Homem olha celular: por exemplo, pessoas que não deixam que celulares fiquem com pouca bateria tendem a evitar que seus saldos devedores baixem (Ingram Publishing/Thinkstock)
Da Redação
Publicado em 16 de novembro de 2015 às 18h44.
Eles não têm conta bancária, pontuação de crédito ou identidade financeira. Ou seja, um quarto da humanidade não consegue tomar empréstimos. Até agora.
Várias dezenas de startups dizem que desenvolveram formas de trazer esses dois bilhões de pessoas para o sistema financeiro internacional, monitorando a utilização de celulares e outros hábitos pessoais para prever a solvência.
Por exemplo, pessoas que não deixam que seus celulares fiquem com pouca bateria tendem a evitar que seus saldos devedores baixem.
Os mutuários que mais recebem do que efetuam ligações são riscos melhores de assumir e os candidatos que declaram o propósito de seu crédito em poucas palavras são melhores tomadores de empréstimos do que os que acabam escrevendo um ensaio.
Embora parte disso possa parecer pouco convincente à primeira vista, atualmente há 40 companhias -- algumas delas com financiamento de Peter Thiel e Pierre Omidyar -- que dizem estar abrindo uma nova fronteira.
Suas pontuações de crédito e empréstimos emitidos por meio de telefones celulares em todo o mundo em desenvolvimento estão baixando o custo, entre os credores tradicionais, de venda de produtos financeiros a uma classe média emergente.
Para Wall Street, isso se traduz em uma possível nova classe de ativos na qual investir: empréstimos no varejo para consumidores em mercados emergentes, os motores do futuro crescimento econômico global.
Novas formas
As empresas dizem que a utilização de celulares, navegadores web e redes sociais, os registros de pagamento de contas de serviços públicos e os testes psicométricos dão aos credores novas formas de replicar, em questão de segundos, o trabalho tradicionalmente cauteloso dos especialistas em empréstimos.
Como os celulares são cada vez mais usados para guardar e transferir dinheiro, eles também contêm muita informação sobre a solvência.
A Kreditech, com sede em Hamburgo, Alemanha, é a maior das novas companhias e não lhe falta ambição.
Ela vê seu futuro como a Amazon dos créditos de consumo nos mercados emergentes, disse Sebastian Diemer, um dos dois fundadores e atualmente seu CEO. A empresa arrecadou mais de 306,5 milhões de euros (US$ 328 milhões) em dívidas e ações desde sua fundação, em 2012. Entre seus financiadores estão Thiel, a empresa de private equity J.C. Flowers Co., com sede em Nova York, e a empresa de capital de risco Amadeus Capital Partners.
A First Access, uma startup com sede em Nova York, extrai dados armazenados nos celulares de mutuários tanzanianos e quenianos para recomendar um valor de empréstimo a bancos e credores de microfinanças em até 90 segundos.
Os algoritmos da empresa podem cortar os custos de subscrição dos clientes em mais de 92 por cento, segundo Nicole Van Der Tuin, cofundadora e CEO da empresa.
Entre os financiadores da First Access estão um dos fundadores da Capital One Financial Services, Nigel Morris, e The Social Entrepreneurs’ Fund, o fundo de capital de risco de Bill Ackman que investe em companhias que promovem a inclusão financeira.
Rotina
Uma chave da solvência é a rotina diária pessoal. As pessoas que compram a mesma quantidade de minutos de crédito no celular no mesmo dia todas as semanas apresentam melhores riscos creditícios do que as que compram uma grande quantidade e depois deixam suas contas vazias, segundo Van Der Tuin, da First Access.
Quando os telefones permanecem no mesmo lugar todos os dias, este muitas vezes é um sinal de que seu dono está trabalhando.
Além disso, nos países com mercados emergentes, os celulares servem cada vez mais como livros-razão das movimentações de dinheiro.
Portanto, o monitoramento dos registros de ligações se transforma em um simples substituto do exame de uma conta bancária.
Ao mesmo tempo, segundo as startups, as avaliações tradicionais do risco creditício têm ignorado a importância adicional do capital social.
Além de funcionar como extrato de conta bancária na prática, a presença em dispositivos móveis e on-line indica quão bem os mutuários são tratados pela sua comunidade.
Em abril, o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, lançou uma campanha para conseguir o acesso financeiro universal por volta de 2020 e ele tem encorajado as novas abordagens das startups.
Por outro lado, é improvável que as novas empresas substituam os credores ou departamentos de crédito tradicionais.
Em vez disso, elas provavelmente os complementarão, disse Alex Johnson, analista sênior da Mercator Advisory Group.
“É incrivelmente difícil construir do zero uma empresa com vários mercados que possa substituir as décadas de relacionamentos que essas instituições tradicionais desenvolveram com os bancos globais”, disse Johnson.
“Há suficiente mercado para que esses fornecedores consolidados se foquem em mercados menos desenvolvidos que os EUA e a Europa, mas ainda lhes falta muito”.