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O caminho bem pensado de Rockefeller para a filantropia

Rockefeller, que doou até US$30 milhões anualmente nos últimos 10 anos de sua vida, encontrou outra maneira de usar a filantropia para fazer a diferença

Doações não são novidade para os Rockefellers

Doações não são novidade para os Rockefellers

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Da Redação

Publicado em 20 de novembro de 2017 às 07h53.

Última atualização em 20 de novembro de 2017 às 08h28.

Em algum lugar abaixo do Rockefeller Center, na cidade de Nova York, em uma sala com as luzes fluorescentes e as prateleiras altas de um grande armazém, os funcionários da casa de leilões separam uma sopeira de porcelana chinesa, chamarizes de pato, pinturas valiosas e centenas de outros itens.

Um estúdio de fotografia também foi construído para produzir os melhores close-ups para os catálogos que serão lançados antes que tudo seja vendido.

O que está acontecendo é exatamente o que David Rockefeller queria.

Os itens que estão sendo registrados pela Christie’s em Nova York pertenciam a Rockefeller, o banqueiro metódico da histórica família que morreu em março aos 101 anos.

O dinheiro das vendas irá financiar as promessas que ele fez há mais de uma década para uma dúzia de instituições, entre elas, duas universidades e o Museu de Arte Moderna, que receberão mais de US$100 milhões cada.

Vários outros grupos receberão quantidades menores, mas ainda imensas para os padrões da maioria das pessoas. E todos poderão ganhar mais, nas proporções por ele ele estabelecidas, caso haja disputas nos lances por sua porcelana ou seus Picassos e Cézannes, elevando os preços muito além das estimativas prévias.

Assim, as instituições se sairiam ainda melhor.

Rockefeller, que doou de US$20 milhões a US$30 milhões anualmente nos últimos 10 anos de sua longa vida, encontrou outra maneira de usar a filantropia para fazer a diferença – uma grande diferença, se as vendas da Christie’s angariarem os US$ 700 milhões que alguns especialistas em leilão estão prevendo. O recorde anterior foi estabelecido quando a coleção do estilista Yves Saint Laurent e seu sócio, Pierre Bergé, foi vendida por US$ 484 milhões em Paris em 2009.

Mas esse dinheiro não foi doado. Nem o dinheiro de outro leilão memorável, a venda dos pertences de Jacqueline Kennedy Onassis pela Sotheby’s em 1996, quando os lances frenéticos elevaram os preços muito além das estimativas anteriores. Seu BMW usado foi vendido por US$79.500, por exemplo – cerca de quatro vezes o que a Sotheby’s havia previsto. (Mas o dinheiro dessa coleção foi para a John F. Kennedy Library Foundation.)

Becky MacGuire, especialista em arte chinesa da Christie’s, disse que não consegue se lembrar de uma coleção vendida pela Christie’s que fosse tão grande ou variada. E tudo pode ser descrito como “usado com cuidado”.

“Ele realmente viveu com essas coisas. Elas não foram colecionadas para serem trancadas em uma caixa forte ou em um cofre ou em uma sala fria, organizadas em prateleiras. Eram coisas das quais gostava e com as quais vivia todos os dias. Ele foi muito explícito – era apenas um guardião dessas coisas, e sabia que tudo passaria para outras pessoas, que teriam o mesmo prazer que ele teve”, disse ela.

Rockefeller planejou tudo anos atrás, mesmo antes de assinar algo chamado Giving Pledge (Promessa de doação). A ideia de Bill e Melinda Gates e Warren E. Buffett, a Giving Pledge começou como forma de induzir pessoas ricas a se comprometerem a doar pelo menos metade de suas fortunas para a filantropia – se não em vida, depois que morressem.

A recepção inicial foi um pouco fria nos círculos filantrópicos e sem fins lucrativos. Alguns angariadores de fundos sustentaram que a promessa era pouco mais do que um estratagema de relações públicas. Mas mais de 170 pessoas ultrarricas assinaram.

No início, Buffett disse que acreditava que o valor real da garantia seria o exemplo que daria. E Rockefeller fez sua parte, mostrando que foi além de simplesmente afirmar publicamente o que havia decidido fazer. Ele ajudou a organizar um jantar na Universidade Rockefeller, que contou com a participação de Gates, Buffett e outros signatários iniciais da Giving Pledge. Sua legitimação acrescentou a credibilidade que só ele poderia conferir, e ficou satisfeito que as pessoas que fizeram fortunas estivessem planejando dedicá-las às questões globais.

Seu plano para distribuir seu dinheiro foi surpreendentemente contemporâneo. David Callahan, autor de “The Givers: Wealth, Power e Philanthropy in a New Gilded Age”, chamou Rockefeller de “um modelo de filantropia extremamente eficiente”.

O próprio Rockefeller disse que a filantropia envolvia mais do que dinheiro, embora dissesse que isso era essencial. Quando assinou o Giving Pledge em 2010, escreveu que a filantropia eficaz “exige paciência – paciência para lidar com obstáculos inesperados, paciência para aguardar pequenas mudanças e paciência para ouvir as ideias dos outros”.

Peter J. Johnson, historiador da família Rockefeller, contou que havia mais do que apenas paciência. Afirmou que, na época em que Rockefeller se comprometeu com a doação, acreditava que haveria uma recompensa para a organização – talvez não hoje, talvez não amanhã, mas algum dia.

Administradores de riquezas dizem que esta é uma lição para pessoas com menos zeros em suas contas bancárias. Outra passagem do livro didático de Rockefeller que os especialistas em filantropia apontam é: escolha instituições de caridade com cujo trabalho você se preocupa e, sempre que possível, conheça-as de antemão.

Em sua lista, havia instituições que ele conhecia: Universidade de Harvard, onde estudou (formou-se lá em 1936); o Museu de Arte Moderna (sua mãe Abby Greene Aldrich Rockefeller foi uma das fundadoras); o Conselho de Relações Exteriores (que liderou por 15 anos, até 1985); três grupos preocupados em preservar as áreas em volta de suas propriedades; e três fundos Rockefeller (ele atuou como secretário de um deles, o Rockefeller Brothers Fund, desde o dia em que foi criado em 1940).

“Ele analisou orçamentos e balanços financeiros de todas as organizações com as quais teve alguma conexão. Gostava de se aprofundar, conhecia os pontos fortes e fracos”, disse Johnson.

Stacy Singer, vice-presidente da Northern Trust Co., que não está envolvida com as próximas vendas, disse que esse tipo de engajamento poderia evitar dores de cabeça após a morte de um doador.

“Houve várias situações em que os indivíduos apresentaram ideias muito específicas para uma instituição, sem uma conversa, ou doaram uma série de peças de arte sem consultá-la e, depois que morrem, a instituição não consegue cumprir as instruções, ou não queria o que foi doado, o que acaba se tornando uma dor de cabeça. Ninguém se sente muito bem com essa situação”, disse ela.

As doações não são novidade para os Rockefellers. Marian Z. Stern, que dá cursos de filantropia, angariação de fundos e gestão sem fins lucrativos na Universidade de Nova York, rastreou as origens da filantropia até o avô de Rockefeller, John D. Rockefeller. Ela disse que ele “aderiu à filantropia” depois de ter acumulado sua fortuna e “elaborou o conceito de chegar às causas profundas dos problemas”.

Na Christie’s, ao catalogar os itens de quatro casas de Rockefeller, MacGuire disse que “o que ele amava sobre as artes decorativas era muito semelhante ao que o motivava na sua filantropia”, disse ela. Os Rockefeller “acreditavam no potencial humano”.

Eles também valorizavam a excelência, afirmou ela, e tinham pratos, copos e pires para oferecer um jantar digno de um Rockefeller – não para 10 ou 12 pessoas, mas 40. E Rockefeller já havia distribuído tantos que perdera a conta.

“Nos anos 90, ele foi jantar na embaixada americana em Pequim. O jantar foi servido nesta maravilhosa baixela chinesa”, disse ela.

Quando viu os pratos, achou que pareciam familiares e perguntou de onde vieram. “Eles responderam: ‘Bem, você nos emprestou’. E ele disse: ‘Eu deveria dar a vocês’; e foi o que fez, além de se encarregar de toda a burocracia.”

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