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O tênis chegou aos escritórios – e mudou a indústria da moda

Novos hábitos no mercado de trabalho influenciam até os calçados dos novos e velhos funcionários

VOU DE TÊNIS: é cada dia mais comum ver calçados esportivos nos escritórios e em ambientes de trabalho / Divulgação/ Beira Rio

VOU DE TÊNIS: é cada dia mais comum ver calçados esportivos nos escritórios e em ambientes de trabalho / Divulgação/ Beira Rio

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Da Redação

Publicado em 13 de julho de 2018 às 10h00.

Última atualização em 13 de julho de 2018 às 14h42.

A chegada dos millennials aos escritórios fez o comportamento mudar da cabeça aos pés. Literalmente. É cada dia mais comum encontrar empresários ou funcionários de escritórios utilizando o calçado que antes era aceitável somente em momentos informais e mais descontraídos.

Um simbólico exemplo deste novo modo de vida pode ser encontrado nas fotos do dono da Amazon, maior varejista online do mundo, Jeff Bezos, calçando os descontraídos e confortáveis sneackers. O homem mais rico do mundo – ele mesmo um exemplo de como uma companhia pode quebrar paradigmas, funcionar além dos métodos tradicionais, e mesmo assim ser uma gigante mundial – mostrou que o que vestimos já não determina mais quem somos.

Os exemplos mais concretos destas mudanças são as companhias de tecnologia do Vale do Silício. Elas levam a sério a regra de não ter dress code, e permitir às pessoas sentir-se o mais à vontade possível em seu local de trabalho. Aquela ideia de que as companhias de tecnologia são mais despojadas porque são compostas por, majoritariamente, jovens intelectuais, porém, tomou proporções maiores, e se expandiu para outros setores executivos. Em maio deste ano, por exemplo, a multinacional de varejo Walmart enviou uma mensagem aos seus funcionários autorizando o uso de tênis no ambiente de trabalho.

Para Luiz Arruda, diretor da consultoria WGSN Mindset, a mudança foi alavancada pela tendência Athleisure, pioneira no uso de roupas esportivas fora das academias. “A moda esportiva começou a ganhar espaço em outros ambientes. Do ponto de vista do produto como algo mais híbrido, e não somente com a performance esportiva, o conforto foi ganhando espaço no nosso dia a dia, e, consequentemente, no trabalho”.

Com este novo hábito, há cada vez mais prateleiras reservadas para tênis, onde antes era possível encontrar sapatos ou saltos altos. Até mesmo nas lojas mais tradicionais de calçados, no mundo todo. A italiana Ermenegildo Zegna, conhecida por seus belos sapatos de couro, começou a decorar vitrines de suas lojas apenas com tênis. Além dela, a francesa Lanvin conquistou os funcionários do alto escalão do Vale do Silício, ao produzir tênis bonitos e confortáveis. O fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, se rendeu à marca, e foi visto em várias ocasiões com os tênis.

Nos Estados Unidos, uma novata, a AllBirds, também tem conquistado executivos com um slogan direto: “os sapatos mais confortáveis do mundo”. A marca também investe no marketing sustentável, com o uso de ingredientes naturais, para conquistar outros perfis de consumidores.

As marcas mais tradicionais de calçados, claro, enxergam na tendência uma oportunidade. Para as gigantes dos calçados esportivos, como Nike e Adidas, os tênis mais clássicos são uma oportunidade de fugir da ferrenha competição dos esportes de rendimento, que exigem constante investimento em pesquisa, um marketing agressivo, e ainda ganham novos competidores, como a Under Armour.

Para as empresas focadas em outros nichos de mercado, a oportunidade é boa demais para ser desperdiçada.

A fabricante brasileira de sapatos Arezzo lançou, em 2015, a Fiever, marca voltada somente para tênis. Como se autodefine, a marca urbana tem como público alvo as clientes que mais que buscam o conforto e atitude. Para a diretora executiva de marcas da Arezzo&Co, Silvia Machado, a marca acompanhou a mulher que mudou seu comportamento em relação ao que vestir e como se definir. “A nossa cliente entende que não precisa mais estar necessariamente usando um salto alto para se sentir bem, se sentir adequada dentro do ambiente de trabalho. O tênis passou a ser uma opção tanto quanto qualquer outro sapato”, explica.

Com 3 lojas físicas em São Paulo e prestes a inaugurar lojas no Rio de Janeiro, e lojas “pop-ups” na capital paulista, a Fiever tenta diversificar suas vendas, acompanhar a demanda. “Disponibilizamos nossos produtos em lojas multimarcas, no e-commerce e em lojas próprias, para garantir o crescimento da marca e o aumento das vendas”, conclui. Com os tênis, a companhia também chegou, timidamente, no público masculino, já que as fronteiras entre calçados para homens e para mulheres estão cada vez menores. Muitos dos modelos da Fiever podem ser unissex.

Outra fabricante brasileira de calçados, a Beira Rio, fez um caminho inverso. Dona das marcas populares Vizzano, Moleca, Beira Rio e Modare, a companhia passou a investir em linhas de tênis mais, digamos, versáteis, que possam ser usadas em casa ou no escritório.

Com isso, a marca Beira Rio registrou um crescimento de 35% no último ano, a Vizzano cresceu 25%, a Moleca, 35%, e a Modare, 20%. A diretora comercial e de marketing da Calçados Beira Rio, Maribel Silva, conta que foi necessário realizar uma adaptação da produção das fábricas de calçados, e que houve um forte investimento na produção, mas que já gerou frutos: a demanda por calçados esportivos da marca aumentou mais de 30%, nos últimos três anos. “Tivemos que adaptar nossa produção, porque as máquinas são diferentes. Mas o retorno em oferecer variedade para nossas clientes está se mostrando positivo”, afirma.

Segundo o relatório Setorial Indústria de Calçado, desenvolvido pela área de Inteligência de Mercado da Abicalçados, foram 909 milhões de pares de sapatos produzidos em 2017, sendo que o tênis representou 10% deste total. O modelo ganhou uma fatia de 0,6% do mercado total (respondia por 9,4%).

Segundo Wesley Barbosa, diretor executivo da Associação Brasileira de Lojistas de Artefatos e Calçados (ABLAC), a demanda pelo tênis que não é esportivo cresceu 14% em 2017, e 20% em 2016. Embora a demanda geral por sapatos tenha caído 8% em valor e 14% em volume, Wesley destaca que o tênis aumentou sua representatividade, “roubando” as fatias de vendas de outros modelos. “Hoje, o tênis representa 18,5% do mercado de calçados no Brasil. As mulheres trocaram os saltos e, principalmente, as sapatilhas, pelos tênis”.

Para quem quiser aderir à moda, convém prestar atenção em algumas regrinhas. Os tênis têm que combinar com as roupas, claro. Nem sempre a calça que você usa todo dia vai combinar com um par de calçados mais descontraídos. Convém maneirar nas cores. E é uma boa fazer uma rotação maior. Principalmente para os homens, sapatos de couro podem ser sem graça, mas são sóbrios e não chamam a atenção. Com eles, repetição não é um problema. Com os tênis, sim.

Roupas mais descontraídas certamente são mais confortáveis, e podem ser mais divertidas. Mas não são uma deixa para ir trabalhar de qualquer jeito.

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