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O sumiço do Naldecon – e a dor de cabeça da Bristol-Myers Squibb no Brasil

Laboratório toma chá de cadeira para obter licença de importação para medicamento, às vésperas do inverno

Naldecon: estoque do medicamento acabou em janeiro deste ano (Raphael Falavigna / Veja)

Naldecon: estoque do medicamento acabou em janeiro deste ano (Raphael Falavigna / Veja)

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Da Redação

Publicado em 10 de abril de 2012 às 15h22.

São Paulo - Em menos de uma década, o remédio Naldecon, da americana Bristol-Myers Squibb, perdeu a liderança no segmento de antigripais. No fim de 2010, o medicamento deixou de ser produzido no país. Nos últimos três meses, foi a vez de ele sumir silenciosamente das prateleiras e gôndolas.

Os acontecimentos parecem pintar um retrato sombrio para as operações da Bristol no Brasil. A proximidade do inverno aumenta a peregrinação por remédios que aliviam os sintomas de gripes e resfriados sem a necessidade de prescrição médica. Com baixo custo de produção e venda induzida por bônus aos balconistas, esses medicamentos rendem uma boa margem às empresas a despeito da competição acirrada entre os laboratórios.

O maior entrave seria logístico. Por essa frente, a Bristol guardaria uma vantagem: desde março do ano passado, a promoção dos seus produtos que dispensam receita, como o Naldecon e o antigases Luftal, fica por conta da suíça Novartis, responsável por comercializá-los em 12.000 pontos de venda no Brasil.

Mas com o Naldecon suspenso do portfólio, a Bristol vê minguar sua presença em um mercado que cresce a passos largos. Segundo dados da IMS Health, os antigripais movimentaram 748 milhões de reais nos últimos 12 meses, o dobro do faturamento apresentado há quatro anos.

Chá de cadeira

A Bristol atribui o desaparecimento das pílulas à demora da Agência Nacional de Vigilância Sanitária para liberar sua produção fora do país. Vendido exclusivamente no Brasil, o Naldecon deixou de ser fabricado em dezembro de 2010, quando a empresa anunciou o fechamento da planta brasileira como parte de uma reestruturação global.

Antevendo o provável esgotamento do produto, a Bristol protocolou o pedido de transferência da linha de produção seis meses antes de encerrar as atividades da fábrica. Mais de um ano e meio depois, o negócio ainda não ganhou aval do governo.

"Além de genéricos, há muitos similares no mercado, não havendo nenhum interesse do Estado nesse tipo de importação", afirma Lourival Stange, consultor da área de saúde. Segundo a Anvisa, a Bristol-Myers Squibb não encaminhou a documentação completa para o processo.


A Agência defende ainda que a análise dos casos obedece a uma ordem cronológica. Como a consulta à fila é pública, as empresas podem fazer uma previsão do tempo necessário para que seus pedidos sejam considerados, planejando assim uma manutenção adequada do estoque. A Bristol sustenta que o remédio voltará às farmácias em julho deste ano.

Publicidade para remédio sem produção

O reabastecimento incerto não impediu que o Naldecon aparecesse em anúncios de TV, nas páginas de revistas e em ações de marketing nas redes sociais. Criada pela Lew’Lara/TBWA, a campanha "Operação Naldecon: sabote os planos da Gripe S.A." foi veiculada de maio a setembro de 2011.

A Bristol defende que a investida só foi levada adiante durante o período em que havia remédios suficientes para atender a demanda - os estoques internos, afirma a companhia, só acabaram em janeiro deste ano.

De qualquer forma, a publicidade não foi suficiente para fazer o remédio crescer acima da concorrência. Em 2011, as vendas do Naldecon aumentaram 7,6%. Apesar de positivo, o resultado não estancou a queda de participação do medicamento, que desceu uma posição no ranking de antigripais, abocanhando o 5º lugar entre os concorrentes com uma fatia de 8,6% do mercado. Hoje, o remédio ocupa o 8º lugar da lista. Há oito anos, ele era líder absoluto, com participação superior a 18% nas vendas.

Outros horizontes

Ainda que a Bristol não revele a representatividade do Naldecon nos negócios, sabe-se que a empresa vem apostando fichas em medicamentos mais caros, voltados para doenças graves. É o caso do Orencia (artrite reumatoide), do Baraclude (hepatite B) e dos coquetéis anti-HIV. Até 2015, cinco novos produtos devem chegar por aqui, entre eles o Nulojix, que combate a rejeição a órgãos transplantados, e o Yervoy, para câncer de pele.

Segundo Stephen Merrick, presidente da Bristol no Brasil, a comercialização de alguns remédios antigos que contavam com alternativas da mesma classe já foi interrompida nos últimos anos (se deixar de ser vendido por aqui, o Naldecon se unirá ao grupo). "No momento, cerca de 40% da nossa linha de pesquisa é ligada a biológicos", afirma. Mais complexos que as drogas obtidas nos processos químicos convencionais, esses medicamentos são feitos a partir de células vivas para o tratamento de diversos tipos de câncer e doenças degenerativas clássicas do envelhecimento.

Para o consultor Lourival Stange, o direcionamento faz todo sentido. "Medicamentos de biotecnologia serão o grande mercado dos próximos quinze anos", diz. Na opinião do especialista, essas drogas oferecem diferenciais competitivos que as multinacionais precisam para crescer. Por outro lado, os tradicionais produtos de química fina, como os analgésicos e antigripais, exigem investimentos mais baixos. Assim, novas entrantes acabam fabricando remédios muito parecidos com relativa facilidade.

Não por acaso, a Roche comprou a Genentech, empresa de pesquisa em biotecnologia, em 2009. Recentemente, a Hypermarcas firmou parceria com os laboratórios Aché, EMS e União Química Farmacêutica, dando origem à joint-venture Bionovis, também voltada para as drogas biológicas. Na visão da Bristol, o Brasil é o sétimo mercado mundial para esse tipo de medicamento. Ao que parece, a empresa conta com ele para curar a dor de cabeça com seus últimos resultados. Em 2011, a receita líquida da companhia foi de 300,2 milhões de reais, 15% inferior à obtida no ano anterior. O prejuízo com as operações brasileiras, por sua vez, cresceu 38%, chegando a 11,9 milhões. 

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