Método a seco dispensa o uso de barragens de rejeitos, cada vez mais temidas após dois grandes desastres em Minas Gerais; o último foi na cidade de Brumadinho (Adriano Machado/Reuters)
Reuters
Publicado em 9 de maio de 2019 às 21h45.
Última atualização em 10 de maio de 2019 às 08h34.
Rio de Janeiro — A Vale prevê investir 2,5 bilhões de dólares, em cinco anos, na ampliação de tecnologia de processamento de minério de ferro que dispensa o uso de barragens de rejeitos, cada vez mais temidas após dois grandes desastres em Minas Gerais em pouco mais de três anos. O último foi o de Brumadinho, que deixou, contabilizados até agora, 238 mortos
O objetivo é que o método, conhecido como de processamento a seco, por não utilizar água, seja aplicado em 70% da produção da mineradora até 2023, contra 60% atualmente, afirmou a maior produtora de minério de ferro à Reuters.
Os recursos, de acordo com a companhia, serão empenhados principalmente na conclusão da conversão da Usina 1, a principal de Carajás, além de projetos para atender o aumento de produção do S11D, maior empreendimento de minério de ferro da companhia, na Serra Sul de Carajás (PA), e em ativos de Minas Gerais.
Das 17 linhas de processamento da Usina 1, 11 já são a seco e as seis linhas a úmido restantes serão convertidas até 2022.
"Além disso, os recursos serão usados em projetos que estão em fase de licenciamento ambiental em Minas Gerais como Apolo e Capanema", afirmou o diretor de planejamento e desenvolvimento de ferrosos da Vale, Fabiano Carvalho Filho, em uma resposta por email.
A Vale indicou que o investimento não tem relação direta com os desastre de Brumadinho, que deixou 237 mortos confirmados, e Mariana, da Samarco, que matou outros 19, causando ainda o que é considerado o pior desastre ambiental do país.
Os aportes ocorrem como parte de um plano antigo da companhia, que disse ter investido quase 17,5 bilhões de dólares nos últimos dez anos em mineração a seco.
Em 2010, apenas 20% da produção da empresa era por meio do processamento a seco, contra 40% em 2014 e 60% em 2018, segundo a Vale.
Apesar da ampliação da mineração a seco, a Vale tem ainda mais de 500 barragens, diques e pilhas em suas atividades, no Brasil e no exterior.
A empresa pontuou que o processamento a seco está vinculado à qualidade do minério de ferro extraído na frente de lavra.
Em Carajás, onde o teor de ferro é elevado, acima de 64 por cento, o material somente é britado e peneirado, para ser classificado por tamanho.
As plantas de tratamento de Serra Leste, em Curionópolis, e do S11D, em Canaã dos Carajás, ambas no Pará, não utilizam água no tratamento do minério.
"No S11D, por exemplo, o uso da rota de processamento à umidade natural permite reduzir em 93 por cento o consumo de água quando comparado com um projeto convencional de produção de minério de ferro. A economia de água equivale ao abastecimento anual de uma cidade de 400 mil habitantes", disse a Vale.
Já em Minas Gerais, histórica região produtora do Brasil, mas que já contém muitos ativos em declínio, o teor médio é de 40 por cento de ferro. Para aumentar o teor, o minério é concentrado por meio do beneficiamento com água. O rejeito, composto principalmente por sílica, é depositado com a água nas barragens.
Em Minas Gerais, o processamento a seco foi ampliado de 20 por cento, em 2016, para 32 por cento, em 2018, segundo a Vale, que pontuou que esse tipo de processamento está presente em unidades como Brucutu, Alegria, Fábrica Nova, Fazendão, Abóboras, Mutuca, Pico e Fábrica.
Em outra frente, a empresa anunciou em fevereiro planos de investir 390 milhões de dólares, a partir de 2020, na implementação de tecnologia de empilhamento a seco de rejeito de minério em Minas Gerais.
Essa técnica permite a filtragem e reutilização da água do rejeito e possibilita que este último seja empilhado, reduzindo também o uso das barragens.
"O objetivo é alcançar até 70 por cento do rejeito disposto nos próximos anos, contudo, o sucesso depende do aprimoramento da tecnologia e de questões externas, como licenças ambientais", disse a empresa em seu levantamento, sem detalhar um prazo.
A Vale destacou, no entanto, que atualmente não existe operação de empilhamento a seco na escala de produção da Vale e em região com índices pluviométricos como os do Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais.
Segundo a companhia, a tecnologia de empilhamento a seco disponível hoje é usada quando há no máximo até 10 mil toneladas de rejeito produzidas por dia, em regiões com baixa incidência de chuva. Em Minas Gerais, a escala de produção de rejeito da Vale está, em média, em 50 mil toneladas/dia por unidade.
A empresa concluiu, no ano passado, estudos de um projeto piloto que teve início em 2011, com investimentos de 100 milhões de reais na pilha Cianita, em Vargem Grande. Os próximos testes, segundo a empresa, serão aplicados em escala industrial na mina do Pico, no município de Itabirito.
Outra tecnologia que vem sendo estudada pela Vale é a concentração magnética a seco do minério de ferro com base em tecnologia desenvolvida pela New Steel, empresa adquirida por ela no fim de 2018 por 500 milhões de dólares.
A empresa surgiu em 2007 e obteve patentes em 20 países, incluindo o Brasil, com seu método de beneficiamento, que dispensa o uso de água e permite que o rejeito gerado seja disposto em pilhas como estéril, semelhante ao que ocorre no empilhamento a seco.
Essa tecnologia, no entanto, está em fase de desenvolvimento industrial e ainda não está pronta para ser aplicada em larga escala.