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Grandes fundos aproveitam covid-19 para aumentar fatia nas empresas

Preço baixo com demanda ainda elevada deve levar à concentração do capital das companhias em meio à crise do coronavírus 

NATURA: gestora Dynamo agora tem mais de 5% da fabricante de cosméticos (Leandro Fonseca/Exame)

NATURA: gestora Dynamo agora tem mais de 5% da fabricante de cosméticos (Leandro Fonseca/Exame)

Felipe Giacomelli

Felipe Giacomelli

Publicado em 2 de abril de 2020 às 09h09.

A queda no preço das ações trouxe à base acionária das companhias novos investidores de peso. Ou seja, uma concentração de capital. O saldo dos registros levados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aponta que só em março 32 empresas passaram por aumento da participação de grandes fundos de investimento que já tinham posição ou a chegada de novos acionistas com fatias superiores a 5% da empresa.

Parece pouco, mas equivale a uma base de 10% de todo o mercado, já que a bolsa brasileira tem 330 companhias listadas – e só um terço delas com liquidez representativa.

A regulação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) determina que os investidores – fundos de investimentos, pessoas físicas, holdings e controladores – informem ao público quando alcançarem fatia de pelo menos 5% nas empresas – com atualização a cada 5% adicionais. Quando reduzem desse patamar, também devem comunicar.

Na autarquia, os registros mostram que somente 21 empresas tiveram desconcentração da base, ou seja, quando grandes investidores vendem seus papéis na bolsa. O saldo, portanto, é de concentração do capital das empresas.

Dentre as movimentações, a novidade do dia que chamou mais atenção foi a carioca Atmos ampliando sua posição na construtora MRV de 4,6% para nada menos que 10%.

 

No auge da crise, movimentos importantes também foram os da Dynamo, uma das mais tradicionais gestoras fundamentalistas do país, que atingiu participação de 5% ou pouco mais em Natura e Alpargatas. As escolhas, ambas no setor de consumo, denotam o entendimento de que, mesmo no segmento econômico aparentemente mais afetado pela crise da pandemia do novo coronavírus, pode haver oportunidades.

A queda nos preços em bolsa foi tamanha que despertou interesse também dos próprios controladores e não apenas de investidores financeiros. Marcos Molina ampliou a participação da Marfrig. O empresário, costumeiramente ativo no mercado, comprou quase 130 milhões de reais em ações da companhia no começo do mês, pouco antes das semanas de maior volatilidade.

A Bradseg, holding de seguros da Bradesco, ampliou a posição no laboratório Fleury de 16,2% para 20,2%, o que levou até mesmo a uma revisão do acordo de acionistas, do qual participa.

A Tarpon, que hoje é conduzida pela dupla José Carlos Reis de Magalhães e Pedro de Andrade Faria, elevou de 25,5% para 30,1% a fatia na Kepler Weber. A gestora iniciou timidamente com 5% no negócio em 2018 e mais recentemente acelerou as aquisições.

Todas essas casas têm potencial de ampliar o ativismo sobre as companhias. Especialmente no pós-crise da pandemia, a expectativa de especialistas é que as gestoras de recursos acompanharão muito de perto os investimentos, ampliando as cobranças e a atenção sobre as administrações das empresas.

Do lado das vendas, os movimentos mais marcantes foram da XP Asset que reduziu de 6,6% para 2,9% a participação na Via Varejo e de 7,22% (já chegou a ser 9%) para 4,7% a posição na Qualicorp. João Luiz Braga, sócio da XP responsável pela gestão das carteiras, falou nesta terça-feira em sua conta no Twitter que nesse momento não cabe mais concentração nas carteiras. Na opinião dele, com as quedas recentes no mercado, que aumentaram as ofertas de “ativos baratos” na bolsa, a hora é de diversificação. Ele contou que fez compras em ativos dolarizados como Vale e Suzano.

Mas também não passou despercebido pelo mercado que o badalada Alaska, tocado por uma das maiores celebridades do mercado no Twitter, o gestor Henrique Bredda, diminuiu de 5,15% para 3,96% a participações nas ações preferenciais da Braskem, e que a Mondrian, com sede londrina, encolheu para 4,98% a posição nas ações da Embraer, quase à metade da última posição conhecida.

A dança das cadeiras das gestoras mostra que, quem pode, está indo às compras. Todos os sinais até agora mostraram que o investidor brasileiro tem feito o que pode para evitar o efeito manada e que, na verdade, muitos estão se segurando para não exagerar nas compras. As compras líquidas diretas de pessoas físicas na bolsa, como o EXAME In mostrou nesta quarta-feira, foram de 15 bilhões de reais de 2 a 26 de março – mais que o dobro da captação líquida dos fundos de ações nesse intervalo, que foi de 7 bilhões.

Aqui, vale explicar que a concentração na base acionária das companhias não significa, necessariamente, uma concentração das carteiras dos fundos de investimento. Tudo leva a crer que é exatamente o contrário. Como as empresas estão mais baratas, está mais fácil para quem tem dinheiro conseguir montar posições relevantes. Nas carteiras dos fundos, porém, essas grandes participações são valores menores sobre o total absoluto do dinheiro, ou seja, implicam em diversificação.

Depois de nove anos fechada, a Dynamo anunciou no fim da primeira quinzena de março a reabertura do Cougar, principal fundo da casa, para captação. Segundo a EXAME apurou, cética a respeito do que iria encontrar no mercado, a gestora levantou em menos de duas horas o 1 bilhão de reais que pretendia para três tranches até meados deste mês. Em quatro horas, a demanda chegou a 5 bilhões.

Não foi por acaso que a iniciativa foi seguida por outras casas renomadas – que estavam fechadas a mais ou menos tempo, mas se viram diante da oportunidade de atrair novos recursos – como Constellation, Velt, Atmos, Bogari, Sharp, Brasil Capital, entre outras. A última novidade foi da XP Asset, que anunciou nesta terça-feira a reabertura para as carteiras de longo prazo, conforme anunciou Braga em suas redes sociais.

O sócio da XP Investimento responsável pela plataforma de fundos e produtos da casa, Gustavo Pires, contou à EXAME que nunca viu nada semelhante. Na opinião dele, o investidor tem procurado oportunidade em ações diante da ausência dos títulos públicos com taxas de dois dígitos. “Há sinais de maturidade, mas as alternativas também estão diferentes de outros momentos da história do país. É a primeira crise com juro baixo”, comentou ele, referindo-se justamente aos títulos do governo e de instituições financeiras. Na avaliação de Pires, o comportamento do investidor desperta atenção, especialmente, depois do recorde de captação dos fundos de ações em 2019.

A dança das cadeiras -- assim como a pandemia -- não tem data para terminar.

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