Derci Tramontini, fundador da Tramontini Implementos Agrícolas, com os filhos Leonardo e Júlio. (Mirian Fichtner)
Da Redação
Publicado em 20 de julho de 2011 às 08h00.
O mecânico Derci Tramontini, de 78 anos, já foi especialista na montagem de um tipo de veículo rústico que pequenos agricultores do sul do Brasil conhecem como girico, jibata ou tacotaco, entre outros apelidos.
São utilitários que geralmente originam-se do reaproveitamento de peças e chassis de velhos microtratores, jipes e caminhonetes que saem do ferro-velho para ganhar vida nova nas lavouras, dando forma a uma espécie de frankenstein mecânico.
A Tramontini, empresa fundada nos anos 80, foi um dos fabricantes mais organizados desses fora de estrada caipiras. "Fizemos até uns modelos com cabine dupla", diz Leonardo Tramontini, de 47 anos, filho caçula de Derci, que divide com o pai e os irmãos, Júlio, de 53, e Jacob, de 50, o comando da empresa da família.
Há pouco mais de três anos, os Tramontini viram na demanda por esse tipo de equipamento uma oportunidade. Por trás dos números grandiosos do agronegócio brasileiro havia uma legião de pequenos agricultores familiares carentes de máquinas agrícolas que coubessem no seu orçamento.
A partir de 2007, a empresa começou a montar tratores de menor porte, que custam em torno de 30 000 reais — quase o mesmo preço de um carro popular. "Encontramos um pedaço do mercado deixado de lado por grandes multinacionais, como Agco, John Deere e New Holland", diz Leonardo Tramontini. Em 2010, as receitas da empresa chegaram a 30 milhões de reais, quase quatro vezes mais que no ano da entrada no novo mercado.
A vocação dos Tramontini para lidar com máquinas e motores remonta à metade do século passado. Nascido em 1933 no vale do rio Taquari, no Rio Grande do Sul, o patriarca Derci Tramontini tinha apenas 13 anos quando abandonou a roça para trabalhar como ajudante numa oficina de Encantado, no interior gaúcho.
"Eu lavava peças de motor numa bacia de gasolina", diz ele. Aos poucos, subiu na vida. Aos 30 anos, foi convidado para ser sócio de uma concessionária de automóveis em Encantado. Cabia a ele cuidar da oficina. O negócio andou bem até 1967, quando a montadora que Tramontini representava — a Willys — foi comprada pela Ford, que fechou parte da rede, incluindo a loja de Encantado.
Largado na estrada, Derci não teve outra saída senão recomeçar do zero. Em sociedade com o irmão, Lino, montou uma oficina mecânica. Os dois prosperaram até 1984, ano em que a firma foi desfeita, saindo cada um para seu lado, sempre em Encantado. Foi quando Derci e seus três filhos começaram a montar os próprios veículos improvisados.
O salto para a profissionalização aconteceu nos anos 90, quando a Tramontini fechou uma parceria com um fabricante chinês para produzir no Rio Grande do Sul microtratores de duas rodas.
Pouco depois, a família mudou a empresa para Venâncio Aires, a 60 quilômetros de Encantado, onde a prefeitura ofereceu subsídios para a compra de um terreno e de um galpão amplo para aumentar a fábrica.
A parceria com os chineses abriu as portas para a Tramontini fechar outros acordos com fornecedores asiáticos, que permitiram à empresa desenvolver peças e componentes para tratores.
Em torno de 60% da produção precisou ser nacionalizada — uma exigência do Ministério da Agricultura e do BNDES para permitir que os agricultores possam comprar as máquinas com crédito subsidiado de programas governamentais como o Mais Alimentos, com taxas de juro inferiores a 2% ao ano.
Hoje a Tramontini disputa um mercado estimado em 6 000 tratores por ano, que, além de apertado, é instável. Até recentemente, a empresa projetava fechar 2011 com 40 milhões de reais em receitas. Em fins de maio os sócios começaram a rever as metas. Com a liberação de financiamentos prejudicada pelo pacote de medidas anti-inflacionárias do governo federal, as vendas dos últimos meses não se sustentaram.
"Temos esperança de uma retomada nos negócios no segundo semestre, quando começa a ser liberado o crédito agrícola para a próxima safra", afirma Leonardo.
Para fugir da instabilidade, a empresa lançou, no início do ano, um trator maior, com valor pouco abaixo de 80 000 reais. "Queremos brigar por um lugar na categoria mais disputada por grandes fabricantes, numa faixa em que as vendas somam cerca de 30 000 tratores por ano", afirma Leonardo.
A expectativa da empresa é vender neste ano mais de 700 tratores. A empresa tem hoje 50 revendedores. Até o final de 2012, deve chegar a 70 revendas. “Sem rede de concessionárias não se vende trator”, diz Leonardo. "É preciso treinar mecânicos, padronizar as lojas e investir na criação de uma rede capaz de enfrentar as grandes empresas."
Todas essas tarefas estão nas mãos dos três filhos de Derci, que continua se movendo nos bastidores. Como se fosse a alma da firma, ele é o primeiro a chegar e o último a deixar a fábrica. "Meu pai ajuda a solucionar problemas que deixam os dez engenheiros da empresa com a pulga atrás da orelha", diz Leonardo.