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Do zero ao bilhão: como esta empresa de SC virou gigante dos eventos

O Grupo 4Zero4, que começou na cozinha de uma república estudantil, é um "criador de experiências" que promove desde eventos culturais em São Paulo até festas em Fernando de Noronha

Francis Ziembowicz, Fernando Ligório e Rodolfo Maggioni (esquerda para direita): grupo de SC hoje tem escritórios em cinco cidades

Francis Ziembowicz, Fernando Ligório e Rodolfo Maggioni (esquerda para direita): grupo de SC hoje tem escritórios em cinco cidades

Laura Pancini
Laura Pancini

Repórter

Publicado em 4 de fevereiro de 2025 às 08h07.

Última atualização em 4 de fevereiro de 2025 às 08h16.

O mercado de eventos e experiências presenciais nunca foi tão aquecido. Após anos de isolamento, o público voltou às ruas, e as empresas viram uma oportunidade de se conectar mais diretamente com os consumidores. Só em 2025, o setor de "live marketing" (marketing ao vivo, na tradução literal) deve ultrapassar R$ 100 bilhões em investimentos no Brasil.

Eventos e ativações de marca se tornaram estratégicos para grandes empresas, movimentando R$ 312,4 bilhões anuais e representando 4,5% do PIB do país. Em São Paulo, epicentro dessa indústria, foram R$ 9,3 bilhões gerados por cerca de 1.300 eventos em 2023.

No meio desse cenário competitivo, um grupo criado na cozinha de uma república universitária em Santa Catarina alcançou um feito raro: faturar R$ 250 milhões em 2024 e garantir mais de R$ 1 bilhão em contratos de longo prazo.

O Grupo 4ZERO4, fundado em 2010 por Fernando Ligório, começou com a organização de eventos universitários em Santa Catarina. Hoje, já tem cinco escritórios pelo Brasil e faz desde eventos culturais em São Paulo até festas em Fernando de Noronha. A ideia é criar experiências de marca, eventos e campanhas para conectar empresas, como Heineken, Bradesco e Coca-Cola, ao público.

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Festas universitárias

O executivo Fernando Ligório nasceu em Alegrete — sim, a mesma de Matteus do BBB 24—, cidade que fica quase "na ponta" da metade sul do Rio Grande do Sul. Desde cedo, o gaúcho disse que achava formas de empreender, mesmo sem ter referências próximas no mundo dos negócios. "Meu pai era agricultor, mas quebrou quando eu era adolescente. Vi nossa família se desfazer financeiramente e entendi que precisava garantir minha independência cedo", conta.

Aos 15 anos, ao se mudar para Florianópolis para morar com o pai, começou a organizar excursões para festas, cobrando transporte e garantindo sua entrada gratuita. Na época da faculdade, cursando Administração na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), se envolveu com a empresa júnior, onde adquiriu experiência com gestão de negócios. Foi ali que percebeu que seu caminho não seria o de um executivo em grandes empresas, mas o de um empreendedor.

"Eu via meus amigos buscando programas de trainee, e sabia que aquele caminho não era para mim. A pressão para seguir um emprego tradicional era enorme, mas decidi arriscar", diz. Com dinheiro curto e nenhuma rede de contatos no mercado, começou uma agência de festas universitárias.

O negócio foi crescendo e evoluindo para algo maior. Em 2010, na cozinha do apartamento 404 de sua república estudantil, decidiu formalizar a operação e fundar sua primeira empresa, a VOE, com dois amigos da faculdade. Um deles, Francis Ziembowicz, segue como sócio até hoje e atua como diretor de atendimento. O sócio e diretor financeiro Rodolfo Maggioni entrou para o time alguns anos depois.

Chegada ao R$ 1 bilhão

Nos primeiros anos, a VOE se concentrava em eventos universitários, operando com um modelo de risco baseado na venda de ingressos. Mas um contrato em 2013 com a cervejaria Brasil Kirin (dona da marca Devassa) mudou tudo.

Ligório percebeu que poderia deixar de depender apenas da bilheteria e vender patrocínios diretamente às marcas. "Um diretor da empresa perguntou como ele poderia construir um relacionamento de longo prazo com o público universitário, e não apenas uma ação pontual. Foi aí que entendi que o caminho era outro", diz.

O contrato com a Brasil Kirin levou a agência a conquistar outras marcas, até que, em 2017, a Heineken comprou a cervejaria e sugeriu ao grupo do sul a abertura de um escritório em São Paulo.

Na época, um executivo deu uma dica bastante direta para Ligório: "Se vocês quiserem crescer na companhia, têm que ir para São Paulo. Vocês mandam bem, só que hoje são vistos como uma empresa regional". Foi como um balde de água fria para o empreendedor sulista, mas necessário.

A mudança para a capital paulista em 2018 marcou o início da fase de expansão nacional. O grupo passou a disputar contas maiores e a entrar no mercado de licitações, garantindo contratos de longo prazo que, no final de 2024, somavam R$ 1,2 bilhão.

Por que transformar uma agência em um grupo?

Até a pandemia, o Grupo 4ZERO4 operava principalmente com a agência de live marketing VOE. Mas o modelo tradicional do setor, baseado em jobs pontuais, trazia desafios: crescimento instável, forte concorrência e pouca previsibilidade financeira.

A crise de 2020 forçou uma pausa, mas também abriu espaço para reflexão. Em vez de reduzir operações, o grupo decidiu diversificar suas fontes de receita e estruturar novas frentes de negócio, separando diferentes tipos de atuação em empresas independentes. O resultado foi a criação de três novas unidades:

  • Hit Makers – focada em eventos proprietários e experiências culturais. Em vez de apenas executar eventos para clientes, a empresa cria e gerencia os próprios produtos;
  • SEA – atua no ponto de venda para marcas que querem fortalecer sua presença física. O trabalho vai desde a organização de campanhas em supermercados até ações de degustação e ativação em lojas. A ideia era complementar os serviços da VOE, que trabalha a marca no evento, enquanto a SEA garante visibilidade e conversão nas prateleiras;
  • Imagineers – agência de live marketing voltada para o Sul do Brasil. Se a VOE tem abrangência nacional, a Imagineers garante uma operação mais próxima e adaptada às características do público e das marcas locais.

O futuro do grupo

Para 2025, a projeção de faturamento do grupo é de R$ 320 milhões. Mas os desafios são grandes. Para Ligório, o mercado de eventos, que viveu um boom no pós-pandemia, começa a mudar. "Antes, qualquer coisa vendia. Agora, o consumidor está mais seletivo. Quem não estiver bem estruturado vai sofrer", diz.

Outro ponto de atenção é a nova geração de consumidores. A Geração Z tem hábitos muito diferentes das anteriores. "Eles valorizam bem-estar, consomem menos álcool e têm um olhar mais crítico sobre marcas e eventos. Estamos estudando muito para entender como oferecer experiências relevantes para esse público", diz.

E há ainda a possibilidade de uma expansão internacional. O grupo já realizou eventos em Nova York, Lisboa e Santiago e avalia estruturar operações fora do Brasil. "É um caminho natural. Se nossos clientes estão lá fora, faz sentido a gente estar também", afirma Ligório.

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