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Da Redação
Publicado em 10 de outubro de 2010 às 03h40.
Última atualização em 12 de dezembro de 2018 às 11h33.
A recente onda de ataques piratas na região da costa da Somália e do golfo de Aden, uma das mais importantes rotas marítimas do mundo, já preocupa as empresas do setor marítimo, e pode gerar prejuízos. A economista Maria Helena Carbone, diretora da área marítima da consultoria de riscos norte-americana Aon, fala sobre o atual fenômeno.
- Quando mais ou menos a pirataria moderna começou?
No fundo, a pirataria nunca desapareceu. A considerada era de ouro ocorreu entre 1650 e 1720. Depois, com o final da Guerra Fria e a redução do patrulhamento de algumas áreas, a pirataria dos mares voltou a crescer de forma mais organizada. Os ataques dos bucaneiros tiveram outro ponto alto em 2000, quando a Somália ainda não representava uma área de risco tão acentuada. Desde 2004, os relatos de ataques de pirataria vinham declinando, mas com o aquecimento do comércio marítimo internacional, a escalada de ataques mais uma vez voltou a crescer, agora de forma impressionante, a despeito do maior desenvolvimento dos processos de combate e vigilância.
- Por que voltamos a lidar com um crime tão antigo?
O mundo viu recentemente uma movimentação econômica extraordinária, e parte expressiva dessa movimentação vem sendo feita pelos mares. Várias destas viagens ocorrem via canais ou outros tipos de passagens que propiciam os ataques por piratas.
- Que tipo de embarcações são mais atacadas?
A princípio, todas as embarcações são alvos potenciais para ataques de piratas. Os piratas organizados da atualidade não visam o roubo de carga, mas sim a detenção da embarcação com a obtenção de pagamento de resgate. É mais fácil e rápido lidar com dinheiro do que com algum tipo de carga ou navio que poderia ser rastreado com maior facilidade. O principal alvo é o resgate. É evidente que navios com menor velocidade, menor tripulação, ou até embarcações de lazer como iates poderão ser presas mais simples de atacar e obter êxito. Cada embarcação representa para os piratas um potencial de cerca de 1 milhão de dólares de resgate.
- Como os piratas, organizados em grupos pequenos em barcos simples, são capazes de dominar enormes navios cargueiros e iates?
As embarcações que realizam os ataques tentam ser confundidas com pequenos barcos de pesca. A diferença é que os pequenos grupos são treinados e armados, enquanto as tripulações, hoje bem reduzidas, estão desarmadas e algumas vezes com a atenção reduzida pelo cansaço de longas vigilâncias. E os piratas usam embarcações de porte maior como embarcações mãe, capazes de suprir e dar o apoio logístico às pequenas embarcações, que são as que realizam os ataques aos navios.
- Qual é o impacto econômico desses ataques?
Eles tem causado perdas expressivas, particularmente nas áreas entre o Mar Vermelho e o Oceano Índico, região da costa da Somália, Estreito de Malaca e Singapura, pelas quais transitam mais de 50,000 navios mercantes por ano. O crescimento das atividades de pirataria fez com que aumentasse o custo operacional para os armadores que transportam cargas pelas áreas de risco. Não só o preço da cobertura securitária aumentou significantemente, como surgiu também a necessidade da contratação de uma maior diversidade de coberturas. Além do já tradicional seguro de guerra e greves, hoje as empresas contratam muitas vezes um seguro que cubra Seqüestro e Resgate, além de uma cobertura eficiente que proteja a perda da receita ou ao menos do custo fixo diário das embarcações, uma vez que o período médio de detenção de um navio seqüestrado na região da Somália é de cerca de 60 dias.
- Uma alternativa que vem sendo discutidas pelas empresas marítimas é o desvio pelo Cabo da Boa Esperança, contornando todo o continente africano. Essa é uma boa opção?
Essa alternativa gera um acréscimo de custo para o transportador marítimo, muito superior ao custo do prêmio adicional que estaria desembolsando para manter a mesma rota, pelo Canal de Suez.
- Em sua opinião, como essa prática criminosa pode ser combatida?
O combate à pirataria passa necessariamente por uma ação em terra e por uma ação conjunta de diversos Governos. Os piratas não moram nem vivem no mar. Eles não empregam o dinheiro do resgate em conchas. Sem uma ação dedicada em terra, com o apoio das autoridades locais, o combate será ineficiente. Existem também barreiras legais com relação a como processar pessoas capturadas em águas internacionais, legislação aplicável, jurisdição correta. Por esta razão, piratas frequentemente são detidos, interrogados, desarmados e libertados. Já se examina a possibilidade da criação de um tribunal internacional para julgamento de atos de pirataria.
- O que a senhora pensa sobre a opção que vem sendo discutida atualmente de armar as tripulações?
Sempre considerei que armar pessoas que não são especificamente treinadas e preparadas para tal atividade representa mais risco do que benefício. Além disto, o emprego de armas de guerra pode representar uma exclusão em algumas coberturas de seguro.