Marina Moterle, fundadora da Brasil Preserva: “No começo, tudo parece uma loucura solitária – um caminho incerto e cheio de dúvidas. Mas logo percebemos que o medo pode ser um combustível poderoso, pois nos impulsiona para o novo. E é nesse território desafiador que encontramos as maiores inovações”
Jornalista especializada em carreira, RH e negócios
Publicado em 14 de março de 2025 às 16h00.
A preocupação com o meio ambiente sempre fez parte da vida da caxiense Marina Moterle, fundadora da Brasil Preserva. A cleantech atua na economia circular e tem como missão desenvolver produtos biodegradáveis a partir de matérias-primas descartadas, como os resíduos de coco, criando alternativas sustentáveis ao plástico.
Aos nove anos, antes mesmo de saber qual seria sua carreira, desenhou um catador de materiais recicláveis empurrando um carrinho cheio de isopor, vidro e papelão pela cidade com a frase “Reciclagem em ação”.
Quase 20 anos depois, encontrou essa imagem na casa dos pais e percebeu onde começou sua jornada. “Desde pequena, ressignificava roupas que seriam descartadas ou doadas, transformando-as em algo novo”, conta. Seu primeiro emprego foi em uma loja de shopping, onde observou de perto como a indústria incentiva o consumo inconsciente. “Essa experiência fez com que eu resgatasse a essência da minha infância e começasse a criar edições itinerantes de um brechó.”
Formada em Administração, com especialização em Marketing ESG e Branding Ativista, Marina atuou em uma empresa de marketing e tecnologia com grandes marcas nacionais e internacionais, o que lhe permitiu trabalhar fora do Brasil.
“Viajei por diversos países e observei um denominador comum em todos: materiais recicláveis descartados incorretamente”, diz. O que chamamos de “lixo” estava presente até nos lugares mais remotos e, na maioria das vezes, era plástico – sempre carregando a identidade de alguma companhia.
Foi nesse momento que sua trajetória no empreendedorismo socioambiental ganhou força: unindo marketing, branding, ESG e inovação para implementar ações de impacto – do descarte ao consumo, dos produtores aos consumidores, do impacto à natureza.
A primeira solução da empresa, um polímero feito a partir de coco e plástico reciclado, está sendo desenvolvida em parceria com a Afinko, laboratório especializado em análises e ensaios laboratoriais. O próximo passo é a criação do primeiro polímero biodegradável feito a partir do descarte de fibras de coco, em parceria com a 4Feedstock, que atua com pesquisa e desenvolvimento na valorização de resíduos.
A ideia da startup surgiu quando Marina retornou ao Brasil e, durante uma viagem à Bahia, observou o acúmulo de cascas de coco descartadas inadequadamente.
Para se ter ideia do impacto desse setor, o Brasil ocupa a quinta posição entre os maiores produtores de coco do mundo, segundo o Banco do Nordeste. O mercado global do fruto foi avaliado em US$ 17,92 bilhões em 2024, com projeção de alcançar US$ 33,78 bilhões até 2033.
No país, segundo a Sociedade de Investigações Florestais (SIF), são produzidas 2,65 milhões de toneladas de coco verde por ano. Como a casca do coco pode levar até 10 anos para se decompor, o descarte inadequado agrava a poluição e contribui para o aquecimento global.
“Trata-se de um problema ambiental significativo, especialmente em áreas urbanas e litorâneas. O acúmulo em aterros sanitários sobrecarrega esses espaços e, com o tempo, pode atingir os lençóis freáticos. Sua decomposição também libera metano, um dos gases responsáveis pelo aquecimento global”, explica Marina.
Segundo ela, reciclar 1 tonelada de plástico pode evitar entre 1,5 e 3 toneladas de CO₂ equivalente, dependendo do tipo de material e do processo utilizado. Já a reciclagem de 1 tonelada de casca de coco pode evitar entre 2,5 e 4 toneladas de CO₂ equivalente.
Para estruturar a startup, Marina enfrentou diversos desafios, sendo a resistência ao novo um dos principais. “Inovar significa romper barreiras, desafiar crenças preestabelecidas e criar algo que, muitas vezes, o mundo ainda não percebeu que tem um impacto sistêmico significativo e é necessário para a sobrevivência coletiva a longo prazo.”
Outro obstáculo foi a falta de investimento e a necessidade de testar e refinar materiais compatíveis. “A construção de um ecossistema de inovação depende de conexões sólidas, pesquisa aprofundada e infraestrutura industrial alinhada, fatores que impactam diretamente o tempo necessário para estruturar e expandir a empresa”, explica.
Mesmo diante dos inúmeros “nãos” recebidos, Marina continua determinada. “[Grifar] O objetivo é mostrar que é possível unir ciência, meio ambiente e desenvolvimento econômico[/grifar].”
Além disso, a startup busca fortalecer toda a cadeia produtiva, envolvendo catadores e produtores de coco para promover sustentabilidade e inclusão social.
Para as mulheres que querem empreender na área, Marina deixa um conselho: “No começo, tudo parece uma loucura solitária, um caminho incerto e cheio de dúvidas. Mas logo percebemos que o medo pode ser um combustível poderoso, pois nos impulsiona para o novo. E é nesse território desafiador que encontramos as maiores inovações.”