Logo da varejista de alimentos francesa Carrefour, visto em supermercado, em São Paulo (Paulo Whitaker/Reuters/Reuters)
Karin Salomão
Publicado em 8 de dezembro de 2018 às 08h00.
Última atualização em 8 de dezembro de 2018 às 08h00.
São Paulo - O caso do cachorro morto em uma unidade do supermercado Carrefour gerou revolta e deixou marcas na imagem da empresa. Como se não bastasse, a reação da companhia ao episódio agravou ainda mais a crise e mostrou a falta de treinamento de sua equipe, segundo especialistas ouvidos por EXAME.
Um segurança terceirizado agrediu um cachorro na unidade paulista do Carrefour em Osasco, no dia 28 de novembro. O Centro de Zoonoses foi chamado e o animal desmaiou durante sua remoção. As agressões foram filmadas por testemunhas. No dia 5, o Ministério Público de São Paulo instaurou inquérito civil para apurar o caso de agressões e maus-tratos.
Desde o ocorrido, o Carrefour divulgou algumas notas com seu posicionamento. Em uma das primeiras, disse que "um funcionário de empresa terceirizada tentou afastá-lo da entrada da loja e imagens mostram que esta abordagem pode ter ocasionado um ferimento na pata do animal".
Afirma também que procurou o Centro de Zoonoses da cidade. “O Centro de Zoonoses de Osasco foi acionado por diversas vezes, mas não recolheu o animal”. Quando os funcionários do centro chegaram, a companhia disse que "o cachorro desfaleceu em razão do uso de um enforcador, tipo de equipamento de contenção".
"A primeira atitude do Carrefour foi a pior possível", afirma Fred Lúcio, antropólogo da ESPM. "Transferiram a responsabilidade para o funcionário terceirizado e para o centro de zoonoses", diz.
Além disso, a empresa demorou alguns dias para responder e seu primeiro posicionamento foi recheado de frases prontas, analisa Marcos Hiller, diretor da True Stories, consultoria de posicionamento de marcas. "A empresa pecou no tempo de resposta".
A companhia, mais tarde, soltou um novo posicionamento. “O Carrefour reconhece que um grave problema ocorreu em nossa loja de Osasco. A empresa não vai se eximir de sua responsabilidade. Estamos tristes com a morte desse animal. Somos os maiores interessados para que todos os fatos sejam esclarecidos. Por isso, aguardamos que as autoridades concluam rapidamente as investigações. Desde o início da apuração, o funcionário de empresa terceirizada foi afastado. Qualquer que seja a conclusão do inquérito, estamos inteiramente comprometidos em dar uma resposta a todos. Queremos informar também que estamos recebendo sugestões de várias entidades e ONGs ligadas à causa que vão nos auxiliar na construção de uma nova política para a proteção e defesa dos animais”.
Para Lúcio, essa última resposta é a mais correta e deveria ter sido a primeira reação. "A empresa precisa se responsabilizar e se desculpar de forma preventiva", diz. Mas, para ele, a empresa também deveria conduzir sua própria investigação interna e cumprir as medidas administrativas.
A companhia afirmou que o funcionário terceirizado foi afastado. Mesmo terceirizado, a empresa deve continuar comprometida, diz Monica Lobenschuss, especialista em marketing digital. "Se estava sob o teto do Carrefour, a atribuição também é deles", diz.
Em relação à imagem da empresa, a terceirização do funcionário não muda nada, diz Hiller. "Para o consumidor, o segurança, caixa ou qualquer funcionário é a própria empresa, mesmo que não trabalhe diretamente para ela. Aquele segurança, para as pessoas, representava o Carrefour", afirma.
O caso também mostrou um treinamento falho dos funcionários. Por se tratar de um supermercado de rua, o estabelecimento está sujeito à entrada de cachorros e animais de rua, diz Lobenschuss. "Sabemos que um supermercado tem regras muito claras de higiene e não pode permitir a entrada de animais. Mas, como a aproximação de animais de rua é uma situação normal, a empresa precisa ter procedimentos melhores para lidar com isso", afirma.
Com toda a comoção gerada pelo caso, especialistas afirmam que ainda é cedo para saber quais serão as consequências para o Carrefour. A imagem da varejista deve continuar manchada por um tempo, pois "a repercussão de uma atitude negativa é muito mais rápida e ampla que a de uma positiva", segundo Lúcio.
O especialista lembra do caso da fabricante de massas Barilla, cujo presidente fez uma declaração homofóbica em 2013. Logo em seguida, o executivo Guido Barilla se desculpou publicamente e a empresa passou a adotar políticas internas de apoio à comunidade LGBT. Foi eleita, já no ano seguinte, como uma empresa amiga desse público pela organização norte-americana Human Rights Campain (HRC), mas o caso negativo continua na memória das pessoas.
No entanto, há dúvidas sobre a consequência do fato para as vendas e os negócios do Carrefour. Para Lobenschuss, os consumidores mais fiéis da marca podem deixar de frequentar o supermercado por um tempo. O mesmo pode acontecer com as pessoas mais ligadas às causas sociais. Já para Hiller, a indignação não deve perdurar e as consequências reais são muito difíceis de mensurar.
Mesmo com todo treinamento e cultura organizacional alinhada, nenhuma empresa está livre de sofrer incidentes, de acordo com os especialistas. "Problemas, erros e acidentes acontecem com qualquer um. É como a empresa reage que faz a diferença", diz Lobenschuss.