Posto da ex-BR Distribuidora: saída de Wilson Ferreira deixou presidência vaga, mas mercado ficou aliviado pela eliminação do risco (foto/Divulgação)
Da Redação
Publicado em 16 de dezembro de 2016 às 14h38.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h49.
Ana Paula Ragazzi
No início de dezembro, os interessados em fazer uma proposta à Petrobras para comprar sua subsidiária BR Distribuidora receberam um endereço eletrônico e uma senha para acessar as informações financeiras da companhia. O que viram ali foi uma coleção de números grandiosos.
Maior rede de postos de combustíveis do país, a BR também é uma das maiores empresas brasileiras. Seu faturamento, de quase 100 bilhões de reais, só é menor do que o da própria Petrobras e o da gigante de alimentos JBS. A Petrobras tenta vender a BR de diferentes formas há mais de um ano: já cogitou abrir o capital da empresa, depois resolveu buscar sócios minoritários e agora quer se desfazer do controle. As mudanças foram feitas com o objetivo de atrair os compradores. E atraíram mesmo.
Talvez não tenha havido, desde as privatizações dos anos 90, um negócio que aguçasse a cobiça de tanta gente. EXAME apurou que 25 interessados acessaram as informações financeiras disponibilizadas pela Petrobras — entre eles os fundos de private equity Advent, Carlyle e GP, os varejistas Carrefour, Lojas Americanas e Pão de Açúcar e a Itaúsa, grupo que controla o banco Itaú.
Para os varejistas, a compra daria a chance de instalar lojas próprias nos quase 8.000 postos da BR e, com isso, aumentar a rentabilidade. Carrefour e Pão de Açúcar já têm postos de combustíveis, embora a rede seja pequena, inferior a 100 filiais — a compra da BR ajudaria a ganhar escala. Os grupos, no entanto, negam que tenham interesse na empresa. Para os fundos, é uma oportunidade de pagar barato por uma empresa que, bem gerida e longe da interferência estatal, pode se tornar ainda mais rentável. “Se a Petrobras não estivesse em crise, essa empresa jamais estaria à venda”, diz um dos interessados.
O diabo costuma estar nos detalhes — no caso da BR, porém, ainda falta muito para chegar aos detalhes e já sobram diabos. Segundo os investidores que analisaram os números da empresa, falta concordar no básico. A maior indefinição ainda é como será a governança da BR após a venda. A Petrobras pretende vender 51% das ações com direito a voto, só que ficará com os papéis preferenciais e, com isso, terá cerca de 60% do capital total da BR.
Em situações assim, em que têm participações relevantes numa mesma companhia, os sócios acabam decidindo por meio de um acordo de acionistas quais são os direitos de cada um: o que precisa ser aprovado por todos, o que pode ser vetado por um ou outro e como será a divisão de poderes no conselho de administração. A Petrobras vai querer ter alguma influência na escolha da diretoria? E em eventuais políticas de demissão? E no plano de abertura de postos? E na definição de campanhas de marketing? Ninguém sabe.
De acordo com quem acessou o data room da empresa — como é chamado o conjunto de informações financeiras à disposição dos interessados em fazer uma proposta —, não há uma linha sequer sobre isso ali. Como a governança pode fazer diferença nos resultados futuros da BR e, consequentemente, no valor da empresa hoje, os potenciais compradores decidiram esperar para fazer as propostas. Questionado pelos interessados, o banco Citi, que assessora a Petrobras na venda, avisou que o prazo para o envio de ofertas, marcado inicialmente para 19 de dezembro, foi adiado em um mês, pelo menos (até lá, espera-se que a governança já esteja definida). BR, Citi e Petrobras não deram entrevista.
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O vaivém nos últimos meses foi tamanho que o grau de confiança dos investidores beira o zero absoluto. Em agosto de 2015, o conselho de administração da Petrobras aprovou a abertura do capital da BR, mas a operação não foi adiante. Na época, o presidente da BR era José Lima de Andrade Neto, que havia sido citado por delatores da Operação Lava-Jato por suspeita de corrupção. Andrade Neto renunciou ao cargo em setembro e foi substituído, de forma interina, por um diretor da BR, Ivan de Sá — que acabou sendo efetivado no posto em janeiro de 2016, depois de a empresa não ter conseguido encontrar um substituto no mercado disposto a aceitar o “desafio”.
Em seguida, a Petrobras saiu em busca de sócios minoritários, mas ouviu dos investidores que só o controle interessaria. Por isso, em julho, a estatal decidiu vender 51% das ações com direito a voto. Lá se vão cinco meses. “Nesse ritmo, a coisa demora mais um ano”, diz o diretor de um fundo que está analisando os números da companhia.
A BR é o ativo mais valioso da Petrobras — na época da tentativa de abertura do capital, foi avaliada em cerca de 20 bilhões de reais, o que ajudaria a estatal a reduzir seu endividamento, em torno de 400 bilhões de reais. Mesmo com seu tamanho todo, a empresa perde dinheiro, e bastante. O prejuízo em 2015, último ano com resultados públicos, foi de 1,2 bilhão de reais, e as receitas diminuíram, enquanto as concorrentes Raízen e Ipiranga cresceram.
Outro problemão é a quantidade colossal de contingências fiscais e trabalhistas — que ninguém consegue estimar com grau mínimo de precisão —, e um total de 10 bilhões de reais a receber de empresas elétricas do grupo Eletrobras. A avaliação dos possíveis compradores é que, nas mãos certas, a companhia pode voltar a ser lucrativa. Mas, quanto mais tempo passa e quanto piores ficam os resultados, menos a BR vale.
Como costuma acontecer em vendas que envolvem estatais, os órgãos públicos estão dando sua dose de contribuição para enrolar ainda mais o processo. No dia 5 de dezembro, a Justiça de Sergipe expediu uma liminar para paralisar a venda da BR, alegando que ela deve ser feita por meio de uma licitação. No dia 8 de dezembro, o Tribunal de Contas da União determinou uma paralisação no processo de venda de ativos da Petrobras. O TCU reclamou de falta de transparência. Pode estar certo, pode estar errado. A única certeza é que o maior e mais enrolado negócio do Brasil vai atrasar um pouquinho mais.