Eduardo Pirré, administrador da Maria Brasileira, que presta serviços domésticos, como os de faxineiro, jardineiro e cuidador de cachorros (Julia Rodrigues / EXAME PME)
Da Redação
Publicado em 19 de junho de 2014 às 10h50.
São Paulo - A faxineira Cristiane Carvalho Rosa, de 28 anos, moradora de Osasco, na Grande São Paulo, está completando oito meses com carteira assinada — ela é um dos 320 funcionários da Maria Brasileira, rede de 32 lojas que presta serviços domésticos para empresas e residências, como os de faxineiro, jardineiro, cozinheiro e cuidador de cachorros.
Antes, Cristiane atuava como diarista por conta própria e fazia duas faxinas por semana — o que rendia, em média, 650 reais por mês. Hoje, ela tem a mesma carga de trabalho e recebe um salário fixo de 910 reais, em torno de 40% mais.
“Não pretendo sair da empresa a qualquer custo”, diz Cristiane. “Se eu voltasse a trabalhar por conta própria todos os dias, poderia ganhar mais, mas não teria estabilidade nem benefícios como FGTS, INSS, férias e 13º salário.”
O administrador Eduardo Pirré, de 24 anos, fundador da Maria Brasileira, adoraria que outros funcionários pensassem como Cristiane. Oito meses numa empresa não parece muito, mas está acima da média de tempo pelo qual a Maria Brasileira tem conseguido segurar sua mão de obra — seis meses.
“É um índice bem alto de rotatividade, que nos obriga a gastar muita energia para repor quem sai”, afirma Pirré. Em pouco mais de um ano, desde a fundação do negócio, Pirré experimentou alguns incentivos, como palestras que expõem as vantagens do trabalho formal e sorteios de prêmios. No entanto, os resultados ainda são tímidos. “Já recusamos clientes por falta de trabalhadores.”
Com sede em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo, a Maria Brasileira faturou 3 milhões de reais em 2013. Entre as primeiras conquistas estão parcerias com marcas como Bauducco e Ariel, que fornecem amostras de seus produtos aos clientes da empresa. “Até o fim deste ano, deveremos chegar a 100 unidades franqueadas”, diz Pirré.
O crescimento de negócios que prestam serviços domésticos foi impulsionado por mudanças socioeconômicas, que fizeram mais de 1 milhão de babás e empregadas sumir dos lares brasileiros nos últimos quatro anos, de acordo com a Organização Internacional do Trabalho. Entre as razões estão a melhor distribuição de renda regional e a maior escolarização da população.
Mais recentemente foi instituída a PEC das Domésticas, um conjunto de regras que tornou mais caro manter uma profissional em tempo integral. “Muita gente tem optado por contratar empresas como a nossa”, diz Pirré. De acordo com dados do setor, houve aumento de 20% no número de franquias de serviços de limpeza e conservação no ano passado em relação a 2012.
Apesar do crescimento, continua difícil recrutar mão de obra em empresas como a Maria Brasileira. Muitos jovens preferem seguir carreira em áreas comerciais e de serviços.
“Os trabalhos realizados manualmente carregam um estigma de falta de perspectivas — um problema cultural difícil de compensar com meros aumentos no piso salarial”, diz Renato Meirelles, do Data Popular, instituto de pesquisas especializado nas classes C, D e E.
O que fazer, então, para segurar esse pessoal? Além de Meirelles, Exame PME conversou com Manuel Oliva, da Praquemarido, rede que presta serviço de reparos domésticos, e Ricardo Alves, da Griletto, rede de restaurantes que emprega cerca de 1.300 funcionários, entre atendentes e cozinheiros. Veja o que eles recomendaram.
Pagar bônus por metas
Renato Meirelles, do Data Popular — São Paulo, SP
• Perspectivas: A remuneração média das empregadas domésticas mais do que dobrou nos últimos dez anos, enquanto o aumento da escolarização das brasileiras fez diminuir a oferta do serviço. Ao mesmo tempo, cresceu a demanda por esse tipo de profissional. Muitas mulheres da classe média ascenderam na carreira e passaram a precisar de ajuda em casa.
• Oportunidades: As pessoas estão concluindo que ficou caro e complicado demais manter uma empregada doméstica fixa, optando por faxineira ou ajudante uma ou duas vezes por semana. Isso ajuda a impulsionar as empresas que intermedeiam essa mão de obra, como a Maria Brasileira.
• O que fazer: Se por um lado as mudanças sociais abriram perspectivas para alguns negócios, eles próprios precisam lidar com os trabalhadores da base da pirâmide, que ficaram mais exigentes. Sugiro a Eduardo Pirré que monte um programa de bônus trimestrais e semestrais.
Com o dinheiro, o funcionário escolhe como quer gastar. Para receber o pagamento extra, é preciso atingir metas, como pontualidade, satisfação dos clientes e tempo de contratação. Quem atingir seis meses ou um ano de casa, por exemplo, poderá ganhar uma bonificação mais polpuda.
Treinar gente inexperiente
Ricardo Alves, do Griletto — Indaiatuba, SP
• Perspectivas: Embora o desemprego tenha caído no país, há um contingente de 6 milhões de brasileiros que ainda estão fora do mercado e procuram uma vaga de trabalho, de acordo com pesquisas mais recentes do IBGE. Os motivos podem ser variados, mas certamente parte dessas pessoas busca uma chance de se qualificar profissionalmente.
• Oportunidades: Fizemos na Griletto um estudo que comprovou que funcionários em seu primeiro emprego tendem a ficar nele por mais tempo. Se a Maria Brasileira começar a buscar mão de obra que ainda não está empregada e oferecer qualificação, terá boas chances de formar profissionais comprometidos com a oportunidade gerada.
• O que fazer: Eduardo Pirré pode criar um programa de primeiro emprego e fazer uma ampla divulgação. A partir das contratações, a empresa deve oferecer treinamentos, benefícios, além de plano de carreira.
Na Griletto, incentivamos que os funcionários continuem estudando e se aprimorando. Fazemos convênios com escolas de idiomas, informática e outros cursos profissionalizantes. Mais de 20% de nossos coordenadores e gerentes responsáveis pelos restaurantes começaram como atendente, o primeiro degrau da hierarquia.
Recrutar quem mora perto do trabalho
Manuel Oliva, do Praquemarido — São Paulo, SP
• Perspectivas: Alguns estudos mostram que a rotatividade anual nas empresas brasileiras está em torno de 50% — é como se a cada dois anos elas trocassem todos os empregados.
• Oportunidades: Notamos que a complexidade e o tempo gasto para chegar ao trabalho são estressantes — as maiores causas de insatisfação com o emprego, especialmente entre os trabalhadores da base da pirâmide.
• O que fazer: O ideal é alocar o novo funcionário na unidade mais próxima de sua moradia. Na Praquemarido, adotamos a tática já durante a fase de seleção. A Maria Brasileira deve anunciar as vagas em locais próximos às lojas que precisam de gente, como fazemos hoje. Atualmente, existem até empresas que ajudam a recrutar por geolocalização e torpedos no celular.
A empresa também pode buscar novos profissionais não só nas vias comuns mas também em lugares inusitados, como associações de bairro, igrejas e estações de ônibus e metrô.