Sem dinheiro: jardineiros, pintores, piscineiros e profissionais autônomos de todas as áreas que não têm acesso a boletos ou cobranças digitais e enfrentam um enorme desafio (eranicle/Thinkstock)
Mariana Fonseca
Publicado em 7 de julho de 2018 às 08h00.
Última atualização em 7 de julho de 2018 às 08h00.
Marcos Arruda sabe bem como o empoderamento pode mudar a vida de uma pessoa. À frente da Moneto, fez disso a sua missão — e transformou uma fintech em ferramenta de afirmação social.
Aos 17 anos, Marcos Arruda queria o mundo. Queria vê-lo de cima, no alto, dentro da cabine de um avião. Desde os 14 anos, sonhava em estudar na AFA – Academia da Força Aérea, escola de formação de pilotos da FAB. Depois de conversar com um piloto da esquadrilha da fumaça que um dia pousou em sua cidade, o Capitão Todesco, descobriu que a distância entre ele e seu sonho era uma questão de sentar e estudar.
O garoto do interior da Bahia, filho de um caminhoneiro com uma dona de ferro-velho, ambos sem instrução e semianalfabetos, fez a lição de casa e conseguiu, então, entrar para a Academia. Antes de ingressar na FAB, Marcos fez concurso público para ser carcereiro no presídio de sua cidade, para, dessa forma, ajudar seus pais enquanto estudava para a prova de admissão. Marcos usava os dias de folga para estudar para as provas.
Dois anos depois, na Academia, durante um voo de instrução aérea ele se deparou com uma pane em seu rádio e ficou sem comunicação com a Torre de Controle, adotando assim um procedimento de emergência. A torre de comando enviou sinais coloridos a Marcos, que não foi capaz de enxergar. Descobriu que era daltônico.
A frustração foi enorme. Mesmo com toda a dedicação, não havia mais nada que pudesse fazer. Aos 21 anos, precisava encontrar um novo sonho. Retornou ao interior da Bahia para se reinventar.
As perspectivas de trabalho na cidade eram limitadas: talvez ele conseguisse ser vendedor em uma loja de sapatos ou trabalhar na loja de autopeças, ambos por indicação dos pais. Mas Marcos queria estudar. A faculdade local, além de não ser tão reconhecida, era particular e ficava fora de questão.
“Qual é o lugar no Brasil onde eu consigo estudar, morar e comer sem precisar pagar nada?”, ele se questionava.
Conheceu o Instituto Tecnológico de Aeronáutica, o ITA, em São José dos Campos. Marcos tinha oito meses para estudar até o próximo vestibular. Fez um acordo com o cursinho universitário da cidade, fundado por seus antigos professores, pegou alguns livros emprestados e, como ele mesmo conta, ‘queimou o barco’.
Na antiga história, se você chega a uma ilha e queima seu barco, não existe mais a possibilidade de voltar atrás, de desistir. Só te resta seguir em frente.
Em fevereiro do ano seguinte, estava se mudando de Vitória da Conquista para São José dos Campos, 1.400 km de distância no mapa e um abismo separando as duas realidades. Nos bolsos, só o dinheiro da passagem.
Na primeira semana de aula, Marcos precisava comprar uma calculadora HP. Fez um combinado com a turma, foi para São Paulo e comprou mais de 50 calculadoras. A margem de lucro foi tão grande que dava para comprar 5 HPs só para ele. Nascia ali sua veia empreendedora, mais por necessidade do que por paixão.
No segundo ano, começou a trabalhar na Empresa Júnior do ITA. Foi lá que Marcos se apaixonou por tecnologia — e por empreendedorismo. Um dos projetos que criou era tão inovador que se transformou em seu primeiro negócio: a InvestCampus, um simulador de investimentos em ações da BM&FBovespa com foco em ensinar universitários a operar no mercado de ações. Logo no segundo ano, a empresa já tinha mais de 20 mil universitários treinados para o mercado financeiro.
Apesar de não saber o que era escala, já sentia os desafios de estar à frente de um negócio com crescimento acelerado.
Tempos depois, a empresa foi vendida para a Patagon.com, primeiro portal de investimentos da América Latina, que fazia parte do grupo Santander.
O menino que revendia calculadoras três anos antes, agora era um empreendedor negociando sua primeira venda. O valor que caiu na conta de Marcos era tão alto que ele checou duas vezes o extrato só para ter certeza.
Voltou para Vitória da Conquista, ansioso para contar a novidade aos pais. A mãe poderia fechar o ferro-velho e o pai aposentar o caminhão. A vida deles estaria feita para sempre.
Marcos conta que esse episódio aconteceu em 23 de setembro de 2000. Uma semana depois, uma tragédia abalou a família. “Já era tarde da noite quando meu pai foi guardar o caminhão. Dois homens surgiram e pediram todo o dinheiro que ele tinha nos bolsos. Ele só tinha um real na carteira. E foi por isso que mataram meu pai.”
O turbilhão de emoção que atingiu Marcos foi enorme. Não pensou duas vezes: trouxe a mãe e o irmão para morar com ele em São José dos Campos. Seguiriam em frente, juntos.
Depois de trabalhar poucos meses na Patagon, Marcos fundou um novo negócio: a BoldCron. A startup fazia de tudo um pouco: desenvolvia websites, disparava e-mails e também tinha uma plataforma de meios de pagamento.
“Eu olhava para todas essas frentes e dizia: vamos escolher algo recorrente, escalável e chato de fazer. Como bom baiano, queria criar um negócio em que o máximo de pessoas pudessem comprar e usar, sem que eu tivesse que ir até eles.”. Estava aí uma boa definição de negócio escalável.
Marcos e seu time pivotaram a BoldCron e decidiram focar no gateway de pagamento: uma solução técnica entre Visanet e Redecard, grandes players na época, e sites de e-commerce. Tiveram clientes como a GOL, o Ponto Frio e a Fotoptica, e passaram a adotar uma mentalidade de crescimento inorgânico, inspirada pelas ideias de Sergio Kulivosky, investidor-anjo da BoldCron.
Nesse período, Marcos enfrentou sua primeira briga societária. Ele enxergava a oportunidade de transformar a BoldCron no PayPal brasileiro, para escalar e crescer ainda mais. Foi selecionado pela FINEP para apresentar o seu negócio para investidores, chegou a fazer reunião com 11 fundos de investimento, mas todos consideraram a proposta completamente insensata. Assim que o PayPal chegasse ao Brasil, eles seriam esmagados.
Entre os clientes de grande porte, a BoldCron também oferecia a tecnologia para o UOL, que dava os primeiros passos na criação do PagSeguro. Mas a dependência tecnológica que o PagSeguro tinha da BoldCron era preocupante. Se a BoldCron tirasse o UOL da tomada, demoraria muito tempo para eles desenvolverem internamente uma solução semelhante.
“Quando bati na porta do UOL e compartilhei o plano, tive uma surpresa: a intenção deles era fazer do PagSeguro, o PayPal brasileiro. Entrei na reunião em busca de investidores e saí de lá com uma proposta de aquisição da BoldCron.”
Em 2009, Marcos vendeu a BoldCron. Passou três anos, durante o período de não-competição, trabalhando como diretor-executivo dentro do Grupo UOL. “Não existe desafio maior do que ter um mindset de startup e trabalhar em uma companhia tradicional.”
Depois dessa experiência, Marcos decidiu experimentar um outro papel dentro do ecossistema: o de investidor-anjo. Atuou na empresa de segurança da informação TrustSign, vendida para o Site Blindado em 2014 e na Concil, maior empresa de conciliação financeira e de vendas com cartões no Brasil, investida pelos fundos DGF e SP Ventures.
Hoje, Marcos está comprometido com um novo sonho: reescrever a história dos pagamentos online no Brasil. Essa é a missão da Moneto, fintech nascida em 2015 para empoderar os profissionais autônomos desbancarizados ou sub-bancarizados, provendo produtos e serviços financeiros sob medida que aceleram as vendas e o crescimento de seus negócios.
São mais de 55 milhões de pessoas economicamente ativas que não têm conta no banco, mas que movimentam cerca de 600 bilhões de reais por ano. Para Marcos, esses são os verdadeiros empreendedores, gente que trabalha duro, que sai de casa sem nada no bolso e tem que voltar no fim do dia com R$50,00 para alimentar seus filhos, e que passa despercebida pelos bancos.
Jardineiros, pintores, piscineiros e profissionais autônomos de todas as áreas que não têm acesso a boletos ou cobranças digitais e enfrentam um enorme desafio ao receber o pagamento pelos serviços prestados.
Esse profissional não tem crédito no banco, nem dinheiro para adquirir uma maquininha de cartão. Para ele, o processo de cobrança é desgastante, demorado e custoso, chegando a consumir até 15% do valor total que ele receberia. A Moneto atua justamente nesse problema, com uma plataforma online que:
Automatiza o processo de recebimento, economizando o tempo da cobrança;
Aumenta as possibilidades de pagamento para o cliente, que antes estavam limitadas a dinheiro ou cheque;
Provê produtos e serviços financeiros sob medida para investimento e crescimento do negócio.
Hoje, a Moneto tem 12 mil clientes cadastrados, com a projeção de dobrar de tamanho nos próximos meses. Depois de participar do programa Radar Santander, em parceria com a Endeavor, Marcos recebeu o apadrinhamento de mentores da rede para decidir quais seriam os próximos passos do negócio. Da troca de ideias e experiências, o sonho que já era grande, ficou maior:
Marcos quer criar com a Moneto o banco digital do autônomo desbancarizado no Brasil. Se o João, pintor de paredes, tem 10 clientes, por exemplo, com recebível médio de R$1.500,00 por mês, ele pode ganhar crédito para reinvestir no seu negócio, por meio de microempréstimos, mesmo sem ter conta bancária. Ele pode também ter um cartão pré-pago com o valor que recebeu naquele mês para não precisar mais andar com dinheiro na carteira.
“Esse é o empoderamento social que queremos oferecer. Apoiar profissionais como esse com serviços financeiros que um banco tradicional não ofereceria.”
“Meu sonho é ver o jardineiro abrindo o aplicativo da Moneto no celular para receber pelo trabalho do dia, ver o piscineiro pegando R$500,00 em crédito para comprar mais cloro. Eu quero criar o banco para quem não se sente bem-vindo em um banco.”
E como ser um “banco”, sem ser banco? Fazendo excelentes parcerias com as instituições financeiras, redesenhando integrações tecnológicas e fluxos de uso, de modo a escoar seus produtos e serviços com uma roupagem diferente e que atenda a expectativa de experiência dos usuários na outra ponta.
Aos 42 anos, Marcos Arruda continua querendo o mundo. Mesmo que não o veja mais do alto de uma cabine de avião, como imaginava aos 17 anos, o tamanho do seu sonho tem potencial de levá-lo sempre para o mais alto. Se depender das milhas acumuladas pela experiência, tudo indica que eles já estão prontos para decolar.
Histórias como a da Moneto de transformação social só são possíveis pelo uso criativo da tecnologia. Por isso, esse artigo é um oferecimento de Dell e Microsoft, parceiras da Endeavor na disseminação de histórias de empreendedores que transformam o mundo por meio da tecnologia.