Gazprom: gasoduto Nord Stream é o principal fornecedor de gás da Alemanha (Gazprom/Divulgação)
Victor Sena
Publicado em 24 de fevereiro de 2022 às 17h38.
Última atualização em 24 de fevereiro de 2022 às 18h29.
Vladimir Putin é um homem com muitas armas. Além de todo o poder militar que o presidente da Rússia tem à disposição para forçar a geopolítica dançar um tanto como ele quiser, o ex-espião soviético e presidente há 20 anos também comanda um país que é uma potência energética.
A Rússia é segunda maior produtora de gás natural do mundo e a maior empresa do país é do setor. A Gazprom extrai, transporta e vende gás natural principalmente para a Europa. Ela tem capital aberto, mas é controlada pelo governo e vale US$ 63,8 bilhões.
Em 2020, as reservas do grupo totalizavam 33,5 bilhões de metros cúbicos de gás, o que correspondem a quase 16% das reservas mundiais de gás, só na mão desta empresa. Dados de 2020 mostram que no ano a sua receita foi de 6,3 bilhões de rublos. Ainda não há dados consolidados de 2021.
Além do dinheiro que a empresa tem garantido ao ex-império e república soviética, que já foi a segunda maior economia do mundo, a Gazprom tem sido uma arma soft nas mãos do governo Putin no aumento da influência que o país têm tido sobre o leste da Europa nos últimos dez anos.
Desde o fim da União Soviética, a Rússia considerava crucial manter alguns países que estão próximos a sua fronteira fora da aliança militar ocidental Otan.
Na madrugada desta quinta-feira, a Rússia começou a invadir a Ucrânia depois de ter reconhecido a independência de duas regiões separatistas na região leste do país. A ofensiva provocou clamor internacional, ao qual Moscou não deu ouvidos.
Após o ataque militar russo, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, decretou lei marcial no país. A medida derruba leis civis e as substitui por regras militares em todo o território nacional.
A Ucrânia vinha fazendo um movimento pró-ocidente e esta pode ser considerada uma das causas do atual conflito.
O primeiro motivo para a Gazprom ser considerada uma arma soft é o seguinte: países rivais da Rússia são fortes clientes da empresa, como Alemanha, Itália, Reino Unido e Turquia.
A outra razão é que a presença de gasodutos de distribuição que cortam o leste da Europa, atravessando o Mar Negro, a Ucrânia, Belarus e o Mar Báltico servem para a Rússia persuadir e influenciar a economia desses países.
Ao ser cortado por um gasoduto da Gazprom, o país recebe um "pedágio" em gás pago pela Rússia.
Assim, os projetos da Gazprom seguem mais a estratégia do governo que a de mercado. No caso da Ucrânia, desde 2014, o país não tem um governo alinhado com a Rússia, o que levou a Gazprom a acelerar novos gasojutos que contornem a Ucrânia com o transporte do gás.
A ideia é pagar menos taxas em gás aos ucranianos, atrapalhando sua economia, principalmente no inverno.
Uma das grandes apostas para a Gazprom ficar independente da Ucrânia é o Nord Stream 2, nome do gasoduto submarino que cruza o mar báltico da Rússia até a Alemanha, mas que teve o contrato encerrado pelo chanceler alemão Olaf Scholtz após as primeiras indicações de invasão da Ucrânia nos últimos dias.
Em 2019, a Gazprom e a empresa de energia ucraniana Naftogaz entraram em um acordo para atenuar os efeitos econômicos da diminuição do gás.
Em entrevista à The Economist — que alerta sobre os problemas que a empresa cria para si própria ao fazer essas escolhas por territórios — Jack Sharples, do Oxford Institute for Energy Studies, afirma que os investimentos da Gazprom são formas de "manter os europeus em alerta".
Apesar dos ataques a instalações militares ucranianas nesta quinta-feira e o clima oficial de guerra, o fornecimento de energia nos dois gasodutos que atravessam o país segue normal. Resta saber quanto a Europa ainda vai topar — e conseguir — ser cliente de uma empresa que faz parte do arsenal de Putin.