Renata Barcelos Moreira dos Santos, da Fundação Dom Cabral: "Resultados realmente desafiadores não são obtidos por um único indivíduo. Eles exigirão um time coeso, multidisciplinar, autônomo e forte tecnicamente"
Redação Exame
Publicado em 13 de novembro de 2023 às 10h02.
Última atualização em 13 de novembro de 2023 às 10h15.
No exercício de estruturação e acompanhamento da gestão de empresas de médio e grande portes, encontramos, há anos, alguns comentários corriqueiros: “as pessoas não vestem a camisa” ou “elas não têm visão de dono”, assim como suas variações, são frases que demonstram tanto os déficits nos resultados, quanto déficits nas crenças e comportamento das pessoas.
Naturalmente, este tipo de conclusão reflete, mais claramente ainda, o comportamento e o desempenho do próprio líder que a profere, afinal, a liderança (formal ou informal) é uma das molas propulsoras fundamentais para a formação de times de sucesso.
Ela inspira, envolve e orienta as pessoas diante dos desafios, tratando tanto os aspectos técnicos e comportamentais, quanto os emocionais envolvidos.
Empresas são sistemas abertos e complexos sujeitos a elementos externos sobre os quais não se tem autoridade. Diante disto, seus resultados não podem ser garantidos por meio de programações puramente mecânicas de seus processos.
Tratando-se de sistemas sociais, as pessoas são o grande diferencial na busca de melhorias e de resultados excepcionais e compreender os elementos mais relevantes na promoção da inteligência e motivação coletiva nos times torna-se fundamental. Com o intuito de orientar líderes e liderados nesta percepção, listamos seis destes elementos:
É sabido que as pessoas tendem a ter aversão à mudança. Na prática, tendem, inclusive, a terem dificuldades para perceberem onde precisam mudar suas próprias crenças e comportamentos individuais.
Entretanto, em tempos desafiadores, ficar no mesmo lugar pode ser o maior risco que a empresa pode correr. Ao mesmo tempo em que novas oportunidades se abrem, ameaças grandes rondam a espreita (por exemplo, se novas demandas surgem no mercado, o crescimento aquem do esperado pode abrir espaço para os concorrentes).
Diante disto, compartilhar a visão do futuro buscado pela empresa de forma que todos compreendam os benefícios de abraçarem o desafio e os riscos de não fazê-lo torna-se requisito básico para a busca de argumentos para a mudança.
Uma visão de futuro é inspiradora e motivacional. Entretanto, ela aborda questões macro, ou seja, desafios de alto nível. Diante da complexidade da empresa e do mercado, é necessário que se estabeleça com clareza o que significa o sucesso da jornada que se visa percorrer.
Naturalmente, o esforço dos times tem valor, entretanto, se não há clareza do que se deseja obter, perde-se carga com ações descoordenadas que não contribuem com os resultados mais importantes e levarão à frustração.
A compreensão deve ser clara, portanto, números devem garantir a objetividade: se você não sabe o que quer medir, provavelmente, não entende o resultado que quer obter.
Resultados realmente desafiadores não são obtidos por um único indivíduo. Eles exigirão um time coeso, multidisciplinar, autônomo e forte tecnicamente. Alguns líderes tendem a assumir para si a coordenação de todos os esforços, centralizando a tomada de decisão e, até mesmo, assumindo a operação.
Este tipo de comportamento ocorre por vícios de poder, paternalismo ou falta de confiança e traz diversos resultados negativos, tais como:
É importante estabelecer alçadas de autoridade para que as pessoas aprendam a solucionar problemas entre si, sem onerar as lideranças sem necessidade;
O clássico PDCA ainda é um modelo extremamente útil para o atingimento de metas. Simples de se entender, mas difícil de ser aplicado, em diversas empresas, o método ainda sofre o que eu chamo de ‘vício de foco no C’.
É que, alguns times, apesar de definirem objetivos claros e baseados em métricas, se baseiam mais na etapa de C (checagem) do que no P (planejamento).
São aqueles casos nos quais impera uma lógica de ‘autópsia’: apenas quando não se bate uma meta, olha-se para trás e percebe-se que o desafio era maior do que se esperava.
O pior: mesmo depois dos primeiros fracassos, ao invés do investimento dedicado no esforço de planejamento — que inclui análises de dados e causas — segue-se apenas tratando efeitos e operando em uma lógica de tentativa e erro desnecessária.
Ora, se há desafio no resultado buscado por um time, um plano analítico, com base no qual se aprende, deve ser construído (o olhar para a frente).
O plano não deve ser uma camisa de força, mas sim, um instrumento de reflexão e aprendizado que oriente as próximas ações do time e demonstre os déficits de recursos e riscos que eventualmente existam e precisem ser contornados. Soa simples? Sim, eu sei. Entretanto, a falha neste modelo prospectivo de gestão é mais corriqueira do que se pode pensar.
Em sala de aula, quando perguntamos aos executivos sobre o que entendem sobre feedback, frequentemente, a resposta está baseada em um instrumento formal, escrito e com data definida. Entretanto, a cultura de resultados é construída a todo momento, nos menores e maiores eventos e interações.
Neste sentido, o feedback sempre está presente e depende do comportamento, dos exemplos e de cada palavra (dita ou não dita) adotados pelos líderes. A cada momento em que um líder não se pronuncia diante de um déficit comportamental ou técnico dos times, está, na verdade, validando o seu modus operandi.
Quando não investe na gestão prospectiva citada acima, está também, dizendo aos times que ela é desnecessária. Ser líder é, muito mais do que ter um cargo ou reconhecimento, ser uma referência constante para as pessoas, nos mínimos detalhes.
A busca pelos resultados é mais do que algo objetivo e racional que possa ser mecanicamente calculado. Ela depende de percepções subjetivas das pessoas envolvidas que permitam a valorização do esforço a ser empreendido.
Diante disto, ela pode ser analisada no âmbito da cultura, ou seja, do conjunto de crenças, valores e comportamentos de um time, a qual é largamente reconhecida como aspecto fundamental para a execução da estratégia.
Em recente artigo publicado na revista Harvard Business Review, Jay Barner e colegas contam sobre a importância das estórias reais que, ao serem contadas e recontadas ao grupo, materializam com mais facilidade os comportamentos a serem valorizados em um grupo. A importância das estórias (escritas ou orais) é antiga conhecida inclusive no campo da evolução do conhecimento e da antropologia.
Elas geram engajamento, sentido e memória, traduzindo de forma mais objetiva o que se pretende demonstrar e promover nos times.
Enfim, apesar de estruturado em seis práticas, este artigo não tem a intenção de simplificar excessivamente um tema que pode ser reconhecido como complexo, em especial no que se refere à cultura.
‘Receitas de bolo’ não existem no campo organizacional e cada empresa precisa encontrar sua forma de fazer as coisas.
Entretanto, os seis pontos citados acima podem ser bem explorados no sentido de gerar questionamentos sobre a forma como estas boas práticas são praticadas na sua empresa.
Perguntas do tipo “o que posso melhorar?” ou “será que estamos, realmente, fazendo isto?” são motivadoras de uma análise crítica que pode permitir uma revisão importante na forma como se pensa em atingir as pessoas.