Carlos Galvão, do Grupo Latin, promotor de eventos esportivos (Daniela Toviansky e Marcelo Correa)
Da Redação
Publicado em 14 de fevereiro de 2013 às 05h00.
São Paulo - O paulista Carlos Galvão, de 43 anos, perdeu a conta de quantas vezes participou de maratonas, provas de natação e de ciclismo nos últimos anos. Ele calcula ter percorrido no ano passado mais de 1.000 quilômetros correndo, nadando e pedalando em competições realizadas em cidades como São Paulo, Salvador e Florianópolis.
Boa parte dessas provas foi organizada por sua empresa, o Grupo Latin, agência de marketing esportivo fundada por Galvão em São Paulo há pouco mais de uma década. Seu negócio é promover eventos, como maratonas e provas de triatlo, patrocinados por grandes empresas. No ano passado, o Grupo Latin organizou mais de 50 competições para grandes clientes, como Volkswagen, Nestlé e Sony. "Sempre gostei muito de praticar esportes", diz ele. "Faço questão de estar presente na maioria das provas promovidas por minha empresa."
Em 2013, Galvão deve suar bastante a camisa — ele planeja organizar 65 competições, como corridas de rua e provas de triatlo. Além dos patrocínios, o Grupo Latin fica com o dinheiro pago pelos atletas pela inscrição nas competições — neste ano, sua estimativa é que o faturamento da empresa chegue a 51,3 milhões de reais, três vezes mais do que em 2012.
O Grupo Latin é um exemplo de empresa que está aproveitando as oportunidades surgidas nos últimos anos à medida que grandes empresas passaram a investir mais em eventos de relacionamento com clientes, fornecedores e funcionários. Segundo estimativas da Associação de Marketing Promocional (Ampro), que reúne empresas do setor, a verba destinada pelas 100 maiores companhias do país a eventos de relacionamento chegou a 8,7 bilhões de reais em 2012, quase o dobro de 2008.
"O volume de recursos aplicados no setor deve manter o ritmo de crescimento nos próximos anos", diz Kito Mansano, presidente da Ampro. Para muitos empreendedores, essa expansão tem aberto grandes oportunidades. "Existe um bom mercado para pequenas e médias empresas que forneçam produtos e serviços para a organização de eventos de relacionamento", diz Paulo Sérgio Dortas, sócio da consultoria Grant Thorton Brasil.
Com o Grupo Latin, Galvão vem ocupando um dos pedaços com maior potencial de crescimento nesse mercado. Os eventos esportivos movimentaram aproximadamente 350 milhões de reais no Brasil em 2012. Segundo um estudo da consultoria Deloitte, no mundo todo as verbas para esse tipo de patrocínio chegam a 31 bilhões de dólares por ano. "As empresas no Brasil ainda estão descobrindo que eventos esportivos e de relacionamento são importantes para tornar os clientes mais fiéis e fortalecer suas marcas", afirma Rogério Lüdorf, consultor da Deloitte.
A ideia que deu origem ao Grupo Latin apareceu na década de 90, quando Galvão passou uma temporada de estudos em Chicago, nos Estados Unidos. Atleta amador desde a juventude, ele começou a participar de corridas de rua e outros tipos de competição, geralmente custeadas por grandes empresas. "Foi quando comecei a pensar em abrir um negócio para promover eventos esportivos", diz ele.
De volta ao Brasil, Galvão conseguiu um emprego como corretor de ações na bolsa de valores, onde permaneceu até 2001, quando decidiu pedir demissão para pôr seus planos em prática. Ele procurou os organizadores da prova de triatlo Ironman, nos Estados Unidos, e propôs a eles organizar uma edição brasileira.
Para dar a largada, Galvão foi em busca dos patrocinadores. "A prova começou pequena", diz ele. "Dava para contar nos dedos de apenas uma mão o número de empresas que se interessaram em associar suas marcas à prova." A última edição do Ironman brasileiro, realizado todos os anos em Florianópolis, contou com o apoio de 19 empresas. “Há dez anos, esse mercado estava engatinhando”, afirma Galvão. "Hoje, há mais empresas interessadas em associar sua imagem ao esporte."
Vários dos clientes do Grupo Latin obtiveram resultados que podem ser atribuídos ao patrocínio de eventos esportivos. No ano passado, a Sony viu as vendas de um de seus aparelhos de MP3 aumentar 40% no fim de semana de uma maratona patrocinada pela empresa em Salvador.
A Track&Field, rede de lojas de artigos esportivos que patrocina um circuito de corridas de rua promovidas pela empresa de Galvão, costuma registrar resultados semelhantes. Nos dias que antecedem a competição, as lojas da empresa nas cidades onde as provas serão realizadas costumam vender, em média, 40% mais que o habitual.
Em muitos casos, a principal preocupação de quem patrocina esse tipo de evento é reforçar a imagem por meio da associação de uma marca a valores relacionados com o universo dos esportes, como competitividade, saúde e bem-estar. Noutros casos, a ideia é usar esse tipo de evento como uma ferramenta para tornar seus consumidores menos propensos a bandear para a concorrência.
"Os eventos de relacionamento não servem apenas para aumentar as vendas de forma pontual", afirma Lüdorf, da Deloitte. "Esse tipo de iniciativa acaba sendo uma ferramenta poderosa para que as empresas se destaquem dos concorrentes num ambiente cada vez mais competitivo."
Por trás das empresas que investem em eventos de relacionamento está a crença de que levar clientes, funcionários e fornecedores para programas que fujam da rotina possa ajudá-las a fortalecer os laços com eles — e, assim, ampliar as vendas para os mesmos consumidores, diminuir as chances de perder um bom empregado para os concorrentes e melhorar as condições de negociação para comprar insumos.
Por isso, no Brasil, alguns dos principais clientes das empresas que promovem eventos de relacionamento estão em setores muito disputados, como os de construção, alimentos e bebidas. "Trata-se de mercados muito concorridos e nos quais as empresas têm dinheiro para bancar ações de relacionamento", diz Dortas, da Grant Thorton. Essas ações são tantas que se tornaram um dos principais motivos que aquecem o mercado de viagens corporativas, que quase triplicou desde 2006.
Muitas empresas têm recorrido a eventos de relacionamento como forma de premiar funcionários que atingem as metas. Nos últimos anos, a construtora paulistana Cyrela passou a promover shows e eventos em estádios, teatros e cinemas para lançar campanhas de vendas, além de presentear os corretores com a participação em algum tipo de passeio — a empresa já levou alguns dos melhores vendedores para degustações de vinhos em vinícolas da Europa, voar de balão ou guiar carros esportivos em pistas de corrida, entre outros programas.
"Em geral, os corretores de imóveis são profissionais autônomos ou trabalham em imobiliárias vendendo casas e apartamentos de várias construtoras", diz Paulo Oliveira, diretor de marketing da Cyrela em São Paulo. "É natural que eles se empenhem mais para vender os imóveis de quem os trata melhor." De 2011 a 2012, a venda de imóveis incluídos nas campanhas aumentou cerca de 40% no Brasil. “Essas ações costumam trazer resultados bem concretos", diz Oliveira.
Desde 2011, boa parte das ações de relacionamento da Cyrela é conduzida pela agência Askme, de São Paulo. No ano passado, a empresa faturou 3,5 milhões de reais — 26% mais que em 2011. A Askme foi fundada em 2007 pelo paulista Marcelo Bertoli, de 32 anos. Na época, seu objetivo era vender passeios para consumidores que desejassem ter uma experiência um pouco diferente do usual — como nadar ao lado de golfinhos em mar aberto, pilotar carros de corrida num autódromo ou voar de balão.
"Um ano depois, comecei a receber pedidos de empresas interessadas em presentear fornecedores, funcionários ou clientes com os nossos passeios", diz Bertoli. Foi quando ele descobriu como aproveitar todo o potencial de crescimento da Askme. “Percebi que a nossa margem e o faturamento aumentariam se atendêssemos o mercado corporativo", afirma ele.
Desde 2008, a equipe da empresa passou de um para 40 funcionários. "Antes, crescíamos pouco", diz Bertoli. "Quando mudamos o foco, nossa expansão passou a ser no mínimo 20% ao ano." Neste ano, a expectativa é aumentar em 60% o faturamento. Hoje, além da Cyrela, a Askme atende clientes como a fabricante de bebidas americana Brown-Forman, detentora das marcas Jack Daniel’s e Finlandia Vodkas.
A CSM Brasil, empresa de marketing de relacionamento do Rio de Janeiro, vem crescendo ao organizar eventos para empresas interessadas em tornar seus consumidores mais fiéis. Criada em 2004 pelos administradores de empresas Carlos Eduardo Ferreira, de 40 anos, e Mauro Corrêa, de 36, a empresa faturou 30 milhões de reais no ano passado, cerca de 70% mais do que em 2011 — a expectativa dos sócios é crescer 65% em 2013. Nos últimos anos, a CSM conquistou grandes clientes, como Visa, Petrobras e Banco do Brasil, que a contratam para levar seus clientes a estádios, onde podem assistir de camarote a shows e a jogos de futebol.
Além de se encarregar do transporte dos convidados, a CSM Brasil monta uma recepção nos camarotes, com bufês pródigos em comida e bebida. Nos jogos de futebol, é comum que a CSM chame ídolos como Zico e Leonardo, ex-jogadores do Flamengo e da seleção brasileira, para assistir à partida junto com o pessoal. "Para muita gente, sentar ao lado de uma celebridade dessas para bater papo é algo que não tem preço", diz Corrêa.
Ferreira e Corrêa fundaram a CSM depois de passar anos trabalhando em firmas de consultoria de marketing esportivo e de relacionamento. Na época, eles perceberam que havia espaço no mercado para uma agência que oferecesse às empresas pacotes com os quais pudessem presentear seus clientes. Há nove anos, eles pediram empréstimos a parentes e amigos para juntar 500.000 reais e comprar o direito de utilizar, durante cinco anos, um camarote no estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro.
Os sócios começaram a alugar o espaço para empresas interessadas em levar convidados para assistir a jogos de futebol e shows. "Deu certo", diz Corrêa. "Recuperamos o investimentos em pouco tempo e pagamos os empréstimos." Na época, a empresa se chamava Golden Goal. Em 2011, os sócios foram convidados pela multinacional britânica CSM Sports & Entertainment, uma das maiores agências de marketing esportivo do mundo, para ser sócios do grupo no Brasil. Foi quando a empresa passou a se chamar CSM Brasil.
Agora, Ferreira e Corrêa estão fazendo planos para aumentar o portfólio de serviços prestados pela empresa até a Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro — período em que eles esperam que a procura por eventos esportivos aumente no país. Nos próximos anos, eles pretendem atuar em áreas como o gerenciamento de patrocínios esportivos e a criação de cenografia para cerimônias de abertura de competições. "O marketing esportivo e o setor de ações de relacionamento ainda têm muito a crescer no Brasil", afirma Corrêa.