Macarrão da Kraft e ketchup da Heinz (Brendan McDermid/Reuters)
Da Redação
Publicado em 28 de março de 2015 às 00h02.
A demanda chinesa, um poder de compra nacional em alta e terras e mão de obra baratas permitiram a expansão das grandes companhias brasileiras de alimentação no âmbito internacional, ainda que haja dúvidas no horizonte.
O 3G Capital, fundo de investimentos do milionário brasileiro Jorge Paulo Lemann, acaba de participar na fusão entre os gigantes Heinz e Kraft Foods que se tornará a quinta empresa mundial do setor agroalimentar, especializada em condimentos, salsichas, queijos e cafés solúveis.
Junto com o seu sócio, o milionário americano Warren Buffett, o fundo tem 51% do novo grupo.
Em meados de março, foi o grupo brasileiro JBS, líder mundial do setor de carne, que se tornou a segunda maior empresa alimentar do mundo depois da Nestlé, graças a uma intensa estratégia de aquisições no plano internacional.
O mesmo destaque recebe a BRF, maior exportadora de frangos do mundo, que inaugurou em novembro uma fábrica de 141 milhões de dólares em Abu Dhabi.
Apesar dos diferentes perfis, esses grupos têm algo em comum: "na ausência de subsídios, essas empresas têm a obrigação de ser eficazes, sob pena de ficar fora do mercado", ressalta o jurista André Cutait de Arruda Sampaio.
"Os preços baixos da terra e da mão de obra constituem importantes vantagens comparativas para o setor agro-alimentar brasileiro", completa a economista Maria de Albuquerque David, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Jogo em dois tabuleiros
Jorge Paulo Lemann, o homem mais rico do Brasil, firmou as bases de seu império na indústria de bebidas: fruto de fusões sucessivas, a AB InBev (fusão da empresa Ambev com a belga Interbrew) tem hoje cerca 20% da cerveja do planeta com marcas como Stella Artois, Corona e Budweiser. O fundo 3G Capital também comprou a rede de fast-food Burger King, o grupo Heinz e a rede de cafés canadense Tim Hortons.
As empresas controladas pelos três sócios do fundo valem no total 260 bilhões de dólares.
Estimulado pela demanda chinesa de carne e de soja, em que o Brasil é o segundo produtor mundial, e pelo maior poder de compra dos brasileiros, o setor agro-alimentar nacional alcançou excedentes significativos.
"O agronegócio é dinâmico porque joga em dois tabuleiros: no Brasil e no exterior, deixando de lado o menos atraente conforme o período", explica Maria de Albuquerque David.
A BRF exporta frango para 110 países e tem outras 10 instalações industriais na Argentina, na Holanda e no Reino Unido.
Nascido de um açougue na região central do país, o grupo JBS obtém hoje 80% de suas receitas no exterior, em países como Austrália e Estados Unidos. A companhia tem, ainda, 25% das ações do BNDES.
Momento crítico
O mercado questiona se essas empresas brasileiras correm o risco de ter o mesmo destino de Eike Batista.
"Não há nenhum risco. Batista era um vendedor de sonhos, com projetos imaturos. No setor agro-alimentar falamos de empresas estabelecidas há tempos, com experiência e um profundo conhecimento de seu mercado", diferencia o economista Gilberto Braga.
Mas há outras ameaças. Endividamento elevado, economia brasileira fraca, queda dos preços das matérias-primas, custo de transporte proibitivo e investimentos custosos por causa das altas taxas de juros são alguns dos elementos que podem prejudicar a produção.
"É um momento crítico, onde vamos ver se são realmente bons administradores", desafia Maria de Albuquerque David. "O 3G Capital fez cortes drásticos nos gastos e racionalizou a produção. Quem sabe os gigantes da carne farão a mesma coisa".
A JBS anunciou no início de março que não planeja novas aquisições em 2015.