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Varejo de maconha finca bandeira na Quinta Avenida

Mesmo sem permitir a venda recreativa, cidade ganha unidade da MedMen, companhia da Califórnia que já vale estimados 1 bilhão de dólares

LOJA DA MEDMEN EM NOVA YORK: companhia tem 18 unidades nos EUA e prevê IPO para este ano  / Mike Segar/ Reuters

LOJA DA MEDMEN EM NOVA YORK: companhia tem 18 unidades nos EUA e prevê IPO para este ano / Mike Segar/ Reuters

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Carolina Riveira

Publicado em 30 de abril de 2018 às 09h36.

Última atualização em 30 de abril de 2018 às 19h19.

NOVA YORK – Quase 200 metros quadrados com paredes brancas, vendedores uniformizados e telas modernas mostrando informações sobre produtos. Poderia ser só mais uma loja vendendo smartphones em Nova York, mas o novo espaço na Quinta Avenida, um dos centros comerciais mais famosos do mundo, é destinado a produtos feitos à base de maconha.

A loja foi inaugurada no fim de abril — no 420, ou 20/4, conhecido informalmente como “dia da maconha” — pela MedMen, empresa americana de varejo e cultivo legalizado da erva. Fundada em 2010 pelos americanos Adam Bierman e Andrew Modlin, a MedMen tem 18 lojas nos Estados Unidos e vale estimados 1 bilhão de dólares. Ou seja: é um unicórnio da maconha.

Em Nova York, nem todos poderão comprar os produtos da empresa, já que a lei do estado só permite a comercialização de maconha para fins medicinais. Dos 20 milhões de moradores do estado de Nova York, pouco mais de 30.000 possuem autorização para esse tipo de produto, de acordo com dados de setembro de 2017 do Departamento de Saúde.

Assim, as restrições fazem da nova loja nova-iorquina praticamente insignificante no portfólio da MedMen. O principal mercado é a Califórnia, sede da empresa e onde, além da erva medicinal, a maconha para fins recreativos foi legalizada em 2016.

A companhia reconhece que o intuito, por enquanto, é passar uma mensagem. “Existe uma razão para abrirmos uma loja aqui, no centro de Manhattan, na Quinta Avenida, o distrito comercial mais icônico do mundo”, diz Daniel Yi, vice-presidente de comunicações da MedMen. “Nova York ainda não é muito bem um mercado nesse momento. Estamos pensando no futuro.”

No “feriado mundial da maconha”, EXAME visitou o primeiro dia de operação da nova loja. “Eu gostei do espaço porque aqui tem mais cara de loja mesmo, não como outros lugares que são mais como uma clínica”, disse a estudante Syril, 21 anos, que estava na fila para pagar sua compra, enquanto vendedores em clima festivo distribuam óculos de sol com o logo da MedMen aos clientes. A estudante, que não quis se identificar com o sobrenome, tem uma licença médica para usar produtos de cannabis contra seu transtorno de ansiedade.

Bob, 63 anos (e que também não quis fornecer seu sobrenome), usa maconha há mais de uma década contra as dores. “Os produtos são muito importantes no meu tratamento, e no tratamento de vários problemas mais ou menos graves”, diz.

A lei de Nova York não permite a comercialização da erva em si, apenas de uma gama limitada de produtos como pílulas, gel e canetas vaporizadas, em dosagens de acordo com a condição médica de cada cliente. Mas mesmo quem não tem licença para comprar pode entrar no local, conversar com os vendedores e simplesmente se informar sobre o tema.

Em uma das paredes do espaço, um cartaz faz uma brincadeira com o conceito de “chapado”, e camisetas com o logo da empresa também estão à venda.

“Você está educando as pessoas, fazendo a maconha ser desestigmatizada”, diz Yi. Coreano, o executivo da MedMen morou no Brasil com a família dos sete anos de idade até o início da faculdade, quando se mudou para os Estados Unidos. Ele argumenta que o mercado brasileiro poderia se beneficiar de uma regulação mais abrangente em relação a esse tema.

“Quem quer usar maconha deveria poder fazer isso em um ambiente bonito e seguro como esse, onde você sabe o que está comprando. E não comprar de um traficante em uma esquina”, diz.

Efeito dominó

Nos Estados Unidos, a maconha é proibida pelo governo federal desde a década de 1930, mas cada estado pode fazer as próprias regras a respeito.

Hoje, o comércio é permitido para fins médicos em 29 dos 50 estados americanos, enquanto o uso recreativo para adultos é legalizado em mais nove estados. Colorado e Washington foram os primeiros a legalizar o uso recreativo, em 2012.

Neste ano, as vendas legalizadas no país devem superar 11 bilhões de dólares, gerando um impacto econômico de 21 bilhões na economia, segundo estimativas da BDS Analytics, consultoria especializada em cannabis. Em 2021, a previsão é que o mercado legal de maconha movimente 40 bilhões de dólares no país, gerando 414.000 empregos diretos e indiretos e mais de 4 bilhões de dólares em impostos.

Greg Shoenfeld, vice-presidente da BDS, afirma que estados como Nova York podem ser “decisivos” na discussão. A aprovação da maconha recreativa em estados vizinhos, como Massachusetts e Vermont, colocou pressão extra no debate. “Podemos ter um potencial efeito dominó nos próximos anos”, diz.

O atual governador de Nova York, o democrata Andrew Cuomo, é contra a permissão recreativa, embora apoie os produtos medicinais e pesquisa na área. O assunto vem sendo citado com frequência na campanha para governo do estado, cuja eleição acontece em novembro deste ano.

A rival de Cuomo nas primárias democratas, a atriz Cynthia Nixon, ex-estrela da série Sex and the City, é a favor da legalização, afirmando que isso geraria “milhares de dólares em impostos” e combateria o “racismo da guerra às drogas”.

Em 2017, 86% das prisões relacionadas a drogas na cidade de Nova York foram de negros ou hispânicos, segundo dados policiais da cidade levantados pelo site Politico.

Uma pesquisa do instituto Gallup no ano passado mostrou que 64% dos americanos são a favor da legalização do uso adulto da maconha para fins recreativos — mesmo entre os republicanos, tradicionalmente mais conservadores sobre o tema, o apoio à legalização é de 51%.

A tendência é que estados como Nova York ao menos expandam seus programas medicinais.

Yi lembra que, quando a MedMen abriu a primeira loja na Califórnia, o uso recreativo também não era permitido. “Não dá para esperar a recreação ser legalizada primeiro. Não se constrói uma estrutura da noite para o dia”, diz.

“É uma estratégia cara, mas é um exercício de marca”, avalia o analista Alan Brochstein, fundador da consultoria especializada em cannabis 420 Investor e do site de notícias New Cannabis Ventures. Ele afirma que muitos empreendedores vão para estados como a Califórnia e o Colorado, onde há menos restrições, mas muita competitividade. “Em Nova York, a MedMen quase não terá concorrência por enquanto”, diz.

PRODUTOS DA MEDMEN: loja vende apenas itens à base de maconha / Mike Segar/ Reuters

Um mercado como qualquer outro?

Há mais de 20.000 empresas que atuam no bilionário mercado americano de cannabis, segundo a agência Marijuana Business Daily. Tahira Rehmatullah, diretora do fundo de investimentos Hypur Ventures, aponta que as oportunidades são enormes para empreendedores de muitas áreas. “Muitos dos negócios ou produtos de outras indústrias também são necessários no mercado de cannabis: consultoria, contabilidade, serviços bancários, logística, tecnologia”, afirma.

Estados como Nova York ainda exigem que a mesma empresa cuide de toda a cadeia produtiva — o que faz varejistas como a MedMen serem obrigadas a plantar a erva que usarão em seus produtos. A falta de uma regulação nacional mínima também cria insegurança jurídica e institucional para empresas e investidores. “Os investimentos estão crescendo, mas os retornos ainda são baixos. Depende muito da capacidade dos investidores em esperar”, diz Shoenfeld, da BDS.

Ainda assim, analistas avaliam que, aos poucos, os Estados Unidos vão fazendo uma transição entre o país que liderou a guerra às drogas no século passado a um lugar onde maconha é sinônimo de inovação e empreendedorismo.

“Depois que os primeiros estados legalizaram, o público no geral e os congressistas começaram a se sentir mais confortáveis com isso”, diz Morgan Fox, porta voz do grupo pró-legalização Marijuana Policy Project. “Mas é difícil superar anos e anos de estigma.”

Enquanto aguarda mudanças nas regras americanas, a MedMen também trabalha na abertura do capital no Canadá, onde a maconha medicinal é legalizada em todo o território.

Como o IPO está previsto para o segundo trimestre, a empresa não divulga seu faturamento, mas Yi afirma que, entre janeiro de 2017 e janeiro de 2018, a receita quintuplicou, sobretudo graças ao mercado recreativo em expansão na Califórnia.

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