Marco Legal das Startups: na última segunda-feira, 20, o presidente assinou um projeto de lei que trata da regulamentação das startups (Hispanolistic/Getty Images)
Carolina Ingizza
Publicado em 20 de outubro de 2020 às 20h10.
Última atualização em 21 de outubro de 2020 às 09h36.
O presidente Jair Bolsonaro assinou, na última segunda-feira, 19, um projeto de lei para regulamentação das startups, que foi enviado ao Congresso nesta terça-feira. Em discussão há anos pelo mercado de inovação, a proposta de um Marco Legal das Startups promete desburocratizar e estimular o setor.
Na tarde desta terça-feira, 20, o deputado Vinicius Poit (Novo), que é o relator do projeto na Câmara dos Deputados, afirmou que acredita que o Marco Legal esteja sancionado até o final do ano. O parlamentar participou de um painel do evento Case Startup Summit para discutir o projeto de lei.
Poit disse que há consenso entre Câmara e Senado sobre a importância do texto, o que deve garantir sua aprovação o quanto antes. "Acho que é possível sancionar e aprovar ainda este ano, antes de acabarem as sessões", disse o parlamentar.
Rodrigo Afonso, presidente do Grupo Dínamo, entidade que advoga pelo ecossistema brasileiro de startups, conversou com a EXAME sobre os principais pontos apresentados pelo texto do governo. “No geral, é uma legislação que traz contribuições positivas e avança o ambiente regulatório brasileiro. Muitos dos pontos debatidos pelos grupos de trabalho do Marco Legal foram incluídos”, diz o especialista.
O projeto enviado pelo Executivo traz alguns pontos que podem incentivar o investimento em startups no Brasil. Primeiro, o texto estabelece que o investidor-anjo (podendo ser pessoa jurídica ou física) não se torna sócio das empresas nas quais investe, o que garante que ele não irá responder por dívidas trabalhistas ou tributárias caso o negócio não dê certo. A expectativa é que isso estimule mais investidores a apostarem em startups para diversificar seus investimentos.
Outra medida quer incentivar a alocação de recursos do governo em startups. Um dispositivo criado pelo texto destrava cerca de 3 bilhões de reais que agências governamentais precisam investir em pesquisa e desenvolvimento para que eles possam ser aplicados em fundos de capital de risco que investem em startups.
O governo também poderá estreitar seu relacionamento com essas empresas de inovação. O texto propõe que os governos possam contratar soluções experimentais de startups em caráter de teste. Caso elas funcionem, poderão ser adquiridas posteriormente pelo poder público, sem a necessidade de licitação. Para viabilizar desenvolvimentos de projetos, o governo também poderá pagar por um parte do serviço antecipadamente.
Outra frente do projeto pretende incentivar a entrada das startups no modelo de sociedade anônima. A proposta é que empresas com faturamento inferior a 78 milhões de reais por ano possam usufruir dos benefícios das S.A.s, mas sem precisar lidar com tanta burocracia. Elas poderiam, então, publicar convocações, balanços anuais e outros documentos de forma eletrônica. Seus livros de escrituração também poderiam ser digitais.
Por usar um critério de receita, essa e outras medidas beneficiariam também outras pequenas e médias empresas brasileiras. “A maior parte das propostas são transversais, vem para desburocratizar o maior número de empresas possível, não só as startups”, disse Igor Manhães Nazareth, subsecretário de inovação do Ministério da Economia, no painel do Case Summit.
Apesar de o texto ter trazido alguns dos pontos pedidos pelos empreendedores, algumas medidas ficaram de fora. Afonso, presidente do Grupo Dínamo, diz que questões tributárias, como a possibilidade das startups S.A.s utilizarem o regime do Simples, ou a possibilidade de anjos compensarem as perdas e ganhos na hora de pagar impostos, foram deixadas de lado.
“Os anjos correm um risco muito maior e são cobrados como se fossem um fundo de risco baixo. Assim, por que iriam investir em startups? Isso desestimula o investimento”, diz Afonso.
O especialista afirma também que questões trabalhistas, como a validação dos contratos de participação de ações (stock options, no jargão do mercado), foram ignoradas. Esse tipo de benefício é oferecido em algumas startups para atrair talentos. Hoje, a legislação abre margem para que esses contratos sejam interpretados como parte do salário, sendo tributados como tal. O incentivo a vistos de trabalho para empresas de tecnologia também não foi contemplado pelo Executivo.
“Acho uma pena que tenha se perdido a oportunidade de avançar nesses pontos, mas vejo vontade no Congresso para que isso aconteça”, afirma o presidente do Dínamo.
Afonso parece estar certo. O deputado Vinicius Poit, no evento desta tarde, disse que pretende incluir no seu relatório mais incentivos ao investimento-anjo e às stock options. “Estou estudando para trazer no relatório a ideia de que o investidor possa compensar perdas e ganhos, assim como acontece com as ações hoje”, diz o relator.