Um dos trunfos de Parente, segundo analistas, foi justamente a razão de sua queda (Aaron M. Sprecher/Bloomberg)
Karin Salomão
Publicado em 2 de junho de 2018 às 08h00.
Última atualização em 4 de junho de 2018 às 08h49.
São Paulo – Há apenas dois dias, Pedro Parente acalmou o mercado ao afirmar que a política de preços da Petrobras e sua permanência na direção da companhia estariam mantidas.
Depois que Michel Temer anunciou a redução do preço do diesel em 46 centavos por 60 dias, dentre outras concessões, para acabar com a greve dos caminhoneiros, instaurou-se o receio de que o governo voltaria a interferir nos preços praticados pela estatal.
Por isso, Parente usou uma teleconferência com investidores para assegurá-los que a Petrobras mantinha suas metas e métricas e que continuava tendo controle sobre sua política de preços.
No entanto, a situação tomou uma reviravolta na manhã de ontem, quando o executivo anunciou sua renúncia do comando da Petrobras. De acordo com analistas ouvidos pelo site EXAME, sua saída levantou dúvidas sobre a continuidade das políticas que ele havia implantado na Petrobras, o risco da companhia e até o governo Temer.
“A notícia da saída do Parente pegou o mercado de surpresa, pois a sua gestão estava indo bem. Ele melhorou os índices de governança e os resultados operacionais e financeiros”, afirmou Vinicius Freitas, economista da Ativa Investimentos.
Pouco depois das 17h de sexta-feira, 1o de junho, a companhia definiu que o ex-diretor financeiro, Ivan Monteiro, será o novo presidente interino da estatal. Monteiro era braço direito de Parente e, segundo o jornal O Globo, só aceitou assumir o posto quando o presidente Michel Temer lhe garantiu que não haverá interferência política.
Ele terá grandes desafios pela frente, como manter as melhorias operacionais implementadas nos últimos dois anos.
Um dos trunfos de Parente, segundo analistas, foi justamente a razão de sua queda. Para preservar a companhia de interferências do governo, ele instalou uma política que ajustava os preços dos combustíveis segundo o câmbio e o preço internacional do petróleo, com variações quase diariamente.
No entanto, após a greve, o governo afirmou que iria subsidiar uma redução de 46 centavos no preço do diesel por 60 dias e compensar a petroleira pelas suas perdas. Há dúvidas se o governo irá de fato pagar pelos prejuízos da companhia por vender abaixo do valor de mercado.
“Interpretamos a saída de Parente como um sinal claro de que ele sentiu que o governo não seria capaz de entregar isso em uma base sustentável, considerando a pressão política para mais descontos no preço do diesel", disse em nota.
Por isso, um dos receios do mercado é que a companhia volte a práticas anteriores à gestão de Parente. Ao congelar os preços por pressões políticas, a companhia acumulou perdas de quase 40 bilhões de reais em quatro anos. Para a consultora de risco Eurasia, a renúncia de Parente "deixa a companhia ainda mais exposta a pressões crescentes por preços menores dos combustíveis".
Outra dúvida é se a companhia manterá sua dívida sob controle. Quando Pedro Parente assumiu o comando da Petrobras, a companhia tinha a maior dívida corporativa no setor de petróleo: ela devia nada menos que 450 bilhões de reais.
Nos últimos dois anos, a companhia reduziu custos e renegociou com seus credores para aumentar o tempo de pagamento.
A Petrobras reduziu sua alavancagem, medida entre a dívida líquida e o ebitda, de 5,1 para 3,16, entre 2015 e setembro de 2016. Já o endividamento líquido caiu de US$ 100,3 bilhões no 3º trimestre de 2016 para US$ 88,1 bilhões no 3º trimestre de 2017, e deverá chegar a US$ 77 bilhões ao fim de 2018.
A estatal alongou o perfil da dívida, que saiu de um prazo médio de 7,61 anos no 1º trimestre de 2017 para 8,36 anos no 3º trimestre do ano passado e reduziu seu custo médio de 6,2% para 5,9% no mesmo período.
No entanto, com a saída do principal executivo da empresa, a política de redução de dívidas pode estar comprometida. Segundo a agência de classificação de risco Moody’s, “o pedido de demissão de Pedro Parente da presidência da Petrobras é negativo para o perfil de crédito da companhia".
"A saída de Parente pode indicar que a tendência de melhoras nas políticas financeiras da Petrobras está comprometida", afirmou Nymia Almeida, vice-presidente sênior na Moody's.
Pelo fato de que uma das maiores empresas do Brasil é estatal, um terremoto em sua gestão também tem impacto no governo do país. A interpretação é que a renúncia do executivo enfraqueceu a gestão do presidente Michel Temer.
Para a consultora de risco Eurasia, a renúncia expõe o precário cenário social no período que antecede as eleições e pode até levar a novas greves de outros grupos sociais, ressalta a agência.
Esse fator levou a agência de risco a rebaixar a trajetória de curto prazo no Brasil, de neutro para negativo.
"A carta ressalta o quanto que o ambiente político deteriorou desde o início da greve nacional dos caminhoneiros, no dia 21 de maio, e como é improvável que a Petrobras seja totalmente pelo Tesouro pelos subsídios nos preços domésticos do combustível", afirma a consultora.
Há pouco mais de um mês, Parente incluiu um novo cargo ao seu currículo: o de presidente do conselho de administração da BRF, dona da Sadia e Perdigão. A companhia vivia uma briga interna por poder entre Abilio Diniz, então presidente do conselho, a Tarpon, gestora de investimento com 7% da empresa, e outros acionistas e conselheiros.
Atualmente, a BRF tem um presidente interino, Lorival Nogueira Luz Jr, que também é diretor financeiro da companhia.
Com a saída de Parente da Petrobras, o mercado especula que ele possa assumir a presidência da BRF. Por isso, as ações da BRF subiam no dia de hoje, enquanto as da Petrobras caíam.
No entanto, ainda é difícil saber se Parente irá assumir um cargo executivo na BRF e, caso positivo, quais serão suas principais políticas. "A movimentação das ações da BRF ainda é bem especulativa. Parente não deve pedir demissão hoje e assumir uma posição na BRF amanhã", afirmou Freitas, da Ativa.
Apesar de um cenário instável no curto e médio prazo, os analistas afirmam que a visão ainda é positiva para a Petrobras no longo prazo.
“A empresa acumula expertise inigualável no segmento de extração e produção de petróleo e apostamos não só na empresa como na melhora do clima econômico do Brasil para os próximos anos”, informou a Ativa.