Mizoguchi, presidente da Honda Brasil: "Você abre o jornal e é inflação, queda do PIB, protestos. Isso gera medo no cliente" (Saulo Pereira Guimarães/EXAME.com)
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2013 às 12h48.
São Paulo - A Honda é hoje líder do mercado de motos do Brasil. De acordo a Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores), os cinco modelos mais comercializados do país em 2013 são fabricados pela companhia. Entretanto, a montadora japonesa apresentou lucro abaixo do esperado no último trimestre.
Em busca do lucro perdido, a empresa participa do Salão 2 Rodas, aberto hoje em São Paulo. O esforço visa recuperar uma parcela de mercado cada vez mais ameaçada por concorrentes chineses e indianos e fenômenos como a inflação.
Primeiro brasileiro a comandar a empresa no Brasil, Issao Mizoguchi tem uma missão difícil pela frente. Além de vencer os desafios citados acima, ele ainda tem metas como aumentar as exportações e driblar o custo Brasil. O executivo deu hoje uma entrevista à EXAME.com:
EXAME.com: Como os maus resultados afetaram a Honda?
Issao Mizoguchi: Como qualquer um, tivemos que apertar os cintos nos últimos tempos. Para reduzir as despesas, cancelamos horas extras e deixamos de repor os funcionários que sairam - mas não houve demissões. Atualmente, contamos com cerca de 9 mil trabalhadores e uma fábrica em Manaus.
EXAME.com: Quais são as principais despesas da companhia hoje?
Mizoguchi: Gastamos muito com com equipamentos, processos e novos produtos. Além disso, há o investimento em novas tecnologias - que tem, entre vários objetivos, a meta de tentar neutralizar a inflação. Não queremos repassar mais esse custo ao nosso cliente.
EXAME.com: Quais são as áreas do país onde a Honda mais cresce?
Mizoguchi: Norte e nordeste são regiões de destaque quando o assunto é crescimento. Lá, nossas vendas dependem menos de financiamento e se dão mais por meio de consórcios e mesmo à vista. Sem a restrição do crédito, é natural que os números sejam melhores. Hoje, metade das nossas vendas estão no sul e sudeste e a outra metade no norte, nordeste e centro-oeste. Daqui a 30 anos, creio que 70% dos nossos negócios serão no norte, nordeste e centro-oeste e só 30% no sul e sudeste.
EXAME.com: Por quê?
Mizoguchi: Os investimentos que o governo tem feito nessas áreas têm sido muito importantes para reduzir o desequilíbrio econômico no país. É bom não só para venda de motos, mas para todos os setores.
EXAME.com: Existe previsão de investimentos em exportações?
Mizoguchi: Atualmente, exportamos 90 mil motos por ano. Nossa meta é obter por meio de exportações o mesmo valor que gastamos com importações, pelo menos. Hoje, a gente gasta importando o dobro do que ganha exportando. No passado, já exportamos cerca de 10% da nossa produção para mercados como Reino Unido, Estados Unidos, Austrália e Nova Zelândia. Hoje, não dá mais. Estamos só na América do Sul e enfrentamos concorrência de chineses e indianos em países como Argentina, Peru e Colômbia.
EXAME.com: Por que é tão difícil exportar?
Mizoguchi: Por vários motivos. Por exemplo, um país como a Venezuela tem hoje 500 mil motos. Mas restrições políticas e o dólar controlado dificultam a nossa entrada. Tudo isso sem falar que, no Brasil, temos a luz mais cara do mundo, água mais cara que o Japão, mão de obra mais custosa que o sudeste asiático e uma operação logística absurdamente ineficiente. Para neutralizar o custo Brasil, estamos estudando formas de minimizar o impacto dos tributos em nossos produtos.
EXAME.com: Por que os impostos pesam tanto?
Mizoguchi: O problema do Brasil é que o imposto está em toda cadeia produtiva - não apenas no consumo. Se você parar um dia para fazer a conta do que gasta com isso, com certeza vai ficar com raiva. Estamos estudando alternativas para gastar menos - como o transporte de insumos por navegação de cabotagem. Mas há problemas: a mercadoria fica parada nos portos por dias e você não consegue programar a produção.
EXAME.com: Qual é a fatia de mercado da Honda hoje?
Mizoguchi: Nossa participação de mercado hoje é de cerca de 80%. Mas market share não é nosso objetivo, mas consequência do nosso trabalho. Dentro de 2 ou 3 anos, queremos ter 50% do mercado de alta cilindradas no país - sem descuidar do segmento de até 150 cilindradas.
EXAME.com: Qual é hoje o futuro para o mercado de motos no Brasil?
Mizoguchi: Se estivéssemos antes de 1993, eu lhe diria que tudo pode acontecer. Em 1992, nossa produção caiu de 300 mil unidades para 50 mil de uma hora para outra. Mas, depois do plano Real, o Brasil é outro. Acredito em alterações dentro do limite do razoável. Eleições e Copa do Mundo são eventos que costumam estimular as vendas. O que acontece hoje é que o Brasil está muito pessimista. Você abre o jornal e é inflação, queda do PIB, protestos. Isso gera medo no cliente. Ele pensa "não vou fazer mais uma dívida, não sei se vou ter emprego ano que vem".
EXAME.com: Por que a Honda demorou tanto tempo para ter um presidente brasileiro?
Mizoguchi: Não acho que tenha demorado, mas que aconteceu no tempo certo. A Honda está no Brasil desde 1976. Numa empresa, primeiro você nacionaliza as peças. Depois, a gestão. Sou funcionário de carreira: fui engenheiro, supervisor, gerente geral. Acho que esse foi o tempo necessário para a empresa se nacionalizar e escolher alguém nascido aqui para o comando.
O Salão 2 Rodas acontece de 8 a 10 de outubro no Anhembi, em São Paulo.