Microsoft: entre as muitas mudanças que ocorreram em quase 40 anos, o fim da hegemonia do PC e a ascensão de um mundo digital balizado pelo móvel é capital (Getty Images)
Claudia Gasparini
Publicado em 6 de setembro de 2013 às 11h00.
São Paulo - A compra da Nokia pela Microsoft tem um um imenso valor simbólico para a indústria. Consumada em 7,2 bilhões de dólares, a negociação expõe o impacto arrebatador da invenção do mobile para a história da tecnologia.
Entre as muitas mudanças que ocorreram em quase 40 anos desde a fundação da Microsoft, uma é capital: o fim da hegemonia do PC e a ascensão de um mundo digital balizado pelo móvel, pelo local e pelo social.
É para responder a essas transformações e resgatar sua relevância que a empresa de Bill Gates tenta dar mais um passo no mercado de smartphones.
Criada nos anos 70 por Bill Gates e seu melhor amigo, Paul Allen, a Microsoft é um símbolo do desktop. Na época da “informática de escrivaninha”, com seus imensos monitores, CPUs e teclados, o hardware em si não tinha grande importância - bastava que rodasse o Windows. Nossa relação com o computador era imóvel, rígida: tudo acontecia dentro de uma tela intocável e fixa no seu local de instalação.
Com a revolução da internet móvel, nossa experiência com o digital foi se tornando cada vez mais física. Nossos dedos começaram a interagir com a tela. Nossos corpos começaram a se acostumar à companhia dos dispositivos eletrônicos no ônibus, na cama, à mesa. Começamos a passar horas com nossos celulares inteligentes a tiracolo, a carregá-los nos bolsos das calças, a levá-los para cima e para baixo.
A tendência a uma integração cada vez mais orgânica com o digital continua a avançar. Não é mais uma fantasia futurista a ideia de vestir computadores. Já temos óculos inteligentes como o Google Glass, smartwatches como o apresentado esta semana pela Samsung, e teremos inúmeros outros wearable gadgets que ainda serão imaginados.
Com a explosão desses novos dispositivos e a projeção de players como Apple e Google, o PC perdeu prestígio - e a veterana Microsoft percebeu o risco de ficar para trás.
A companhia norte-americana anunciou há pouco tempo a renúncia de seu CEO, Steve Ballmer, em meio a diversas pressões. Além da dificuldade em acompanhar o mercado de computação móvel, a empresa também tem lidado com um dramático declínio nas vendas de PCs.
Tentando cavar algum espaço no ambiente mobile, a Microsoft lançou o Windows Phone em 2010. Apesar de um início de crescimento rápido, o sistema operacional tem dificuldades em arrebanhar adeptos, correspondendo apenas a 3,3% do mercado de celulares em 2013.
Com a aquisição da Nokia, a empresa de Bill Gates pretende controlar tanto o hardware quanto o software dos seus aparelhos, num modelo de “integração vertical” parecido com o da Apple. O objetivo é aperfeiçoar o produto e triplicar o market share do Windows Phone até 2018.
Visto por alguns com ceticismo, o plano passará por muitos desafios para conseguir vingar, sobretudo em um mercado tão competitivo como o dos smartphones. Para começar, o sistema operacional da Microsoft não oferece a mesma quantidade de aplicativos presentes no iOS ou no Android. A chegada tardia ao páreo também representa uma desvantagem considerável.
Ainda assim, a IDC (International Data Corporation) lançou um relatório que prevê que o Windows Phone superará o iOs em 2016, principalmente graças à força da Nokia em mercados emergentes como África, Ásia e América Latina.
Destinada ou não ao sucesso, a estratégia demonstra um esforço de adaptação da Microsoft a um ambiente novo - que, aliás, vai além das iniciativas com o mobile. No terreno das mídias sociais, a empresa já tentou se projetar fazendo investimentos no Facebook em 2007 e comprando a rede social Yammer em 2012. Rumores recentes indicam que a Microsoft também pode ter a intenção de investir no Foursquare.
Relembrando sua trajetória, é impossível ignorar a participação decisiva da Microsoft na invenção do produto digital. O detalhe é que essa cultura de consumo evoluiu por conta própria e hoje desafia seus próprio criadores.
Nesse jogo, a empresa de Bill Gates não está sozinha. Afinal, a história recente da tecnologia mostra que, na hora de adivinhar o futuro das nossas necessidades e desejos, nenhum palpite é totalmente seguro.