Agrônomos se unem a produtores para encontrar as melhores soluções para problemas no campo (Fiagril/Divulgação)
Karina Souza
Publicado em 16 de abril de 2021 às 10h30.
Última atualização em 20 de abril de 2021 às 11h47.
A digitalização do campo tem vasto espaço para ser explorada no Brasil: estimativas do BNDES afirmam que a utilização de Internet of Things (IoT) no agronegócio brasileiro deve movimentar US$ 21 bilhões até 2025. Até atingir esse objetivo, há “muito chão” pela frente, mas movimentos iniciais de digitalização ganham cada vez mais espaço no país. Um exemplo recente é o da Fiagril, empresa de distribuição de fertilizantes, defensivos agricolas e sementes, que investiu R$ 600 mil para coletar dados de produtores e facilitar a gestão da área de plantio por meio de um aplicativo, o Confia Tech.
A empresa não está sozinha na ambição de trazer mais produtividade ao campo por meio da tecnologia. A Agrosmart, startup do setor, coleta e analisa dados para irrigar plantações; e a Agrosolutions tem um sistema para gerenciamento de propriedades rurais, similar ao implantado pela Fiagril em seus clientes. Ambas ganharam espaço na EXAME recentemente (veja aqui).
Fato é que, com o sucesso do agronegócio no país -- o PIB do setor aumentou 24,31% em 2020, de acordo com estimativas da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) -- o interesse pela digitalização do setor cresce conforme empreendedores cada vez mais jovens direcionam seu olhar para o campo.
As mudanças também fazem parte do processo de reestruturação pela qual a companhia passa, desde 2018. Na época, o faturamento da companhia foi de R$ 52 milhões, resultado bastante satisfatório em relação ao ano anterior, quando teve prejuízo de R$ 10 milhões. Os cortes de custos foram uma prioridade e a companhia enxugou cerca de R$ 25 milhões para atingir o resultado. Em 2019, o crescimento de faturamento foi de 25% sobre o valor atingido no ano anterior. Em 2021, a empresa estima crescer 37% sobre esse resultado.
Para essa veterana do agronegócio -- há 33 anos no mercado brasileiro --, a pandemia impulsionou a necessidade por inovação. O software implantado pela empresa, além de trazer mais informações para o dia a dia dos produtores, também funciona como base de dados para a empresa, que pode fazer a oferta dos produtos certos para cada produtor, por meio de estratégias conjuntas entre os engenheiros agrônomos da companhia e os os fazendeiros.
“Nossa meta é registrar um milhão de hectares até o final de 2021. O projeto está em operação desde agosto do ano passado e, de lá para cá, metade desse objetivo já foi atingido. Além de ser algo útil aos produtores, também contribui para nos trazer segurança financeira na hora de financiá-los ou de comprar grãos plantados por esses fazendeiros”, diz Dinamari Sandri, Gerente de Planejamento e Execução da Fiagril, à EXAME.
O app funciona da seguinte forma: a partir do monitoramento do campo -- que é feito pelos 60 consultores da Fiagril em suas visitas aos produtores, utilizando apenas o celular -- é possível obter relatórios de saúde da lavoura em tempo real "na palma da mão".
Além dos dados, imagens NVDI (padrão que analisa a condição da vegetação usando sensores remotos), permitem visualizar áreas de calor, em que a cor vermelha pode indicar que algo está errado e, a verde, que está tudo certo com aquela área.
Com acesso às informações inseridas na ferramenta, os engenheiros agrônomos responsáveis por fazer a ponte entre a distribuidora de fertilizantes e os fazendeiros podem planejar ações e fornecer serviços adequados às necessidades de cada produtor.
De acordo com a companhia, toda a segurança para garantir os dados dos produtores é garantida e, ao longo do tempo, deve permitir visualizar um histórico completo das ações tomadas na propriedade para identificar sazonalidades.
Para a empresa, a solução tem potencial representa apenas o pontapé inicial de digitalização junto aos clientes. “Temos mais de três décadas de atuação no mercado brasileiro e estamos comprometidos a trazer cada vez mais tecnologia para o campo. Esse é só o começo do nível de digitalização que queremos atingir”, afirma Dinamari.
Nada disso seria possível, contudo, sem a agtech (sigla para representar startups que atuam no agronegócio) Sistema Integrado de Monitoramento Agrícola (Sima), de origem argentina, que chegou ao Brasil em fevereiro do ano passado.
Atualmente, a startup está presente em oito países e monitora 8 milhões de hectares -- sendo 1 milhão no Brasil. A meta em curto prazo é chegar a 3 milhões de hectares no país.
“O Brasil está dois passos à frente dos demais países da região no agronegócio. Por isso, a competição é acirrada por aqui, mas temos um foco claro de expansão no país, principalmente para quem quer atuar com os pequenos produtores. Queremos ser a empresa responsável pelo primeiro passo de digitalização do campo”, afirma Maurício Varela, country manager do Sima.
Para a empresa, isso só será possível ao aliar a inteligência artificial à “inteligência colaborativa”, um desafio que deve ser superado para tomar decisões melhores -- à medida que os produtores se acostumam com as vantagens do mundo digital. É com base nessa tese que a empresa deve se apoiar para a rodada de investimentos a que deve se submeter ainda em 2021, com a intenção de captar entre US$ 1,5 milhão e US$ 2 milhões.
Depois do hábito consolidado de usar ferramentas digitais para monitorar o dia a dia, produtores podem dar um passo além -- como medir o impacto ambiental que seus negócios produzem.
Essa já é uma realidade para pouco mais de um terço dos produtores rurais brasileiros, que consideram altamente estratégico medir o impacto ambiental de seus negócios -- e 47% dizem que é importante ter mais eficiência nesse aspecto de gestão, segundo uma pesquisa da consultoria PwC publicada pela EXAME deste mês.
O movimento de digitalização deve trazer cada vez mais impacto, dado que as projeções apontam que a demanda por alimentos não deve diminuir tão cedo. Em participação no fórum Super Agro Brasil 2021, o embaixador da China no Brasil, Yang Wanming, disse que o agronegócio é um dos principais pilares da relação entre ambos os países, com metade das vendas ao país sendo em exportações agropecuárias -- um cenário que deve continuar nos próximos anos.
"Não são poucas as empresas chinesas que estão interessadas em realizar operação conjunta com produtores brasileiros", disse. "Isso cria condições para que o Brasil tenha mais opções de acesso a financiamento, tecnologia e equipamentos”, disse.