Negócios

Wilson Ferreira Jr., da Eletrobras: a luta pela eficiência

Wilson Ferreira Júnior, presidente da Eletrobras, fala sobre os desafios da estatal, como a busca por eficiência operacional e o retorno à bolsa de Nova York


	Wilson Ferreira Jr.: o presidente da Eletrobras tem a dura missão de trazer eficiência operacional para a estatal
 (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

Wilson Ferreira Jr.: o presidente da Eletrobras tem a dura missão de trazer eficiência operacional para a estatal (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

DR

Da Redação

Publicado em 11 de outubro de 2016 às 20h39.

Entrevista publicada originalmente em EXAME Hoje, app disponível na App Store e Google Play.

São Paulo — Há três meses, o engenheiro Wilson Ferreira Júnior, ex-presidente da Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), está à frente da Eletrobras, estatal responsável pela geração, transmissão e distribuição de energia elétrica no Brasil. Em situação dramática, tendo sido retirada da lista de negociações da bolsa de Nova York, reverter o quadro da empresa é prioridade para o governo de Michel Temer.

A Eletrobras, que tem contratos sendo investigados pela Operação Lava-Jato, tem tido dificuldades para fechar o balanço das operações de 2014 e 2015 e tem descumprido os prazos de entrega do formulário 20-F ao órgão regulador.

O documento precisa ser entregue anualmente por todas as empresas com ações negociadas nas bolsas de valores nos Estados Unidos. Em entrevista após participar do EXAME Fórum, Wilson Ferreira Júnior falou sobre as investigações, o plano de privatizações e o atual cenário econômico do setor de energia, que deve começar a atrair investidores.

Qual será o foco da Eletrobras?

Decidimos focá-la em geração e transmissão, onde ela é maior. Esse vai ser o foco dela. Em distribuição, a Eletrobras tem atividades pequenas, mas importantes no Brasil. Então, nos comprometemos, agora recentemente, em prepará-las para a privatização. Uma primeira unidade vai este ano e outras seis no ano que vem.

A empresa colocada à venda foi a distribuidora de energia de Goiás, a Celg. Existem investidores interessados no negócio das distribuidoras? Quais vão ser os desafios nessas vendas?

O momento de compra é ótimo. A Celg é uma das dez maiores distribuidoras brasileiras, e o estado de Goiás cresceu, nos últimos anos, o dobro do que cresce o Brasil em consumo de energia. É uma empresa com crescimento excepcional e numa posição geográfica estratégica para consolidação, estando no Centro-Oeste.

Existem vários grupos no entorno da Celg. Num primeiro momento, tivemos um problema ligado a preço, mas fizemos uma reavaliação da companhia e colocamos num preço mais adequado. No final de setembro, tive uma reunião no BNDES com investidores, potenciais compradores, e tinha mais de 100 pessoas nessa reunião. Acredito que vai ser um sucesso.

O preço da Celg caiu de 2,8 bilhões de reais para 1,8 bilhão. Mas, ainda assim, o mercado tem sinalizado que o valor continua alto e inacessível. Como tem sido essa negociação com os investidores?

O investidor sempre vai achar que o preço está alto. O preço fixado agora guarda muita relação com a última transação que foi feita pela Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), junto à AES Sul. Com a diferença de que a Celg é uma empresa praticamente duas vezes maior, que cresce o dobro da média brasileira. Por isso, ela tem um preço ligeiramente superior.

Olhando todos os indicadores, como os múltiplos de mercado e o preço da empresa sobre a base de ativos, estamos falando de uma empresa que vai atrair muitos muitos interessados e vai gerar um processo de competição. Estou muito tranquilo quanto ao tema da precificação. Estamos trabalhando com uma agenda para vendê-la ainda este ano, no final de novembro ou começo de dezembro.

Qual a receptividade que o programa de vendas de ativos da Eletrobras tem encontrado no mercado?

O momento brasileiro é: chegamos no fundo do poço e estamos saindo. Quem está investindo na área de energia investe em concessões longas, de 30 anos. É aquela coisa de poder comprar na baixa. Por isso, temos muitos interessados. Os preços, as perspectivas de crescimento brasileiro e o câmbio, que já foi uma questão e não é mais por estarmos com a moeda em boa condição, entusiasmam. A maior parte dos riscos que eram percebidos pelos investidores no passado não são mais presentes.

Numa visão de longo prazo, temos ativos de muita qualidade, com perspectiva de crescimento, e há compromisso do governo em cima da segurança jurídica e dos temas regulatórios. Estamos com uma agenda muito positiva.

Se elas forem vendidas a um preço muito barato, para atender os interesses dos investidores, não seria mais interessante para a Eletrobras mantê-las na operação? Vale mesmo à pena se desfazer dessas empresas?

O negócio da distribuição é muito sofisticado. É um investimento diário. Não é como uma usina, que em três ou quatro anos você constrói e depois tem um custo de operação muito baixo. Na distribuição, é preciso investir diariamente. Os consumidores vão à sua porta. No caso da Celg, são 100.000 ligações por ano. A empresa estatal tem mais dificuldade de atender essa característica.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) exige que o consumidor seja ligado em 48h e, a cada quatro anos, a agência muda o padrão de eficiência. Para isso, é preciso demitir pessoas, negociar contratos, fazer licitações. Não é que essa prática não possa ser feita, ela pode, mas a estatal é mais lenta. E, enquanto você não chega nos padrões da Aneel, quem paga é o acionista.

Para uma empresa estatal que já tem uma grande estatura, como no caso da Eletrobras, compensa vender. Temos maior escala de geração e transmissão da América Latina, mas não somos a maior distribuidora e nem seremos. Para a Eletrobras e para os consumidores, é melhor que essa demanda seja atendida pelo investidor privado.

É como tirar um peso das costas.

Exato. Nós tínhamos o papel de desenvolver as regiões e nós fizemos isso. E não quer dizer que essas empresas sejam ruins. São empresas grandes, em áreas de desenvolvimento, e chegamos ao ponto em que elas podem ser vendidas.

Por quais mudanças regulatórias o setor de energia deve passar? E o que deve ser prioridade para reequilibrar o setor, que foi muito afetado pela redução forçada de tarifas do governo de Dilma Rousseff?

Essa agenda regulatória foi desenvolvida intensamente ao longo dos últimos dois anos. Eu diria que faltavam algumas coisas, como o financiamento de debêntures de infraestrutura, uma perspectiva de taxas maiores de retorno e uma visão mais real e competitiva nos leilões, mas isso foi claramente colocado agora pelo novo ministro, reconhecendo o atual momento econômico. E nós tivemos um conjunto de melhoras, como o GSF [Generation Scaling Factor, ou Fator de Ajuste da Garantia Física] da crise hídrica das empresas.

Nós tivemos uma revisão extraordinária de tarifas no ano passado. O setor elétrico hoje está numa condição melhor, atraindo interesse. Há processos de consolidação, venda de empresas e leilões em curso porque a agenda regulatória foi desenvolvida e acho que, agora, estamos bem na frente dos outros segmentos da infraestrutura. É uma inspiração para os demais.

A Operação Lava-Jato está investigando contratos antigos da Eletrobras. Como a empresa está colaborando com estas investigações? Há um plano de compliance?

Sim. Nós criamos uma diretoria de compliance. Eu admiti uma pessoa da iniciativa privada para estar conosco, que tem uma formação na área de processos, controles, riscos e governança. Há cerca de um ano, quando começou esse evento, nosso conselho de administração constituiu uma comissão independente, liderada pela ex-ministra Ellen Gracie, e contratamos um conjunto de advogados para fazer o processo de investigação internamente. Vamos reconhecer todos esses achados no nosso balanço de 2014 e 2015, até o final de outubro.

Em que pé está o arquivamento do 20-F junto ao órgão regulador americano?

O pessoal de Nova York, a KPMG [auditoria que acompanha o processo], nos deu até o dia 11 de outubro para fazer esse registro. O trabalho vem sido conduzido paralelamente por uma comissão de investigação, junto com os auditores da companhia. Estamos na fase de conclusão dos relatórios do 20-F. Ao longo da próxima semana, devemos ter interação direta com os auditores e submeter o formulário ao conselho no dia 10. Isso se viabilizando, vamos a Nova York fazer o registro no dia 11.

Qual o efeito prático disso para a Eletrobras e qual o impacto na negociação de ações?

Se nós tivermos o reconhecimento disso, temos a possibilidade de que ela saia do balcão e volte para o pregão. Mas o que vai fazer com que as ações da Eletrobras subam é a efetivação de um plano estratégico focado em três pilares: governança e compliance, eficiência operacional e disciplina financeira.

[videos-abril id="56ed92b165a4eadf15aa59e0f1f4cc5c?autoplay=true&startoutput=720p" showtitle="false"]

Para ler esta entrevista primeiro, assine EXAME Hoje.

Acompanhe tudo sobre:EletrobrasEmpresasEmpresas estataisEnergia elétricaEstatais brasileirasHoldingsServiços

Mais de Negócios

Sears: o que aconteceu com a gigante rede de lojas americana famosa no Brasil nos anos 1980

A voz está prestes a virar o novo ‘reconhecimento facial’. Conheça a startup brasileira por trás

Após perder 52 quilos, ele criou uma empresa de alimento saudável que hoje fatura R$ 500 milhões

Esta empresária catarinense faz R$ 100 milhões com uma farmácia de manipulação para pets