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Pré-sal: com leilão esvaziado, governo perde e Petrobras ganha

Petrobras foi praticamente a única participante e licitação da cessão onerosa terminou com fuga de estrangeiras e arrecadação abaixo do esperado

Roberto Castello Branco, presidente da Petrobras que foi demitido por Jair Bolsonaro depois de dois anos no cargo nesta sexta (Agência Brasil/Agência Brasil)

Roberto Castello Branco, presidente da Petrobras que foi demitido por Jair Bolsonaro depois de dois anos no cargo nesta sexta (Agência Brasil/Agência Brasil)

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Da Redação

Publicado em 7 de novembro de 2019 às 07h21.

Última atualização em 7 de novembro de 2019 às 08h01.

São Paulo — A falta de concorrentes além da Petrobras e a arrecadação cerca de 30% menor do que a esperada foi um balde de água fria nas expectativas formadas em torno do maior e mais aguardado leilão do pré-sal, realizado nesta quarta-feira (6) pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

O leilão do excedente da cessão onerosa oferecia ao mercado a exploração de quatro áreas do pré-sal, na Bacia de Santos, e a expectativa do governo era levantar uma receita de 106 bilhões com os bônus de assinatura, o valor oferecido pelas empresas participantes para arrematarem as áreas leiloadas. A rodada acabou com só duas áreas arrematadas – ambas pela Petrobras -, as outras duas sem interessados e uma arrecadação total em bônus de 69,96 bilhões. No total, 14 petroleiras chegaram a manifestar interesse no megaleilão, entre elas algumas das principais do mundo, como Shell, BP, Equinor e Total, mas a sessão terminou sem a participação delas.

Segundo analistas consultados por EXAME, a falta de concorrência e a arrecadação abaixo do esperado frustra, principalmente, o governo federal e os estados e municípios, entre quem o grosso da verba deve ser dividido. A Petrobras, entretanto, pode sair bem mais vencedora do que a impressão inicial – o mercado recebeu a notícia com reticência, e as ações preferenciais da companhia fecharam o dia em alta de 0,2% (PETR4), enquanto as ordinárias (PETR3) caíram 0,43%.

“Do ponto de vista da Petrobras, ao contrário do que muita gente pensa, o leilão foi um sucesso”, disse Adriano Pires, presidente do Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie) e economista especializado no setor energético. “Ela já investiu muito dinheiro nessas áreas para buscar e achar petróleo e não podia entregar isso para outros. O campo de Búzios [a maior área do leilão arrematada pela Petrobras] é a sétima maior reserva de petróleo do mundo, já produz mais de 400 mil barris e, em quatro ou cinco anos, deve estar produzindo 2 milhões de barris. Aí o acionista da Petrobras vai gostar.”

Diferentemente dos leilões de petróleo tradicionais, em que a ANP licita áreas ainda inexplorados, a área que ficou conhecida como cessão onerosa está sendo trabalhada pela Petrobras desde 2010 e já produz os primeiros barris. A estatal recebeu do governo, naquele ano, o direito de produzir até 5 bilhões de barris nestes blocos. Estudos que vieram depois mostraram, entretanto, que a reserva total pode ser até três vezes maior do que o inicialmente projetado – e é o direito de explorar essa diferença o “excedente” que foi à leilão.

“A Petrobras já montou a estrutura para exploração nessas áreas, são plataformas, navios-sonda e uma série de coisas já instaladas”, disse Pires. “A Petrobras conhece essas áreas como ninguém e, agora, vai poder acelerar esses investimentos que já vinha fazendo.”

A estatal brasileira, em um consórcio com as chinesas CNODC e CNOOC, pagou 68,194 bilhões de reais em bônus pela área de Búzios – a Petrobras tem 90% da sociedade e as chinesas 5% cada. Foram as únicas estrangeiras a participar. A outra área, Itapu, foi arrematada pela Petrobras, sozinha, por um bônus de 1,766 bilhão de reais. A Petrobras já tinha exercido seu direito de preferência para estas duas áreas – o mecanismo garante à estatal uma participação mínima de 30% no bloco, independentemente da empresa que vença. Os outros dois blocos da cessão onerosa, Atapu e Sépia, não receberam propostas e devem ser relicitados.

Pouca concorrência é ruim para o governo

Quem mais perde com o esvaziamento do leilão é o governo. Os quase 70 bilhões de reais arrecadas não são um valor nada desprezível. De acordo com a ANP, equivale à soma de tudo o que o país já levantou em pagamento de bônus nas licitações de petróleo do gênero realizadas até aqui.

Também não é pouco do ponto de vista do caixa do governo – o secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, afirmou pouco depois do leilão que o dinheiro a entrar irá ajudar a reduzir o déficit do ano e a liberar novamente verbas do orçamento que haviam sido congeladas.

Mas os 36 bilhões de reais que vieram a menos do que o esperado também fazem diferença. “Não dá para dizer que o leilão foi ruim, mas as expectativas do Tesouro Nacional e dos estados e municípios foram frustradas; eles vão ganhar a metade do que esperavam”, disse Magda Chambriard, pesquisadora da FGV Energia e diretora da ANP de 2008 a 2016.

A conta fica piorada porque, de todo o dinheiro levantado, 34,6 bilhões devem ser pagos à própria Petrobras, em ressarcimento por conta de uma revisão no contrato da parte que já havia sido concedida a ela em 2010. Este valor é fixo e não muda. O destino do restante foi exaustaivamente discutido no Congresso Nacional e deve ser repartido entre União (67%), estados (15%) e municípios (15%), além de 3% para o Rio de Janeiro, estado produtor.

Com a projeção anterior de um leilão de 106 bilhões reais, a diferença a ser distribuída após o pagamento da Petrobras seria de 71,4 bilhões de reais. Com o valor arrecadado menor, a fatia destinada aos governos cai à metade, para 35,36 bilhões de reais.

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