Vendas online: com faturamento esperado de 3 bilhões de euros em 2016, o grupo Vente-Privée tem 50 milhões de membros e 4,5 milhões de visitas todos os dias
Karin Salomão
Publicado em 24 de outubro de 2016 às 12h13.
Última atualização em 25 de outubro de 2016 às 14h34.
São Paulo – A empresa francesa Vente-Privée resolveu nadar contra a correnteza. O site de comercio eletrônico vende apenas produtos em promoções relâmpago, só clientes cadastrados podem ver o catálogo de peças, ela não faz anúncios no Google ou Facebook e sequer considera abrir um marketplace, plataforma onde outras empresas colocam os produtos à venda, como fazem concorrentes do setor.
Para Ilan Benhaim, cofundador e sócio executivo do grupo, conseguir segurar o consumidor é o diferencial da companhia. Por isso, investe na qualidade do produto e gerencia toda a operação de venda, entrega e atendimento ao consumidor.
Por preferir se manter no controle, o grupo impede até que o Google indexe as páginas e os produtos à venda. De acordo com Benhaim, a empresa quer que o consumidor entre na plataforma para fazer as compras ao invés de pesquisar no buscador, para manter as promoções exclusivas no site e coletar dados sobre o comportamento de seus clientes.
Investir em anúncios online, portanto, é “jogar dinheiro fora”. “Você consegue comprar um consumidor. Mas ele estará satisfeito? Comprará novamente?”, questionou Benhaim, em entrevista a Exame.com. Por isso, com 50 milhões de membros em todo o mundo, o site recebe 4,5 milhões de visitas todos os dias.
“Vender online é a coisa mais fácil do mundo”, afirmou Benhaim, durante o evento e-Fashion Day. “O difícil é vender de novo para o mesmo consumidor”. Em 2015, o grupo vendeu 117 milhões de produtos.
Nos últimos anos, o grupo cresceu por meio de aquisições de concorrentes em outros países da Europa e se tornou um dos maiores grupos de comércio eletrônico de moda do continente.
A mais recente foi a compra da Privalia, outlet online espanhol. O Brasil é o líder em número de compras feitas no site. Em receitas, está atrás da Espanha e Itália, por conta do câmbio.
Em 2015, o Vente-Privée faturou em torno de 2 bilhões de euros. No mesmo ano, as receitas da Privalia foram de cerca de 450 milhões de euros. Criado em 2001 e com operações em oito países da Europa, espera faturar 3 bilhões de euros em 2016.
Confira abaixo a entrevista de Ilan Benhaim e Fábio Bonfá, presidente da Privalia no Brasil a Exame.com.
Exame.com - Quais foram os principais motores de crescimento para a empresa nos últimos anos?
Ilan Benhaim - A nossa estratégia sempre foi crescer de forma orgânica. Nós acreditamos que tínhamos criado um ótimo modelo de negócios. Mas mudamos a abordagem no ano passado, ao entrar em novos países. Ao invés de começar do zero, buscamos parcerias.
No entanto, cada país é diferente. Um sapato que está na moda na França não necessariamente estará na Inglaterra. Por isso, precisamos também ser locais, trabalhar com as melhores marcas de cada país.
Recentemente, adquirimos a Privalia. O Brasil é o país com o maior número de pedidos e o terceiro em faturamento, atrás da Itália e Espanha, por causa do câmbio. E o Brasil está bem localizado na América Latina, é o melhor país que poderíamos escolher.
Exame.com - Quais são os planos para o futuro da empresa no Brasil e na América Latina?
Fábio Bonfá – No Brasil, a nossa operação cresceu 20% por ano nos últimos três anos. Também somos lucrativos há três anos, um marco difícil de alcançar entre empresas de tecnologia.
Por enquanto, a nossa estratégia é continuar desenvolvendo a empresa no México e no Brasil. Não temos planos, a curto prazo, de expandir na América Latina. Também precisamos nos integrar com a operação europeia.
Exame.com - Conseguiram crescer mesmo na crise da economia brasileira, que prejudicou o desempenho do varejo?
Fábio Bonfá - Sim e mais do que isso. A Privalia conseguiu inclusive ajudar os parceiros a superar a crise. Em 2015, ajudamos nossos parceiros a desovar os seus estoques, que estavam em níveis muito altos.
Agora, que os estoques já estão em níveis mais saudáveis e as empresas ajustaram a produção a níveis mais condizentes com o mercado atual. Então, criamos um novo modelo de negócios e as nossas empresas parceiras passaram a produzir especificamente para vender na Privalia. Assim, elas ganharam um novo canal de vendas.
Conseguimos vender a custos mais baixos porque essas peças nunca chegaram a serem expostas em nenhuma loja. Então não há custos da loja, só o valor da fabricação em si.
Exame.com - A Vente-Privée irá enviar produtos da Europa para o Brasil e vice-versa?
Ilan Benhaim - Na Europa não temos nenhum problema, já que a moeda é a mesma e não há fronteiras tarifárias. Tentamos fazer comércio entre países quando entramos nos Estados Unidos, mas não deu certo. Então por enquanto no Brasil venderemos apenas produtos de parceiros brasileiros.
Exame.com - Algumas das maiores empresas de comércio eletrônico no mundo, como Amazon e Alibaba, funcionam no modelo de marketplace – outras empresas colocam seus produtos à venda na plataforma. Mas vocês não optaram por isso, por quê?
Ilan Benhaim - Se fôssemos um marketplace, não estaríamos no controle da operação e da qualidade. E esses dois valores são muito importantes para nós, para que o cliente volte a comprar conosco.
Além disso, só a Amazon pode ser a Amazon, ninguém consegue copiar. Ela começou sendo uma empresa que vendia livros na internet e começou a vender livros digitais. Mas foi além e quis ser uma empresa que vende de tudo e abriu o marketplace. No entanto, é uma empresa única no mundo e é inútil tentar imitar.
Exame.com - O senhor afirmou, durante sua palestra do evento, que a Vente-Privée não paga ao Google ou Facebook para exibirem anúncios. Como crescer na internet sem as maiores empresas do mercado?
Ilan Benhaim - Com muito tempo. Nós somos uma empresa independente, sem investidores. Então temos tempo para ganhar mercado e chegar ao lucro. Empresas com investidores precisam entregar resultados logo e acabam pagando para exibirem anúncios.
Muitos investem fortunas em anúncios, mas a taxa de conversão em compra é de apenas 1%. No varejo tradicional, esse número é um absurdo. Nós recusamos essa taxa e hoje, a conversão no nosso site é de 8%.
Você consegue comprar um consumidor. Mas ele estará satisfeito? Comprará novamente? Nós preferimos investir para que as pessoas fiquem felizes. Por isso, prezamos pela qualidade dos produtos e dos parceiros.
Exame.com - O senhor também comentou que, para que o cliente voltar a comprar, o atendimento ao consumidor é essencial. Como essa área funciona dentro da Vente-Privée?
Ilan Benhaim - Muitos enxergam essa área como um centro de custos. Nós vemos o atendimento ao cliente como uma forma de lucrar.
É uma notícia muito boa quando o cliente nos liga para reclamar de alguma coisa, porque ele poderia não ligar e continuar insatisfeito. Temos que usar a oportunidade para transformar descontentamento em satisfação e precisamos ser muito rápidos, eficientes e generosos com o cliente.
O nosso serviço de atendimento tem duas fases. A primeira é feita por uma empresa terceirizada, por causa do volume. Mas precisa ser uma companhia do mesmo país do cliente, para ele ser atendido em sua língua, sem nenhum tipo de sotaque ou mal-entendido.
Esse primeiro nível responde as questões mais básicas. Quando não consegue resolver um problema específico, avisamos que iremos retornar a chamada. Aí entra o segundo nível, que é feito por pessoas da Vente-Privée. Essa equipe tem acesso a mais soluções e pode assinar o cheque, devolver o dinheiro ao cliente ou dar descontos.
Tratar bem o cliente e vender produtos de qualidade é o que faz ele voltar ao nosso site, para comprar de novo.