CEO da Luz Saúde SA não apenas mantinha algumas das contas de sua empresa no banco, como seus negócios faziam parte do grupo familiar controlava o BES (Bloomberg)
Da Redação
Publicado em 27 de maio de 2015 às 10h35.
Isabel Vaz estava de férias em Troia, uma orla de terra arenosa na foz do rio Sado, em Portugal, em agosto, quando ouviu falar do colapso do Banco Espírito Santo SA, antes o maior banco de capital aberto do país.
Vaz tinha mais que um simples interesse passageiro na notícia. A CEO da Luz Saúde SA não apenas mantinha algumas das contas de sua empresa de saúde no banco, como seus negócios faziam parte do grupo familiar que também controlava o Banco Espírito Santo.
Horas depois do anúncio de 3 de agosto, ela estava de volta a Lisboa para convocar uma reunião de crise em sua empresa.
“Aquele foi, possivelmente, o pior dia da minha vida profissional e pessoal”, disse Vaz, 49, em entrevista na sede da Luz Saúde, em Lisboa.
“A empresa podia realmente entrar em colapso porque nós não tínhamos acesso ao nosso dinheiro”. Ao amanhecer, seus gerentes procuravam onde estavam os depósitos da empresa e trabalhavam contra o relógio para desbloquear esses fundos.
Apenas alguns meses depois, Vaz, uma das únicas três mulheres a comandar uma empresa de capital aberto em Portugal, havia mostrado que era uma sobrevivente.
A Luz Saúde estava entre as poucas empresas do Grupo Espírito Santo a saírem incólumes. Em outubro, a Fosun International Ltd. comprou a Luz Saúde por 460 milhões de euros (US$ 515 milhões) depois que Vaz fez o grupo chinês elevar sua oferta e impôs um prêmio de 27 por cento ao preço da ação antes de as ofertas começarem a chegar.
“Ela foi uma capitã durante uma grande tempestade, com ventos de todos os lados”, disse José Roquette, diretor clínico do Hospital da Luz, que faz parte da empresa, e que trabalha com Vaz desde que ela fundou a Luz Saúde, em 2000. “Ela foi capaz de controlar o navio e levá-lo até um lugar seguro”.
‘Desafiada permanentemente’
Mãe de dois filhos, ela continua sendo CEO da empresa cujos 18 hospitais, clínicas e casas de repouso a transformam na maior provedora privada de serviços de saúde de Portugal, em um mercado avaliado em cerca de 5,5 bilhões de euros. A receita da Luz Saúde subiu mais de 60 por cento desde 2010. Seus donos chineses oferecem a ela novas oportunidades para expandir e desenvolver formas de reformular o setor de saúde, disse Vaz.
“Eu amo ser desafiada permanentemente”, disse ela. “Esta é uma organização que trabalha com muito pouca hierarquia”.
A longa jornada dela até esse momento começou quando Vaz, cujo pai é médico, entrou para a McKinsey em 1992 munida de uma formação em engenharia química e de um breve período como pesquisadora de um instituto de biotecnologia. Na firma de consultoria, ela trabalhou com o Grupo Espírito Santo para reestruturar a seguradora Tranquilidade, que havia sido devolvida à família após sua nacionalização, nos anos 1970.
Foi quando ela conheceu Ricardo Salgado, ex-CEO do Banco Espírito Santo e bisneto do fundador do banco. Salgado pediu que ela criasse uma empresa de saúde. A operadora de hospitais que Vaz fundou em 2000 se chamava anteriormente Espírito Santo Saúde SA.
IPO
Com a crise financeira da Europa atingindo o grupo, Vaz diz que sabia, no verão de 2013, que tinha que proteger a Luz Saúde. Ela decidiu vender ações por meio de uma oferta pública inicial, permitindo assim que o principal acionista da empresa levantasse dinheiro e, ao mesmo tempo, sujeitando a Luz Saúde ao rigor dos mercados financeiros.
“Nós tínhamos certeza de que se sujeitássemos a empresa aos mercados de capitais, com as auditorias legais e financeiras necessárias para montar um prospecto, isso nos protegeria de qualquer dano à reputação no futuro”, disse Vaz. O IPO esteve entre as últimas jogadas bem-sucedidas do grupo.
O IPO também ajudou quando, após o colapso do grupo, a operadora de saúde virou alvo de uma guerra de ofertas e recebeu quatro propostas concorrentes, incluindo uma de um competidor local que queria manter Vaz no comando.
“Quem quer que estivesse interessado na empresa tinha que valorizá-la, ela não foi vendida a preço de banana”, disse ela.
A CEO recusou uma oferta para se tornar ministra da Saúde quatro anos atrás e diz que não se arrepende.
“Este é o meu projeto de vida”, disse ela. “Nós sempre podemos fazer as coisas de forma diferente e melhor. Isso é uma coisa da qual eu não posso desistir”.