Fábrica de perfumes da Natura: nos últimos cinco anos, empresa perdeu participação no mercado e viu o lucro cair. (Divulgação/Natura)
Da Redação
Publicado em 25 de abril de 2016 às 08h29.
São Paulo - Um plano acalentado pela Natura há cerca de quatro anos vai se concretizar nesta semana. A primeira loja física da empresa - que sempre foi referência em vendas diretas - será inaugurada na quarta-feira, 28, no Shopping Morumbi, em São Paulo.
Trata-se do primeiro passo de um projeto que deverá ser replicado em centenas de lojas no futuro e que poderá incluir a venda de franquias.
Porém, diante da escalada da concorrência nos últimos cinco anos, analistas de mercado afirmam que o movimento pode ser tardio para devolver a empresa à posição de hegemonia que já ocupou no passado.
A Natura - que tinha mais que o dobro do mercado, na comparação com O Boticário, em 2010 -, hoje se vê em uma situação de empate com a concorrente.
Entre 2010 e 2015, a fatia de mercado da marca curitibana saltou de 6,9% para 10,9%, enquanto a da Natura caiu de 14,9% para 11,1%, aponta a consultoria Euromonitor.
Da mesma forma, os resultados da empresa caíram nos últimos anos. Entre o pico de lucratividade em 2012 e o resultado de 2015, os ganhos líquidos da Natura diminuíram mais de 40%. A queda também se refletiu nas ações da companhia, que vêm perdendo valor de mercado.
Para promover a retomada, em paralelo à ideia de se aventurar pelo varejo, a Natura também promoveu, em 2015, reestruturações internas - com ajuda das consultorias Boston Consulting Group (BCG) e Falconi - para agilizar as tomadas de decisão.
A ideia, segundo o presidente da companhia, Roberto Lima, era fazer as equipes se comunicarem melhor. "Por uma série de razões, a Natura perdeu um pouco de vigor, e você teve também os concorrentes fazendo um bom trabalho", diz o executivo.
"Todas as empresas bem-sucedidas passam por um ciclo de renovação. É esse ciclo que a Natura está empreendendo agora."
Desde que assumiu a Natura, em agosto de 2014, a ordem de Lima é pôr o pé no acelerador e fazer os projetos "acontecerem".
Apesar de, por enquanto, a companhia só ter mais quatro pontos comerciais para lojas físicas em vista, o executivo afirma que, por seu porte, a Natura não pode pensar pequeno - por isso, no médio prazo, a empresa trabalha com a meta de ter centenas de unidades, não só no Brasil, mas também na América Latina. O lema da empresa, diz Lima, é: "Pense grande, comece pequeno, escale rápido".
Para responder às cobranças do mercado, a direção vem tentando quebrar outros "tabus" do negócio. Um deles é a relação com as "lojinhas" informais montadas por consultoras de venda direta em todo o País.
Depois de ignorar por anos a existência desses empreendedores, a empresa decidiu, em 2015, ajudar a profissionalizá-los. Resultado: as vendas de produtos da Natura dentro desses estabelecimentos - que, geralmente, também comercializam outras marcas - aumentaram 8%.
Para o mercado, no entanto, essa tentativa de revigorar o negócio pode não ser suficiente para a empresa recuperar seu antigo patamar de liderança.
"O Roberto Lima vem fazendo mudanças e a chegada ao varejo é um exemplo disso. Mas a verdade é que a empresa está atrasada", diz Alberto Serrentino, analista de varejo e fundador da consultoria Varese.
Segundo o consultor, antes da entrada de Lima, a empresa ficou "ensaiando" o projeto por anos. "A loja é vital para atrair o consumidor jovem, que resiste à venda direta."
O histórico do projeto de varejo tradicional da Natura reflete a dificuldade da empresa em implantar seu projeto multicanal por receio de incomodar as consultoras do porta a porta - que até hoje respondem por quase 100% de suas receitas.
Em 2013, a empresa havia anunciado inicialmente uma proposta de criar entre 20 e 30 espaços conceito - a companhia, à época, insistia em evitar o termo "loja", apesar de a proposta envolver a venda de produtos.
O projeto de vendas pela internet também passou por uma longa fase de testes, que durou cerca de dois anos, antes de ser implementado em todo o País.
Para Serrentino e outros analistas de mercado, a empresa ficou paralisada diante de um movimento claro da concorrência. O Grupo Boticário abriu novas marcas - como Eudora e Quem Disse, Berenice? - e entrou com tudo, em 2012, no terreno da Natura ao abrir um sistema de venda porta a porta operado de suas quase 4 mil lojas no Brasil.
Hoje, fontes de mercado dizem que mais de 10% do faturamento do grupo no País vêm da venda direta. Ao mesmo tempo, a forte expansão do setor de farmácias no País beneficiou gigantes globais como a Unilever.
Apesar de reconhecer os passos adiante que a Natura deu em 2015, os analistas Guilherme Assis e Felipe Cassimiro, do Banco Brasil Plural, afirmam, em relatório, que os esforços da companhia para reorganizar sua estrutura estão demorando mais do que o esperado para dar resultados.
"A nova direção tem sido mais eficiente em manter os custos baixos do que em viabilizar um aumento na produtividade de suas consultoras", dizem.
Outro problema é que o "timing" da mudança não é dos melhores. Enquanto a concorrência surfou o "boom" econômico - em 2010, a economia cresceu 7,5% e as vendas de cosméticos saltaram bem acima de 10% -, a Natura enfrenta um cenário desfavorável.
A economia está no segundo ano seguido de recessão. E nem o quase infalível "efeito batom" (fenômeno que leva a população gastar com cuidados pessoais em períodos de contração econômica) conseguiu se salvar: segundo a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), as vendas do setor caíram 8% em 2015.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.