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Wesley, o Batista solto. E no comando

Enquanto Joesley Batista chega a Brasília para a prisão temporária, seu irmão, Wesley, assume definitivamente as rédeas da JBS

Wesley Batista: como não aparece nos áudios mais recentes, ele não corre o risco de perder o benefício da delação premiada (Germano Lüders/Site Exame)

Wesley Batista: como não aparece nos áudios mais recentes, ele não corre o risco de perder o benefício da delação premiada (Germano Lüders/Site Exame)

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Letícia Toledo

Publicado em 11 de setembro de 2017 às 15h35.

Última atualização em 11 de setembro de 2017 às 16h36.

Enquanto o empresário Joesley Batista chega a Brasília para cumprir a prisão temporária de cinco dias — que pode ser alongada — seu irmão mais velho, Wesley Batista, segue em São Paulo para encarar sua pedreira particular. Joesley pode ter o acordo de delação revogado e pegar uma longa pena pelos crimes revelados ao gravador. Wesley luta para manter seu cargo no frigorífico JBS, a principal empresa do conglomerado da família, o J&F. O segundo maior acionista da empresa, o banco de fomento BNDES, que tem 21,3% das ações, tenta afastá-lo a qualquer custo.

Em meados de agosto, o banco surpreendeu advogados e o mercado ao publicar uma carta defendendo que os acionistas da JBS votassem pela abertura de uma ação de responsabilidade contra os irmãos Joesley e Wesley Batista pelos prejuízos causados ao patrimônio da companhia, decorrentes “dos atos ilícitos confessados” no acordo de delação premiada. A ação obrigaria Wesley Batista a deixar a presidência da empresa. A assembleia, prevista inicialmente para 1º de setembro, foi adiada pela justiça por 15 dias após o embate entre J&F e BNDES. A nova assembleia ainda não foi marcada.

Desde que assumiu o cargo, em junho, o atual presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro, vem defendendo o afastamento dos Batista. Em maio, o presidente Michel Temer, que indicou Rabello ao cargo, foi acusado de corrupção por Joesley Batista em sua delação. E a corrupção dos Batista de fato causou um enorme prejuízo à companhia. O problema, segundo analistas e consultores ouvidos por EXAME, é que forçar a saída de Wesley pode piorar ainda mais as coisas.

“Mexer na presidência da empresa assim, de uma hora para a outra, não faz sentido. O Wesley conhece a fundo a operação da JBS. Os motivos do BNDES são claramente políticos”, diz uma pessoa que acompanha a empresa. “Sua ausência seria sentida mesmo em uma transição programada. Se for feita de uma hora para a outra, a empresa vai sentir bastante”, diz outro executivo do setor.

E há outro problema: conforme publicado na coluna Primeiro Lugar da última edição da revista EXAME, os credores da JBS podem exigir o pagamento antecipado de parte das dívidas da empresa se Wesley deixar a presidência da companhia. A permanência dele é uma das exigências que constam nos contratos de emissão de títulos de dívida da JBS.

Uma saída abrupta de Wesley seria prejudicial também para o dia a dia da companhia, já que o executivo está na presidência desde 2011 e conhece o complexo negócio como ninguém. “É uma empresa grande e com uma capilaridade geográfica”, diz um consultor. “O Wesley continua sendo uma figura querida dentro da JBS, diferentemente de seu irmão”.

A consultora Betania Tanure, especialista em gestão empresarial, não quis comentar o caso da JBS especificamente, mas afirma que é importante que qualquer transição no comando das empresas impactadas pela operação Lava-Jato aconteça de forma planejada, para que não haja uma ruptura abrupta e prejudique a companhia. “Os indivíduos culpados têm que ser exemplarmente punidos, claro. Agora, o quanto as empresas têm que ser punidas também? É preciso preservá-las”, diz.

À frente da companhia, Wesley vem coordenando a venda de ativos e a reestruturação da JBS desde a divulgação da delação premiada, em 17 de maio. O plano de abrir capital nos Estados Unidos, e com isso diminuir a dívida de 50,3 bilhões de reais foi adiado indefinidamente. Em junho, a JBS anunciou a venda de uma série de ativos para levantar 7 bilhões de reais. A primeira venda foi a das operações no Mercosul para a concorrente Minerva, por 300 milhões de dólares. A companhia também deve receber cerca de 1,11 bilhão de reais pela venda da empresa de lácteos Vigor, na qual detinha 19,43%.

Nesta segunda-feira a JBS anunciou a venda de sua empresa irlandesa Moy Park à sua controlada americana Pilgrim’s Pride por 1,3 bilhão de dólares. “Em última análise, esse negócio apenas transfere internamente a liquidez de seu veículo americano para a JBS (…) não haverá qualquer redução na dívida consolidada absoluta para a JBS”, dizem analistas do banco JP Morgan em relatório. Além das vendas, em julho a JBS fechou um acordo com os bancos credores para adiar o pagamento de 21,7 bilhões de reais em dívidas.

O gestor Wesley Batista

Wesley é o irmão do meio entre os três filhos homens de José Batista Sobrinho (o “JBS”), e sempre teve o perfil mais “mão na massa”. Na divisão informal de tarefas entre os Batista, a ele coube o comando dos negócios, enquanto para Joesley ficaram as “relações governamentais” — o que, como se viu mais tarde, incluía a operação de um complexo esquema de compra de políticos e pagamento de propina.

Antes de se tornar um dos maiores conglomerados empresariais do Brasil, o embrião da JBS foi o pequeno açougue Casa de Carnes Mineira, criado pelo patriarca da família Batista em 1953, em Anápolis (GO). Assim como os irmãos, Wesley não concluiu o Ensino Médio, ocupado com o trabalho nos frigoríficos da família.

Entre 1960 e 2005, quem comandava o grupo era o irmão mais velho, José Batista Júnior, o “Júnior da Friboi” (o empresário, que hoje vive nos Estados Unidos, não apareceu em nenhuma das investigações da Lava-Jato até agora). Com sua saída, o então grupo Friboi mudou de nome e iniciou um processo de internacionalização, no qual Wesley foi o principal nome.

Sem nem mesmo falar inglês, o Batista do meio se mudou os Estados Unidos, e lá ficou por quatro anos, sendo responsável por transações essenciais para a guinada internacional do grupo, como a compra da Swift Foods Company, em 2007, e no ano seguinte, da Pilgrim’s, hoje a segunda maior processadora de frango do mundo.

Quando voltou ao Brasil e assumiu a presidência da JBS depois da temporada nos Estados Unidos, a Wesley coube a missão de integrar as operações brasileiras às americanas. Enquanto esteve fora, o irmão Joesley comandava as operações locais da JBS, que já não era mais apenas uma empresa de carnes, mas tinha expandido seus negócios para outras áreas, incluindo fora do setor alimentício. Em 2012, os Batista criaram a holding J&F Investimentos, que reúne todas as empresas do grupo como a Vigor, de produtos lácteos, a Eldorado Brasil, de celulose, a Alpargatas, de vestuário e dona da marca Havaianas e até a emissora de Canal Rural integram o portfólio do grupo. Vigor, Eldorado e Alpargatas foram vendidas após a delação dos executivos.

Graças à expansão, o faturamento anual da JBS foi de 4 bilhões de reais para 160 bilhões entre 2007 e 2016, o que tornou o grupo o segundo maior conglomerado industrial do país, atrás da Petrobras. As empresas da J&F operam em cinco continentes e exportam para mais de 150 países.

Outra parte significativa para a guinada de crescimento dos Batista veio do apoio do BNDES, que entre 2005 e 2014, investiu 10,63 bilhões de reais na JBS — aportes que estão agora sob escrutínio.

As investigações

Embora Joesley esteja muito mais nos holofotes nas negociações com o Ministério Público, as próprias notas da JBS sobre o tema, assinada pelos irmãos com o frequente uso do pronome “nós”, mostram que o esquema de corrupção da JBS não era uma operação solitária. Wesley prestou depoimento diversas vezes ao Ministério Público Federal, quando detalhou os esquemas de pagamento de propina da JBS.

Em seus depoimentos de delação premiada, Wesley relatou repasses de propina ao ex-governador de Mato Grosso Silval Barbosa (PMDB) e um esquema de benefícios fiscais para redução da alíquota de 30% do ICMS no Mato Grosso do Sul, do início dos anos 2000, sob governo de Zeca do PT (PT), até o fim do ano passado, sob André Puccinelli (PMDB) e Reinaldo Azambuja (PSDB). Entre estados, detalhou pagamentos também ao governador Cid Gomes e à campanha do aliado Camilo Santana, no Ceará, por meio de notas frias e doações para liberar créditos devidos pelo estado à empresa.

Em outro anexo, tratou de Lúcio Funaro como operador e recebedor de propina de “Eduardo Cunha, Caixa Econômica Federal, FI-FGTS e Ministério da Agricultura” e detalhou negócios que a empresa tinha com o doleiro, que hoje acaba de finalizar também sua delação. Ainda nos círculos do PMDB, confirmou entregas de vantagens indevidas da empresa à senadora Marta Suplicy (SP), por meio de seu marido Márcio Toledo.

Outro alvo foi o ministro Gilberto Kassab (PSD), da Ciência e Tecnologia, que teria recebido até 20 milhões de reais em propinas e contratos durante seis anos. “Pagávamos porque era ministro algumas vezes, tinha certa influência”, disse Wesley.

Boa parte de sua delação serve de confirmação aos relatos de Joesley, responsável direto pelos “trâmites” ilícitos e que tinha mais contato com a classe política corrompida. Em virtude disso, os benefícios de imunidade judicial retirados de Joesley foram mantidos a Wesley. A Procuradoria-Geral da República entende que “a revisão [dos benefícios] é com base nos áudios. Ele [Wesley] não aparece nas conversas”, como diz nota enviada à reportagem de EXAME. “Cada colaborador firma um acordo. Estão sendo revistos os acordos de três dos sete colaboradores: Joesley Batista, Ricardo Saud e Francisco de Assis”, diz a PGR.

Além da Operação Lava-Jato, as operações Bullish, Greenfield, Carne Fraca e Cui Bono?, da Polícia Federal, também apuram desvios, pagamentos de propina e fraudes na liberação de recursos públicos envolvendo ações da holding. A Bullish, que apura escândalos com o BNDES, a Greenfield, que investiga relações do grupo com fundos de pensão, e Cui Bono?, que envolve a Caixa Econômica Federal, são, segundo os depoimentos, atribuições do irmão Joesley. Wesley deve ter participação efetiva apenas na Carne Fraca, já que conhece os detalhes de esquema de corrupção no Ministério da Agricultura.

Suas pendências com a Justiça, portanto, vão longe. Mas, a julgar pelo comportamento do mercado, os investidores estão satisfeitos com ao vê-lo sentado na cadeira de presidente. Nesta segunda, as ações da JBS, embaladas pela venda da Moy Park, chegaram a subir 2% até o início da tarde. Para uma empresa que perdeu 3,3 bilhões de reais do valor de mercado desde o início das investigações, não deixa de ser uma boa notícia.

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