Marcelo Cherto: apesar do avanço do e-commerce, as lojas físicas ainda têm um papel importante no varejo (Maskot/Getty Images)
Consultor de Franquias
Publicado em 20 de março de 2023 às 10h13.
Última atualização em 26 de junho de 2023 às 13h32.
Nas últimas décadas, graças a novas tecnologias como scanners cerebrais, aparelhos de eletroencefalografia e de ressonância magnética funcional e outras, temos sido capazes de compreender cada vez melhor como um consumidor toma suas decisões de compra, num processo bastante complexo, que envolve diferentes áreas do cérebro.
Estudos mostram que a principal região cerebral envolvida na tomada desse tipo de decisão é nosso sistema límbico, a parte do cérebro responsável pelos sentimentos, sensações, emoções e impulsos, e não o neocórtex, a área responsável pelo pensamento racional e lógico, pela linguagem e pela consciência.
Ou seja: quando chega a hora de decidir a respeito de algo, somos seres muito mais emocionais — e, portanto, menos racionais — do que gostamos de admitir. Por isso mesmo, quando colocados frente a frente com um serviço ou um produto e a possibilidade de adquiri-lo, nossa primeira reação é emocional, não racional.
Numa situação assim, nosso sistema límbico é ativado e libera neurotransmissores, como dopamina e serotonina, responsáveis por nossas sensações de prazer e bem-estar. Essas sensações acabam por criar uma conexão emocional entre nós e o produto ou serviço que está à nossa frente. E também com sua marca. E isso tende a influenciar diretamente nossa decisão de comprá-lo, ou não comprá-lo.
Ademais, é o mesmo sistema límbico o grande responsável pela formação de nossas memórias emocionais. Portanto, quando temos uma experiência emocionalmente positiva com um serviço ou produto, o que sentimos nesse momento tem grandes chances de permanecer armazenado em nossa memória de longo prazo, ajudando a criar uma associação positiva com a marca daquele bem. E isso tem alto potencial de influenciar nossas futuras decisões de compra.
Ora, é extremamente difícil — para não dizer quase impossível — gerar experiências emocionais positivas em sites de e-commerce e outros canais de venda remota. Nesse quesito, os pontos de venda físicos (desde que bem planejados e operados, é claro) são imbatíveis. Especialmente aqueles sobre os quais o “dono” da marca do produto ou serviço tem condições de exercer um grau elevado de controle com relação a todo o processo da jornada do consumidor.
Entende agora o que tem levado tantos fabricantes dos mais diversos ramos a implantar lojas e quiosques monomarca, quase sempre replicados e disseminados por meio da concessão de franquias? Você já deve ter visto, nos shoppings e nas ruas, pontos de venda exclusivos Samsung, Havaianas, Nike, Hope Underwear, Casa Bauducco, Lilica & Tigor e de tantas outras marcas, dos mais diversos segmentos. Agora você sabe o que levou à sua criação e expansão.
Mesmo com o crescimento das vendas online, os pontos de venda físicos continuam sendo muito relevantes. E isso não deverá mudar tão cedo, já que eles garantem uma experiência sensorial e imersiva que os sites de e-commerce e outras formas de venda à distância hoje simplesmente não conseguem reproduzir, por mais que façam uso de ferramentas cada vez mais sofisticadas.
A possibilidade de tocar e experimentar o produto antes de comprar, de ver e sentir sua qualidade, seu material e seu acabamento, de ter uma interação cara a cara com um vendedor, de sentir o cheiro da loja, perceber sua iluminação e sons, além da forma como cada item é exposto e uma série de outros fatores contribuem — se bem executados — para uma experiência de compra única e memorável.
Além disso, você certamente já se deu conta de que, nos últimos anos, mesmo desde antes da pandemia de covid-19, a loja física vem ampliando significativamente seu papel no relacionamento da marca com seus clientes. Se até pouco tempo atrás lojas eram meros pontos de venda, hoje são bem mais do que isso: são pontos de encontro e socialização, locais educação do consumidor, de esclarecimento de dúvidas e compartilhamento de experiências e muito mais.
Funcionam também como verdadeiros hubs de logística, sendo parte relevante na estratégia omnichannel de muitas empresas, na medida em que permitem que clientes que compram online possam retirar (ou devolver ou trocar) seus produtos na loja física de sua escolha. Também atuam como microcentros de distribuição descentralizados, o que viabiliza entregas mais rápidas, eficientes e baratas de produtos adquiridos online ou por telefone, por WhatsApp, venda direta ou outras formas.
Em resumo, as lojas físicas seguem desempenhando um papel importante no varejo de hoje e, a meu ver, devem continuar assim por um bom tempo. Pelo menos enquanto nós, consumidores, continuarmos seres mais analógicos do que digitais. Ou seja: enquanto continuarmos humanos na nossa essência, por mais que façamos uso da tecnologia como ferramenta.