Nova York - Desmantelar o maior esquema Ponzi da história dos EUA não tem sido barato.
Seis anos depois do desmoronamento da fraude de Bernard Madoff, o custo de liquidar sua defunta empresa de assessoria em investimentos para indenizar milhares de vítimas superou US$ 1 bilhão, embora os ex-clientes do vigarista não estejam pagando a conta.
As compensações, pagas pela Securities Investor Protection, organização que conta com financiamento do setor e está administrando o caso, financiaram uma equipe de advogados que nesta semana ultrapassou US$ 10 bilhões em recuperações para as vítimas, quase 60 por cento do capital que desapareceu após a prisão de Madoff em dezembro de 2008.
Irving Picard, o advogado de concordatas que está liderando o esforço como administrador para a empresa de Madoff, incluiu o novo total de compensações em um relatório provisório publicado ontem no seu site.
Um juiz de concordatas em Manhattan aprova as compensações regularmente, às vezes ignorando as objeções de grupos de vítimas.
As vítimas, que acreditavam que seus investimentos estavam sendo utilizados para comprar títulos, receberam quase US$ 6 bilhões de Picard desde que ele começou a distribuir os fundos recuperados. A última distribuição, de cerca de US$ 349 milhões, foi feita em maio.
Origens na década de 1960
A fraude, que segundo os promotores começou ainda na década de 1960, envolveu milhares de páginas de operações e extratos de contas falsos para milhares de clientes.
Picard empregou centenas de profissionais para desembaraçar a falcatrua e determinar quem tinha reclamações validas e quem deveria ser processado, mostram registros do tribunal.
Picard, do estúdio Baker Hostetler em Nova York, recuperou o dinheiro mediante centenas de processos legais e acordos com os clientes de Madoff e com os bancos que se beneficiaram com o esquema, embora não estivessem cientes da falcatrua.
Muitos dos casos foram recorridos, alguns deles perante o Supremo Tribunal dos EUA. Apesar de que US$ 6 bilhões foram pagos, mais bilhões estão sendo reservados até que a resolução das demandas determine quem obtém o quê.
A equipe de advogados ultrapassou a cifra recuperada de US$ 10 bilhões em 17 de novembro após chegar a um acordo com dois fundos que canalizaram dinheiro para a fraude, o Primeo Fund e o Herald Fund, ambos com sede nas Ilhas Cayman.
Os fundos concordaram em pagar um total de US$ 497 milhões para finalizar os processos contra eles pelos saques que fizeram da empresa de Madoff.
Clientes particulares
Para pagar aos perdedores líquidos, o administrador também processou dezenas de clientes particulares que sacaram mais dinheiro do que tinham depositado em suas contas.
O velho amigo de Madoff, Edward Blumenfeld, um desenvolvedor imobiliário de Nova York que construiu uma fortuna investindo com o vigarista durante décadas, concordou em pagar US$ 62 milhões para terminar o processo contra ele – acordo aprovado pelo tribunal em 18 de novembro.
“São obscenas”, disse por e-mail Helen Davis Chaitman, advogada que representa algumas das vítimas no caso, sobre as compensações.
Chaitman, que diversas vezes contestou Picard nos tribunais, disse que os promotores federais recuperaram a maior parte do dinheiro para as vítimas e que Picard deveria pagar mais do que somente o capital.
Um júri federal em Manhattan declarou em março que cinco ex-funcionários de Madoff são culpados por auxiliá-lo na fraude durante décadas, com a criação de documentos de operações e extratos de conta falsos.
Eles foram acusados de atingir milhares de aposentados, investidores ricos, organizações de caridade e até mesmo familiares e amigos, e de se enriquecer no processo. A sentença dos cinco ex-funcionários está agendada para o mês que vem.
Madoff, 76, se declarou culpado de fraude em 2009 e atualmente cumpre uma pena de 150 anos em um presídio federal na Carolina do Norte.
Pelo menos outras sete pessoas se declararam culpadas de participar do esquema, entre elas seu irmão Peter Madoff, quem cumpre uma pena de dez anos.
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1. Ponzi e os cupons postais
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1/6 (Wikimedia Commons)
Em 1920, o ítalo-americano Charles Ponzi (foto) atraiu um sem número de clientes prometendo rentabilidade de 50% em apenas 45 dias. O negócio consistia na compra de cupons postais de outros países, trocados por selos nos EUA a um preço mais caro. Mas as despesas e prazos para conversão da moeda minavam qualquer rentabilidade expressiva. Ainda assim, o boca a boca alimentou o topo da pirâmide e por um bom tempo Ponzi remunerou os investidores antigos com o dinheiro dos que entravam no esquema - não deixando, é claro, de tirar uma boa parte para si próprio.
Quando o esquema entrou em colapso, descobriu-se que 160 milhões de cupons postais eram necessários para sustentar as margens que seduziam os investidores. Mas só existiam 27.000 no mercado. Condenado a anos de prisão, Ponzi posteriormente mudou-se para o Rio de Janeiro, onde morreu pobre em 1949. Seu nome carimbou o golpe de pirâmide, mundialmente conhecido como esquema de Ponzi.
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2. Engorda de gado nas Fazendas Reunidas Boi Gordo
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2/6 (foto/Site Exame)
No mais conhecido caso de pirâmide financeira do Brasil, 30.000 investidores perderam nada menos que 3,9 bilhões de reais. Seduzidos pela oportunidade de embolsar um lucro mínimo de 42% no prazo de um ano e meio, eles aplicaram suas economias nas Fazendas Reunidas Boi Gordo. A empresa chegou ao mercado em 1988, mas só começou a vender os chamados contratos de investimento coletivo (CICs) nos anos 90. A sistema se assentava na engorda de bois e criação de bezerros, mas os lucros repassados eram pagos sobretudo pela entrada de novos investidores no negócio.
Uma década se passou até que a empresa abrisse seu capital, exigência da CVM para que as atividades continuassem sendo exercidas. Ao longo desse tempo, multiplicaram-se os interessados no esquema. A Boi Gordo investiu inclusive em anúncios apresentados pelo ator Antônio Fagundes nos intervalos da novela “Rei do Gado”. Poucos anos depois a situação mudaria de figura: em 2001 a empresa não tinha mais dinheiro para honrar os resgates solicitados. A falência foi decretada em 2004, mas o processo ainda corre na justiça. Para indenizar os investidores, estuda-se a entrega das propriedades da Boi Gordo, transferindo-as para fundos em nome dos credores. Já o processo criminal instaurado contra o dono da empresa, Paulo Roberto de Andrade, foi cancelado pelo Superior Tribunal de Justiça em dezembro de 2009. Na CVM, a condenação sofrida por ele em 2003 combinou uma multa de mais de 20 milhões e a proibição de exercer o cargo de administrador de companhia aberta por 20 anos.
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3. Madoff e a fraude bilionária em Wall Street
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Dos mais altos círculos de Wall Street à sentença de 150 anos de prisão, Bernard Lawrence Madoff (foto) amealhou bilhões com o maior esquema de Ponzi da história. Considerado um dos mais bem sucedidos gerentes de investimento de Nova York, Madoff administrou os recursos de 16.000 vítimas, entre figuras carimbadas do show business, tubarões do mercado financeiro, instituições financeiras e bancos - inclusive brasileiros - em um negócio que funcionou por longos 16 anos.
O canto da sereia era a proposta de rendimento de 1% ao mês. Com a fama consolidada, novos clientes nunca deixaram de lhe bater à porta. Parte do dinheiro recolhido nunca foi investida. A outra parte servia para remunerar os que solicitavam o resgate. Estima-se que os investidores tenham perdido entre 12 e 20 bilhões de dólares ao longo dos anos. Em 2009, Madoff foi condenado por 11 crimes, entre fraude contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro e perjúrio.
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4. Avestruz Master e a criação de aves que não existiam
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4/6 (Getty Images)
Fundado em Goiânia em 1998, o grupo Avestruz Master oferecia contratos de compra e venda de avestruzes com compromisso de recompra dos animais. Assim, quem investisse em uma ave com 18 meses de vida, ganharia um retorno de 10% sobre a aplicação até o mês em que a avestruz fosse readquirida pela empresa. O lucro seria assegurado pela suposta exportação da carne. Mas o negócio propriamente dito jamais chegou a ir para frente: em sete anos de operação, nenhuma ave foi abatida. Na teoria, a Avestruz Master teria comercializado mais de 600 mil animais. Na prática, só possuía 38 mil.
Apostando antes na propaganda do que nas aves em si, o grupo conquistou 40.000 investidores no Brasil, 30.000 deles só no estado de Goiás. Para engordar a base da pirâmide, foram gastos 4 milhões de reais em publicidade em 2004 - e apenas 100.000 reais em ração para as avestruzes. Quando a pirâmide ruiu em 2005, a empresa fechou as portas e seus sócios fugiram para o Paraguai. Em 2010, a Justiça Federal condenou os dois filhos e o genro do dono da Avestruz Master a indenizar os investidores em 100 milhões de reais. Jerson Maciel, controlador do grupo, morrera dois anos antes da decisão. Os acusados também receberam penas de 12 a 13 anos de prisão. A execução da indenização, contudo, só irá acontecer quando todos os recursos judiciais tiverem se esgotado. Se executada, ela não será suficiente para cobrir o prejuízo total amargado pelos investidores, estimado em 1 bilhão de reais.
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5. Rentabilidade astronômica em fundo de Madoff mineiro
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5/6 (Stock Exchange)
Acusado de provocar um prejuízo que beira 100 milhões de reais, o mineiro Thales Emmanuelle Maioline montou seu esquema de Ponzi em Belo Horizonte. O produto oferecido - e comprado por 2.000 investidores - era a participação em um Fundo de Investimento Capitalizado (Ficap), que só existia de fato no site da empresa criada por ele, a Firv Consultoria e Administração de Recursos Financeiros.
Como os demais golpes do tipo, o fundo prometia um retorno de 5% ao mês acrescido de um bônus semestral. Mas depois que um investidor solicitou o resgate de 3 milhões de reais em julho de 2010, a pirâmide não conseguiu se manter de pé. Maioline desapareceu por 140 dias, sendo preso em dezembro do ano passado. Seu julgamento começou no dia 22 de junho deste ano e ainda não foi concluído.
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6. Clubes virtuais de sucesso na Agente BR
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6/6 (Stock Exchange)
Outrora corretora de câmbio, a Agente BR passou a ofertar clubes de investimento sem registro na CVM a partir de 2006. Sediada em São Paulo e controlada por Túlio Vinícius Vertullo, a empresa anunciava retorno mínimo de 5% ao mês com a aplicação em clubes de investimento virtuais. Com a exigência de um aporte que partia de 10.000 reais e da apresentação de convite para participar, o investimento ganhou ares de tesouro escondido. Mas a rentabilidade prometida - e provada via home broker da instituição - não passava de uma armação.
Embora a CVM tenha divulgado um alerta ao mercado sobre a irregularidade das operações, a empresa continuou funcionando até janeiro de 2009, quando sofreu intervenção do Banco Central. Estima-se que cerca de 3.000 investidores tenham perdido aproximadamente 100 milhões de reais.