Faculdades: para Rapha Avellar, a pandemia forçou mudanças no ensino superior que já eram necessárias (Michael Prince/Getty Images)
Felipe Giacomelli
Publicado em 10 de julho de 2020 às 06h00.
Quando inaugurou a primeira turma da Cria School, em dezembro de 2019, Rapha Avellar, empreendedor serial e dono da Avellar, ainda nem sabia que sua plataforma digital de educação ia ser o padrão em poucos meses. Com a chegada do coronavírus, de escolas infantis a cursos superiores, todos tiveram que transferir a sala de aula para a tela do computador ou do celular. A diferença é que Rapha pensou a Cria já dentro de um novo modelo, enquanto a maior parte dos cursos simplesmente transportou a sala de aula tradicional para o Zoom, Meets e outros aplicativos similares.
Nesta conversa, o empresário fala sobre a experiência da Cria School em seus primeiros seis meses de vida e reflete sobre a educação hoje.
Você é dono de uma empresa de publicidade. Por que decidiu criar uma escola de Marketing e Publicidade?
Foi pela dor. Cada vez que eu contratava um novo profissional, fosse um estagiário ou alguém em início de carreira, percebia que ele vinha completamente despreparado para o mercado. Pode ser o melhor aluno da melhor faculdade de publicidade e mesmo assim vinha cru. Criei um programa de treinamento de duas semanas para capacitá-los, foi pouco. Ampliei para um mês. Foi aí que caiu a ficha: eu não precisava consertar quem chegava até mim, eu precisa consertar antes dele chegar até mim. É preciso rever a forma como estamos preparando as pessoas para o mercado. Foi o que fizemos. O curso Formação em Estratégia Digital tem 96 horas aula e, por enquanto, é oferecido de forma completamente digital. A primeira turma começou em janeiro. De lá para cá, formamos quase 500 alunos.
O que muda na educação com todos estudando de casa durante a pandemia?
A pandemia da covid-19 só acelerou um processo que já vinha acontecendo. Preste atenção no modelo de educação e você vai notar que a necessidade de mudança já estava lá, mas faltava um fator propulsor para isso acontecer. Já havia uma insatisfação geral com cursos longos, caros e que não garantem empregabilidade. Por que, em um mundo onde as pessoas vivem hiperconectadas, a educação não se reformulou? O modelo de sala de aula é o mesmo desde o século 19!
O acesso ao Ensino Superior cresceu muito nos últimos vinte anos, e ter um diploma ainda é o desejo de muitos brasileiros. O que precisa mudar para que esse sonho seja de fato democratizado?
Bom, primeiro é preciso parar de olhar para a faculdade como sinônimo de diploma. Existe um discurso subjetivo na nossa sociedade que relaciona a graduação tradicional à prosperidade. E, sabemos, isso por si só não é verdade. O que a universidade deveria proporcionar é credibilidade, educação e experiência. O que ela entrega? Diploma e status quo pela formação superior. Isso já não basta e muita gente desiste da faculdade porque não pode pagar caro, menos ainda pelo pouco que ela entrega. O sonho do diploma vira um pesadelo financeiro, com gente pagando financiamento estudantil durante anos. Qual é o sentido de investir em uma formação que é deficitária e, além de tudo, cara demais para a realidade da maioria dos brasileiros? O ensino precisa ser mais acessível, sobretudo financeiramente.
É possível oferecer um bom conteúdo a preços mais acessíveis?
Uma faculdade de publicidade custa, em média, R$ 1 mil por mês durante no mínimo 4 anos. As mais conceituadas, até R$ 4 mil. O salário mínimo, hoje, está em R$ 1045. Quem pode ser dar ao luxo de pagar esse valor durante quatro anos? Aí, quando está todo mundo em casa por causa da pandemia, isso fica ainda mais evidente: a qualidade da educação é menor e o aluno não tem sequer a parte da experiência, da vivência universitária. Em áreas como Marketing e Publicidade, o modelo de aprendizado atual não é o ideal e as graduações, MBAs e pós da vida não têm se mostrado o melhor caminho. Na Cria nós provamos que é possível oferecer um conteúdo excelente em pouco tempo e com um valor que cabe no bolso.
Há muito tempo vem se falando em ensino a distância e e-learning. A pandemia vai obrigar esse modelo a se tornar, enfim, uma realidade para a maioria?
Os desafios do ensino à distância na pandemia estão deixando grandes instituições se perguntando como não se prepararam antes para uma revolução tão óbvia. A educação, seja na área que for, sempre será necessária. O aprendizado no ambiente digital já é uma das maiores demandas do mercado: o volume de buscas no Google Trends para o termo "faculdade online" aumentou vertiginosamente nos últimos meses. Eu nem gosto dos termos e-learning e ensino a distância porque acredito em modelos híbridos, com digital e presencial, que é o que deve acontecer no momento pós-pandemia.
*Rapha Avellar
Empreendedor em série, Rapha Avellar atualmente é CEO da Avellar, agência de publicidade e marketing focada em alavancar resultados de negócios através do que existe de mais moderno em estratégias digitais. Tinder, Hering, Domino's, BTG Pactual, Stone, Universal, MRV, Prudential, Stone, Brasil Brokers e Texaco são algumas das contas atuais da empresa.