Plataforma da Teladoc, empresa de telemedicina americana: ação acumula alta de 140% no ano (Teladoc/Divulgação)
Carolina Riveira
Publicado em 21 de junho de 2020 às 08h00.
Última atualização em 12 de julho de 2020 às 13h38.
As empresas de serviços de saúde online estão em foco como nunca na pandemia do novo coronavírus. No Brasil, algumas delas foram especialmente beneficiadas com uma regulação mais ampla implementada no país que autorizou consultas pela internet e até mesmo receita online de medicamentos -- a chamada telemedicina.
Uma das maiores no mundo no setor, a americana Teladoc Health, com presença em mais de 100 países, agora expande sua atuação no Brasil. Antes voltada só a serviços para empresas no país, a companhia lançou neste mês um aplicativo para pessoas físicas. A expectativa é atender mais de 10 milhões de brasileiros até 2021.
O aplicativo da Teladoc conecta médicos de diferentes especialidades interessados em atender pela plataforma a clientes que buscam uma consulta. Os valores são entre 80 e 100 reais por consulta.
Segundo o diretor responsável pela empresa no Brasil, Jean Marc Nieto, o objetivo é reduzir os preços no futuro oferecendo planos de saúde mensais ou anuais, como a empresa já faz em outros países.
Com capital aberto na NYSE, uma das bolsas de Nova York, a Teladoc se estabeleceu no Brasil herdando a operação da espanhola Advance Medical, comprada em 2018 por 352 milhões de dólares. A Teladoc já era líder no mercado americano, enquanto a Advance tinha maior presença global, em regiões como Ásia e América Latina. No Brasil, a Advance atuava desde 2014 com serviços corporativos.
Hoje, a Teladoc tem 50.000 médicos cadastrados globalmente, e mais de 100 milhões de vidas. Segundo uma pesquisa com clientes do serviço, o índice de resolução de problemas é de 92%.
Mesmo antes do novo app voltado a pessoas físicas, a operação no Brasil já tinha mais de 1 milhão de clientes geridos pelo escritório da empresa, em São Paulo, diz Nieto, que estava na Advance desde 2014 e, depois da fusão, se juntou à Teladoc. "Apesar de ser uma empresa multinacional, temos serviços customizados e adaptados 100% para os brasileiros", diz.
Nieto afirma que, no Brasil, a companhia acelerou o passo diante da alta demanda que surgiu após a pandemia do coronavírus, mas que muita da estrutura já estava pronta dentro da regulação permitida pelo Conselho Federal de Medicina à época. O aplicativo lançado agora já vinha sendo planejado desde março passado, embora suas funcionalidades agora possam ser ampliadas com a regulação mais permissiva.
O executivo afirma que o app da Teladoc atua de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados, que começaria a vigorar no Brasil neste ano mas foi adiada em meio à pandemia. "Há muitos serviços surgindo, mas poucos atuam dentro dessas regras", diz.
Em meio à alta procura pela telemedicina durante o isolamento social, o faturamento da Teladoc no primeiro trimestre, de janeiro a março, subiu 41%, para 181 milhões de dólares, acima das projeções dos analistas -- embora a empresa ainda registre prejuízo, que foi de quase 30 milhões de dólares no primeiro trimestre.
Os investidores estão otimistas com o avanço da telemedicina. As ações da Teladoc subiram mais de 140% nos Estados Unidos desde o começo do ano. Na sexta-feira, 19, a ação chegou a operar em seu maior patamar da história e fechou o pregão negociada na casa dos 201 dólares e valor de mercado de 15,8 bilhões de dólares.
Além do serviço aos usuários, a plataforma da Teladoc também oferece a funcionalidade a médicos que queiram atender seus próprios pacientes usando a ferramenta -- neste caso, é o médico quem decide quanto cobrar pela consulta, e a Teladoc fica com uma taxa pelo uso do software.
"Os próprios médicos foram pegos de calça curta: primeiro, porque a demanda diminuiu com a atenção voltada ao coronavírus, e, segundo, porque eles se viram sem uma plataforma para atender seus pacientes à distância", diz o também médico Jimmy Ayoub, diretor de inovação e produtos da Teladoc.
Ayoub afirma que, embora haja muitos médicos atendendo por chamadas via ferramentas como Zoom e WhatsApp, esse tipo de software não traz a segurança de proteção de dados necessária na relação-médico paciente. "Além do compartilhamento de informações sem proteção, se o paciente chama o médico no WhatsApp fora da consulta, como cobrar isso? O médico se vê em uma situação muito mais complexa na pandemia", diz.
Com o coronavírus causando a morte de mais de 5.000 brasileiros por semana no último mês e pacientes com covid-19 presentes em hospitais brasil afora, a tendência é que haja uma menor procura pelo tratamento de outros quadros crônicos importantes, como câncer, diabetes, hipertensão, infarto. É neste cenário que a telemedicina espera ser útil, dizem os executivos.
A pandemia ainda deve ser realidade no Brasil e no mundo por meses ou mesmo anos, antes que se chegue a uma vacina produzida em massa. Assim, a expectativa é que milhões de pessoas usem pela primeira vez serviços de telemedicina e se habituem a eles. "Entendemos que, nesse quesito, será muito difícil voltar ao cenário pré-covid", diz Nieto.
Antes do coronavírus, os serviços da Teladoc oferecidos a empresas clientes atuavam dentro das limitações da regulação, como uma complementação ao plano de saúde tradicional. "Nessas empresas, a telemedicina já vinha para complementar, para entender o que o paciente precisava, evitar que ele precisasse ir ao pronto socorro por um motivo mais simples", diz Ayoub.
Na outra ponta, alguns dos clientes são operadoras de saúde e grandes e médios hospitais, como Aon, Porto Seguro e o Hospital Sírio-Libanês que usam os serviços de software da Teladoc para seus aplicativos e serviços próprios. Para os hospitais, por exemplo, há softwares avançados do tipo white-label (sem rótulo, que o hospital pode personalizar com sua própria identidade visual) em que é possível ver se há fila no hospital, ou para que um médico possa, à distância, coordenar junto com sua equipe algum tipo de gestão de leitos.
O mercado brasileiro em saúde é o segundo maior do mundo, diz Nieto, atrás dos Estados Unidos, o que o torna especialmente visado pelas empresas do segmento. O executivo avalia que o mercado brasileiro é mais similar ao americano do que ao europeu. "Apesar da existência do Sistema Único de Saúde (SUS), há um setor de saúde privada grande, e queremos oferecer uma opção acessível", diz.
Em meio às doações durante a pandemia, a Teladoc também fez parceria com a empresa de soluções em messageria corporativa Wavy, do grupo Movile (o mesmo dono de iFood, de delivery, e Sympla, de ingressos), para criar um robô que dá algumas orientações iniciais a pacientes em situação de vulnerabilidade via WhatsApp. A conversa é depois transferida para um humano, primeiro um enfermeiro e, caso haja necessidade, um médico.
Com a capilaridade global que ganhou devido à expansão, a Teladoc tem como um dos objetivos se tornar um app "reconhecível em qualquer lugar", caso seus clientes viajem para outros países em que a empresa está presente, por exemplo. "Eu uso o exemplo do Uber: se você for para os Estados Unidos, consegue pedir uma corrida sem fazer um novo download. A ideia da Teladoc é que se consiga ter acesso em qualquer lugar do mundo, receber uma receita, fazer uma consulta", diz Ayoub.