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Eles criaram uma van elétrica no interior do RS. Hoje já fazem R$ 35 milhões pelas ruas do BR

Para o ano que vem, a linha deve praticamente dobrar de tamanho, chegando a 100 veículos produzidos em 12 meses

Jocelei Salvador, Marcelo Simon e Júlio Balbinot, da Arrow: "Nosso objetivo é reduzir o tempo de entrega das vans, o que é essencial em um mercado tão competitivo" (Arrow/Divulgação)

Jocelei Salvador, Marcelo Simon e Júlio Balbinot, da Arrow: "Nosso objetivo é reduzir o tempo de entrega das vans, o que é essencial em um mercado tão competitivo" (Arrow/Divulgação)

Daniel Giussani
Daniel Giussani

Repórter de Negócios

Publicado em 13 de novembro de 2024 às 11h28.

Última atualização em 13 de novembro de 2024 às 14h06.

CAXIAS DO SUL (RS)* — Quando a empresa gaúcha Arrow apresentou sua van elétrica numa feira de transportes em São Paulo há dois anos, a pergunta que mais ouvia era: de onde importava o produto. Os visitantes do estande queriam saber se a tecnologia e o design do veículo vinham da Ásia, da Europa ou da América do Norte.

“Nós importamos de Caxias do Sul”, respondiam os fundadores do negócio, em tom de brincadeira.

Isso porque o veículo da Arrow é totalmente brasileiro. Até o motor, importado, foi desenhado em parceria com os engenheiros da Arrow. Tirando esse item e a bateria, importada da China, praticamente tudo no veículo é brasileiro — e de Caxias do Sul. 

“No nosso veículo, com exceção das rodas e dos espelhos retrovisores, o resto todo é feito em Caxias do Sul”, diz Júlio Cesar Balbinot, um dos fundadores da Arrow. “Os vidros, os painéis laterais, as peças de acabamento, a iluminação, os logos. Tudo isso é de uma rede de fornecedores de Caxias do Sul”. 

A EXAME visitou a fábrica da empresa no início de novembro, na cidade serrana a cerca de 120 quilômetros da capital gaúcha, Porto Alegre. Por ali, os veículos são montados numa linha que mistura processos tecnológicos e automatizados com etapas manuais, num quê de artesanal. Cerca de 50 pessoas atuam diretamente na fabricação. 

Neste ano, a Arrow deve fabricar cerca de 50 vans elétricas, cada uma vendida por um preço na casa dos 750.000 reais. Todas elas estão vendidas. A maioria é para a varejista Mercado Livre, que comprou 50 veículos ainda no ano passado. Algumas vão também para a To Do Green, uma startup de entregas verdes cujo principal cliente é a Amazon. 

Para o ano que vem, a linha deve praticamente dobrar de tamanho, chegando a 100 veículos produzidos em 12 meses. Neste ano, a empresa faturou 35 milhões de reais. 

Como a Arrow nasceu

Como uma empresa do interior do Rio Grande do Sul vai sair de zero veículos produzidos em 2022 para 100 produzidos três anos depois? 

A resposta começa na origem e na carreira dos fundadores da Arrow. Júlio Balbinot, Jocelei André Salvador e Marcelo Simon, os três gaúchos por trás do projeto, vêm de uma trilha profissional parecida. Todos eles eram funcionários da Marcopolo, multinacional brasileira fabricante de carrocerias de ônibus.

Na pandemia, a montadora de ônibus precisou fazer demissões para reajustar os custos com a queda de demanda. Os três decidiram juntar parte desse time para oferecer serviços de engenharia para ônibus para empresas pelo mundo. 

“Atendemos empresas em Londres, no Egito, na Espanha, na Índia e também no Brasil”, diz Júlio. “Em um determinado momento nós olhamos para dentro de casa e pensamos: ‘será que não conseguimos fazer um produto nosso?’”. 

Eles já tinham em mente que não queriam fazer um ônibus, até para não concorrem com os clientes do serviço de engenharia. Foram ao mercado e viram uma explosão no e-commerce. Logo, mapearam a possibilidade de fazer uma van para entregas. Conversaram com gigantes do setor e identificaram, além da demanda, uma dor do setor: os veículos demoravam para serem carregados com a mercadoria, e o entregador demorava para deixar cada produto na casa do cliente. 

“Numa van tradicional, o cara precisa sair do veículo, caminhar até a porta traseira, abrir a porta. Aí quando ele pega a caixa, ele sai pela porta traseira. Precisa colocar a caixa no chão para fechar a porta. Não parece, mas é um processo demorado”. 

A ideia estava desenhada: fazer uma van elétrica capaz de facilitar o processo de entrega e atender uma demanda cada vez maior do varejo, das compras em casa. Só faltava o dinheiro.

Como a Arrow financiou o projeto

“Mas a gente não tinha dinheiro”, brinca Júlio.

A estratégia foi montar uma apresentação e bater na porta das grandes empresas de varejo e de logística, em busca de alguém confiante no projeto a ponto de comprar as vans antes delas ficarem prontas. 

“Depois de nos apresentar mais de 150 vezes, falamos com o Breno Campolina. Ele era um dos principais diretores da locadora Unidas, depois comprada pela Localiza”, diz Júlio. “Ele disse que o mercado precisava de nosso produto e ele tinha demanda. Decidiu comprar 100 unidades num prazo de 12 meses. Aceitamos o desafio”.

Ou seja, a Arrow tinha 12 meses para tirar do papel uma van existente, até então, nos cálculos dos engenheiros e no Power Point dos vendedores. Missão dada, missão cumprida. 

A empresa utilizou o aprendizado que já tinha da época da Marcopolo, encontrou fornecedores e mobilizou um time de engenharia enxuto, mas eficiente para o projeto. 

“Já tínhamos apanhado em algumas coisas, mas basicamente o que a gente fez foi mobilizar uma engenharia já pronta, um conceito desenvolvido, e desenvolver um projeto sem se preocupar com um motor enorme na parte frontal da van”, diz Jocilei. 

“Conseguimos lançar o Arrow One em 12 meses. Finalizamos ele em setembro de 2022 e o lançamos em novembro de 2022 na Fenatran”, afirma Julio. “Hoje, dois anos depois, somos uma empresa com investidores, conselho de administração e estruturados para crescer”.

Como é a van da Arrow

A Arrow projetou suas vans com três pilares: 

  • eficiência
  • sustentabilidade
  • design

A primeira inovação foi estrutural: ao contrário dos veículos tradicionais, cuja engenharia começa pelo motor, a Arrow iniciou seu projeto pensando no espaço para carga e na ergonomia do motorista. 

Sem um motor a combustão ocupando a frente, as vans da Arrow têm um para-brisa mais baixo e uma cabine ampla, onde o motorista pode se movimentar facilmente. "Entrar no nosso veículo é como entrar numa sala”, diz Júlio.

A configuração sem componentes mecânicos acima do assoalho também criou um design mais espaçoso. A Arrow One carrega 60% mais volume do que as vans tradicionais do mesmo tamanho, com um assoalho plano que facilita a organização das mercadorias. 

“Nosso veículo foi pensado para entregar mais rápido e ganhar eficiência”, diz. “A cada parada, economizamos em média um minuto. Multiplique isso por 180 entregas diárias e temos três horas a mais de produtividade”. 

Esse ganho de tempo foi validado em testes: enquanto uma van comum entrega cerca de 170 pacotes, a Arrow One entrega até 393 pacotes.

E aqui tem outro diferencial: para pegar uma mercadoria numa van tradicional, o entregador precisa sair do veículo, abrir o porta-malas e pegar a carga por lá. No sistema da Arrow, ele consegue acessar a carga internamente, como se fosse um motorista de ônibus indo para a área dos passageiros. Além disso, ele nem precisa deixar a carga no chão para abrir a porta. Uma pulseira com chip libera a porta assim que ele se aproxima de um botão. 

“Qualquer van elétrica vai proporcionar redução nos custos de combustíveis”, diz. “Para sermos competitivos, tínhamos que ter outro diferencial. E foi no tamanho do baú, que permite mais carga, e na agilidade para ter mais entregas”.

A van da Arrow tem autonomia de até 200 quilômetros por carga e economia de combustível de até 80% em relação ao diesel. A manutenção, em comparação com veículos a combustão, também é simplificada, com menos peças móveis e uma expectativa de vida útil de até 13 anos para as baterias, mesmo com recargas diárias.

Qual será o futuro da Arrow 

A Arrow está em fase de expansão acelerada e tem grandes ambições para o futuro. Em 2024, a empresa pretende dobrar sua produção para 100 vans e já projeta aumentar esse volume nos próximos anos com a ajuda de novos investimentos e uma terceira rodada de captação em andamento.

"Nosso objetivo é reduzir o tempo de entrega das vans, o que é essencial em um mercado tão competitivo", afirma Balbinot.

A internacionalização também faz parte dos planos, com estratégias voltadas para a América Latina. Hoje, a Arrow já tem um representante na Argentina e busca ampliar sua presença em mercados latino-americanos. 

Além disso, a Arrow explora o desenvolvimento de um modelo de van menor para diversificar seu portfólio.

Para sustentar o crescimento, a empresa investe no atendimento pós-venda e planeja reforçar a assistência ao cliente. 

“O mercado demanda não só a produção, mas um bom atendimento após a venda. Nosso time já acompanha os clientes para entender as necessidades específicas de cada operação. Esse cuidado com o cliente será essencial para sustentar nossa expansão”, comenta Balbinot.

Outro ponto de inovação envolve novas tecnologias no transporte elétrico e em automação, como veículos robóticos para logística interna. A Arrow está desenvolvendo sistemas auxiliares que visam otimizar o carregamento das vans e a conferência de mercadorias, o que deve tornar as operações de entrega ainda mais eficientes.

*A reportagem viajou a convite da Arrow

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