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O futuro da televisão sem Game of Thrones

Série de sucesso da HBO inicia sua última temporada neste domingo e deixa os fãs e a companhia órfãos

HBO: Emissora registrou audiência média de 30 milhões de pessoas por episódio na última temporada da série (Caitlin Ochs/Reuters)

HBO: Emissora registrou audiência média de 30 milhões de pessoas por episódio na última temporada da série (Caitlin Ochs/Reuters)

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Da Redação

Publicado em 14 de abril de 2019 às 09h50.

Última atualização em 14 de abril de 2019 às 10h12.

O inverno chegou. Pelo menos para os fãs de “Game of Thrones”, o popular seriado televisivo produzido pela HBO. Neste domingo, 14, vai ao ar o primeiro episódio da oitava e última temporada do programa de TV, que estreou em maio de 2011, e conquistou um público devoto com sua trama que une política e fantasia em um universo medieval.

Talvez o principal diferencial de “Game of Thrones” tenha sido o seu valor de produção. A HBO já era habituada a fazer programas caros focando na criação de um produto de “maior qualidade”. A série ficcional de Jon Snow e Daenerys Targaryen custou 10 milhões por episódio na sétima temporada. Para os novos seis capítulos, os produtores utilizaram um orçamento de 90 milhões de dólares. Parece que o investimento deu certo. Na última temporada lançada, o seriado atingiu uma média de visualizações por episódio de 30 milhões de pessoas.

Parte do sucesso se deve ao modo com que a produção da série decidiu adaptar a narrativa dos livros de George R. R. Martin. Ariane Holzbach, professora de Estudos de Mídia da UFF, afirma que “Game of Thrones” teve “um diálogo maior com a maneira cinematográfica de fazer audiovisual”, mas que não foi “o único a fazer isso” e herdou aspectos de séries como “Lost” e “Sopranos”. Michael Inouye, analista de vídeo da consultoria ABI Research, afirma que o seriado “se destacou por uma nova abordagem para produtos e serviços, que está se tornando cada vez mais o status quo” da indústria de entretenimento.

O maior mérito do programa foi saber como administrar as expectativas do público e usar ferramentas “trans mídia” para expandir a narrativa para além dos dez episódios de cada temporada. “[Os produtores] conseguiram fazer isso de forma brutal”, afirma Luiz Peres-Neto, coordenador do ESPM Media Lab. “Antes da temporada você tem teasers, elementos de vídeos lançados fora da televisão que não são vistos nos capítulos em si”, exemplifica o pesquisador.

A briga pelo trono

Agora, com o final de “Game of Thrones”, a HBO se vê mais órfã que os próprios fãs e adota duas estratégias para permanecer relevante. A primeira é não se desvencilhar do universo do programa, por meio da construção de um parque temático na Irlanda do Norte e da criação de um novo seriado sobre uma história que antecede os fatos narrados na série. A outra estratégia é apostar na produção de novos conteúdos pensados para diretamente para a futura plataforma de streaming da Warner, da qual a HBO faz parte.

A compra da Warner Media Entertainment pela gigante de telecomunicações AT&T, autorizada em fevereiro, vai impactar diretamente o modo como a HBO opera, especialmente após a saída de Richard Plepler da presidência do canal. John Stankey, executivo responsável pela Warner agora, já declarou que irá destinar mais orçamento à HBO para que a produção de conteúdo premium aumente. “A AT&T quer criar uma estratégia mais coesa entre as suas diferentes unidades, o que não significa que a HBO não produzirá mais séries grandes como Game of Thrones, mas pode reduzir a escala das séries se os recursos forem espalhados para ampliar o fluxo de conteúdo”, afirma Inouye.

A grande meta da AT&T é lançar uma plataforma de streaming para competir diretamente com a Disney, que recentemente fechou um acordo de 71,3 bilhões de dólares para comprar a 21st Century Fox. No serviço da Warner, “Game of Thrones” estará ao lado de títulos de sucesso, como os filmes de “Harry Potter” e o seriado “Friends”. Na plataforma da Disney, as animações clássicas, como “Rei Leão” e “A Branca de Neve”, estarão lado a lado com sucessos de bilheteria, como “Vingadores”, e com seriados clássicos, como “Os Simpsons”.

Na disputa no entretenimento, também entra a gigante de tecnologia Apple. Ainda em 2019, a companhia planeja lançar seu serviço de vídeo sob demanda, com produções próprias. Um programa com as atrizes Reese Witherspoon e Jennifer Aniston recebeu orçamento de 240 milhões de dólares. A Amazon, que é dona do serviço Prime Video, entrou na briga e investiu pesado ao comprar os direitos televisivos de Senhor dos Anéis por quase 200 milhões de dólares. A Netflix, a maior produtora de programas neste modelo, não ficou para trás e anunciou que iria usar 10 bilhões de dólares para a produção de conteúdo próprio este ano.

Com tamanho investimento no setor de vídeo, a tendência é que o número de séries lançadas por ano continue a crescer. De 2011 a 2018, o número de programas deste tipo que foram ao ar nos Estados Unidos aumentou de 266 para 495. Para financiar esse modelo de crescimento, é inevitável, que as taxas das assinaturas aumentem progressivamente. “Eventualmente isso pode reduzir o fascínio desses serviços para alguns ex-assinantes de TV a cabo que olham para as assinaturas como uma curadoria de conteúdo a um custo menor”, pontua Michael Inouye.

Para ele, a chave do sucesso estará com a empresa que souber dosar a quantidade de programas ofertados ao espectador, o que “permite que um serviço diversifique seu risco”, e a produção de grandes séries, ao estilo de “Game of Thrones”, que convencem o consumidor a continuar pagando a assinatura. “Nesse sentido, AT&T está adotando uma estratégia mais adequada para abordar essas mudanças, embora às custas de parte da mágica HBO do passado”, afirma o analista da ABI Research.

Novo fenômeno?

Com tantas empresas disputando a atenção dos consumidores, será possível no futuro uma nova série atingir o patamar de sucesso de “Game of Thrones”? Não é está claro, mas há muitas apostas. Pode ser que a adaptação televisiva dos livros de George R. R. Martin seja a última grande série vista simultaneamente, visão com a qual concorda Luiz Peres-Neto, já que “passamos por uma mudança nesse segmento”. Para o pesquisador, no entanto, o mundo ainda se reunirá em tempo real para outros tipos de transmissões. “A televisão não vive apenas da indústria audiovisual cinematográfica, temos Olimpíadas, o Super Bowl, a Copa do Mundo. E esses eventos estão se adaptando ao fenômeno digital também”, afirma.

Já Ariane Holzbach discorda inclusive da tese de que Game of Thrones seja visto simultaneamente agora. Para ela, o alvoroço causado pelos fãs nas redes sociais é responsável por essa ideia de que todos estão falando e vendo o programa. “A série está disponível simultaneamente, mas isso não significa que ela esteja sendo consumida assim, é mais uma impressão”, defende a professora. A própria HBO tem um serviço de conteúdo sob demanda do canal desde 2010, o HBO Go. Nas temporadas passadas de “Game of Thrones”, o fã podia ver o episódio que havia sido transmitido na televisão uma hora depois pelo streaming.

Sendo ou não o último grande seriado da televisão tradicional, o fato é que há uma tendência de que novas séries atinjam fama global com as plataformas de streaming quebrando as barreiras que limitavam a TV tradicional.

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