. Achávamos que era uma obrigação da família sustentá-lo durante os estudos para que um de nós pudesse ter um diploma. Foram tempos difíceis e meu pai precisou fazer dívidas para manter a fazenda. No começo dos anos 60, ele ficou doente e não conseguiu mais trabalhar. Eu tinha 17 anos quando tive de assumir os negócios.

Foi nessa época que conheci minha mulher, Emiko. Namoramos por um tempo e nos casamos. Nem tive tempo de viajar para a lua de mel. Trabalhava duro para manter a família e guardar dinheiro para reinvestir. Aos poucos, fui comprando terras e, em 1976, já produzíamos 5.000 toneladas de cebola, 50 vezes mais do que quando assumi o sítio. Também comecei a cultivar milho e goiaba, vendidos para fabricantes de conservas e doces.


Nos anos 80,  plantar cebola passou a ser um bom negócio. A produção no Brasil aumentava num ritmo menor que o consumo, e por isso os preços subiam sempre. Lembro que em 1985 a cebola chegou a ficar mais cara que o filé. Eu já cultivava mais de 11.000 toneladas de cebola por ano. Ganhei muito dinheiro, consegui pagar dívidas e comprei tratores e camionetes. Muita gente em Monte Alto dizia que eu era o rei da cebola.

Os negócios iam tão bem que eu nem pensava em fazer outra coisa. Até que, em 1984, um fornecedor veio me procurar com um problema. Ele armazenava grandes quantidades de cebola na época da colheita para vender na entressafra, quando os preços subiam. Um defeito na refrigeração fez com que todo o estoque apodrecesse, e por isso ele não tinha como pagar o que me devia. Em troca da dívida, eu me tornaria sócio num negócio que vendia alface, cebola e tomate picados para as lanchonetes do McDonald’s. Decidi aceitar.

A nova empresa cresceu rápido. Descobri que beneficiar alimentos dava mais dinheiro do que cultivar. O problema é que eu não queria sair de Monte Alto, e os negócios com o McDonald’s exigiam cada vez mais a minha presença em São Paulo. No começo dos anos 90, saí da sociedade, pensando em abrir uma fábrica de alimentos no interior de São Paulo.

Eu já vendia goiaba para algumas indústrias, e decidi abrir uma fábrica de goiabada. Assim nasceu a Indústria Alimentícia Fugita, em 1996. Investi quase todas as minhas economias nessa empreitada. Pouco tempo depois, fechei contrato para produzir goiabada para a Cica, marca que na época pertencia à Unilever.

Os negócios começaram bem. Em 2000, a Unilever me fez uma proposta para que eu assumisse toda a produção de doces, como goiabada e marmelada. Parecia uma boa oportunidade, mas logo aprendi que negociar com grandes empresas nem sempre é fácil. Em determinado momento, a matriz da Unilever deu ordens para diminuir a produção de doces com a marca Cica. Eu tinha um contrato de exclusividade e não podia vender para mais ninguém. Com a Unilever comprando menos, ficou impossível cobrir os custos da fábrica. Precisei vender parte das minhas terras para cobrir os prejuízos.

No final de 2002, a fábrica chegou a um momento crítico. A Unilever avisou que encerraria a produção da Cica e propôs que eu ficasse com o direito de explorar a marca por cinco anos, como compensação pelo contrato que eu tinha com eles. Eu continuaria produzindo doces, mas teria de assumir todo o negócio, do marketing à distribuição no varejo.


Era um mundo desconhecido para mim, que até então só me preocupava com a produção. Eu teria nas mãos uma marca muito conhecida, mas não sabia como aproveitar todo o seu potencial. Perdi o sono por várias noites pensando no que fazer. Até que, alguns dias depois, fui procurado pelo empresário Auro Ninelli, que era sócio de uma fábrica de molhos e doces do interior paulista.

Ninelli estava vendendo sua parte na empresa e viera me perguntar se podíamos fazer negócios juntos. Com sua experiência no mercado, ele podia me ajudar a enfrentar os novos desafios. Achei que era coisa do destino. Convidei-o para ser meu sócio e ele aceitou.

O conhecimento de Ninelli foi valioso para o negócio. Foi dele a ideia de produzir molho de tomate, hoje um de nossos principais produtos. Nas viagens que fazia ao exterior, meu sócio também viu molhos e extratos de tomate vendidos em sachês, e não em latas ou vidros, como no Brasil. Descobrimos que isso diminuiria nossos custos em 30%, tornando nosso produto mais competitivo.

Fizemos a mudança na embalagem e as vendas deslancharam. Também mudamos o nome da empresa para Fugini. Achamos que a sonoridade italiana da nova marca daria um ar mais tradicional a nossos produtos. Por isso, antes mesmo de encerrar o prazo para explorar a marca Cica, rebatizamos todos os produtos de Fugini.

Em julho de 2010, inauguramos uma fábrica em Cristalina, no interior de Goiás, numa região que produz muito milho, ervilha e grão-de-bico, que vendemos em conserva. Nos últimos anos, aumentamos bastante nossa linha de produtos. Hoje, a Fugini produz pratos prontos, como feijoada, lasanha e sopas. Recentemente, lançamos um creme de avelã e um molho de tomate com 30% menos calorias do que o produto tradicional. A Fugini cresce, em média, 25% ao ano. Nosso negócio se beneficia do aumento no poder aquisitivo da população, que está consumindo mais alimentos.

Aos poucos estou deixando o dia a dia dos negócios. Há três anos, transferi para minha filha mais velha, Cristina, minhas responsabilidades como executivo. Hoje, ela e Ninelli administram a empresa. Os filhos do meu sócio ainda são adolescentes e apenas um trabalha aqui como estagiário, mas já decidimos que a Fugini não vai virar cabide de emprego. Temos um acordo de que cada sócio só pode trazer um parente para o negócio.

Quando Cristina assumiu o meu lugar, fiquei com muito tempo livre. No começo, aproveitei para pescar bastante — até enjoei de tanto peixe. Agora, nas horas vagas também planto mogno numa das minhas fazendas em Monte Alto. Disseram-me que de uma única árvore pode-se extrair 7.000 reais em madeira. Pena que o mogno demore 40 anos para crescer. Quero plantar ao menos 1.000 árvores. É uma boa herança para meus netos e bisnetos, não?

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