Barroso: 25 milhões de reais para fazer crescer novos negócios dentro da companhia (.)
Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h10.
Desde que assumiu a presidência da TAM, em dezembro, o mineiro Líbano Barroso se acostumou a trabalhar diante da incessante movimentação de aviões no aeroporto de Congonhas, na zona sul de São Paulo. Todos os dias, mais de 500 aeronaves passam em frente à janela de sua nova sala, a poucos metros da pista. Barroso, porém, não pode se distrair com esse vaivém frenético. Boa parte de sua missão hoje exige olhar bem além dos pousos e das decolagens - e repensar o papel de atividades que até pouco tempo atrás eram apenas coadjuvantes entre os negócios da maior companhia aérea brasileira. O passo decisivo dessa estratégia aconteceu no dia 5 de fevereiro, quando a TAM abriu o capital da Multiplus, a empresa criada a partir de seu velho programa de fidelidade. Resultado de um projeto que teve a adesão de quatro parceiros - Walmart, Oi, Ipiranga e Livraria Cultura -, a nova empresa tem valor de mercado de 3 bilhões de reais, o equivalente a 62% do que vale a própria TAM. (veja quadro). Barroso agora prepara outras unidades de negócio para seguir o mesmo caminho - um projeto que consumiu investimentos de 25 milhões de reais desde 2007. Seu plano é transformar em empresas independentes três áreas que hoje estão incorporadas ao dia a dia da TAM: a operadora de turismo, a transportadora de cargas e o centro de manutenção de aviões, localizado em São Carlos, no interior paulista. "Em breve, a companhia aérea vai ser apenas nossa espinha dorsal", diz Barroso.
Trata-se de um movimento que vem se tornando comum no Brasil - e do qual o empresário Eike Batista é ao mesmo tempo o pioneiro e o mais bem sucedido representante. Desde 2006, Eike levantou 10,1 bilhões de reais de investidores em IPOs de empresas incipientes, mas com promessa de alto retorno. Foi graças a isso que Eike ocupou o posto de oitavo homem mais rico do mundo, com uma fortuna estimada em 27 bilhões de dólares, de acordo com a recém- divulgada lista da revista americana Forbes - em 2009 ele ocupou um "modesto" 61o lugar. "Essa é uma saída que vem ganhando adeptos porque possibilita o crescimento sem diluir o capital da empresa-mãe", diz Wagner Salaverry, sócio-diretor da corretora Geração Futuro. No caso da TAM, a proposta de fatiar unidades de negócio começou a nascer em novembro de 2007, durante apresentações a investidores americanos. O interesse à época foi além do transporte de passageiros. "Muitos queriam saber sobre outros negócios", afirma Barroso, que conduziu algumas apresentações ainda como diretor financeiro. Ao perceber o interesse, a TAM contratou a consultoria Bain&Company para desenhar a expansão. Uma das medidas mais simbólicas foi a contratação do banqueiro André Esteves, dono do BTG Pactual, para ocupar uma vaga no conselho de administração da TAM, em agosto de 2009. "Com sua experiência financeira, Esteves ajudaria a companhia a formatar os melhores negócios", diz um executivo próximo à companhia aérea. Neste ano, o BTG Pactual foi um dos coordenadores da oferta da Multiplus.
Iniciar o movimento pela unidade de milhagens foi uma escolha óbvia - esse era um dos negócios paralelos da companhia que se encontravam em estágio mais avançado. Em 1994, a TAM tornou-se a primeira a oferecer esse tipo de serviço no país. Em 2008, com 6 milhões de participantes, a área faturou 528 milhões de reais (os dados de 2009 ainda não foram divulgados). A lógica do negócio é razoavelmente simples. As empresas parceiras da TAM, no programa pagam uma espécie de taxa de administração à companhia aérea cada vez que um dos participantes compra um de seus produtos ou serviços. Em contrapartida, elas têm acesso ao valioso banco de dados construído pela TAM. nos últimos 15 anos. A convicção de que o spin off poderia dar certo veio do bemsucedido exemplo da Air Canada, que abriu o capital de sua unidade de milhagens, a Aeroplan, em 2005. Hoje, o valor de mercado da Aeroplan equivale a 4,5 vezes o da Air Canada.
Boa parte da estrutura necessária para a expansão de outras atividades da TAM já está montada, basta aproveitá-la de forma mais eficiente. A unidade de transporte de cargas, por exemplo, fatura mais de 1 bilhão de reais por ano aproveitando espaços vazios no porão dos aviões comerciais - recentemente a companhia começou a atender novas cidades na Europa e nos Estados Unidos. A operadora de turismo TAM Viagens, que tem 70 lojas credenciadas, vai iniciar no fim de março a abertura de suas primeiras franquias. Em dois anos, todas as lojas atuais serão convertidas, e outras 110, abertas em 50 cidades já mapeadas. "O modelo de franquias vai preparar a TAM Viagens para um passo mais ousado, como a abertura de capital", diz Paulo Castello Branco, vicepresidente comercial da companhia aérea. Um negócio considerado ainda mais promissor é o centro de manutenção. Com 947 funcionários, o centro passou a revisar aeronaves de outras companhias no ano passado. Hoje, 15% da receita vem de serviços a empresas como LAN Chile e OceanAir. A meta é dobrar o percentual nos próximos quatro anos. Nessa área, a inspiração vem da alemã Lufthansa, que separou seu centro de manutenção em 1995 e hoje fatura com ele 3,7 bilhões de euros por ano atendendo 670 clientes. Como em todo projeto pioneiro, existem vantagens - e também riscos. Um deles é o potencial conflito de interesses da TAM, ao mesmo tempo controladora do Multiplus e sua gestora. Toda vez que um cliente emite uma passagem aérea com seus pontos, a Multiplus paga um valor à TAM referente ao bilhete. "É preciso estabelecer regras claras no que se refere a esses valores, do contrário a TAM em tese poderia manobrá-los de acordo com os interesses do caixa da empresamãe", diz um consultor. Mesmo com esse telhado de vidro, até agora a TAM parece ter conquistado a confiança dos investidores - as ações da Multiplus valorizaram 15% em menos de um mês. Daqui para a frente, Líbano Barroso terá de lutar para mantê-la.