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Cielo perdeu o CEO no meio da guerra das maquininhas

Eduardo Gouveia ficou um ano e meio no cargo, e alegou motivos familiares para deixar o posto. O ex-CEO, Rômulo Dias, está na concorrente, a PagSeguro

Cielo: logo após o anúncio da saída de Gouveia, as ações da Cielo chegaram a cair 7,8% (Paulo Fridman/Bloomberg)

Cielo: logo após o anúncio da saída de Gouveia, as ações da Cielo chegaram a cair 7,8% (Paulo Fridman/Bloomberg)

AJ

André Jankavski

Publicado em 13 de julho de 2018 às 15h53.

Última atualização em 13 de julho de 2018 às 16h12.

A saída prematura de um CEO é sempre um acontecimento traumático. Mas o inesperado anúncio da saída do presidente executivo da empresa de pagamentos Cielo, feito na manhã desta sexta-feira, não poderia vir em pior hora para a companhia. Eduardo Gouveia ficou um ano e meio no cargo, e alegou motivos familiares para deixar o posto. No lugar de Gouveia, assumirá interinamente Clovis Poggetti, atual vice-presidente executivo de finanças e diretor de relações com investidores. “Saio com sentimento de missão cumprida por ter dado passos firmes na direção correta”, anunciou Gouveia.

O problema é que a Cielo não é uma empresa habituada a surpreender negativamente seus investidores. O antecessor de Gouveia, Rômulo Dias, ficou longos oito anos no cargo, e entregou resultados contundentes – com ele no comando, em todos os anos a Cielo foi escolhida a melhor empresa de serviços do anuário Melhores e Maiores, de EXAME. É um grande contraste com um sucessor que deixa a empresa “na direção correta”. Pior: Rômulo Dias é hoje o presidente do grupo de mídia UOL, dono da PagSeguro, empresa de pagamentos que está revolucionando o mercado de pagamentos no Brasil e levou o setor a um período de concorrência inédito. A Cielo ficou sem comando no meio da guerra das maquininhas.

Logo após o anúncio da saída de Gouveia, as ações da Cielo chegaram a cair 7,8%. Com o decorrer do dia, os papéis se recuperaram e registraram alta de até 2%. Essa oscilação mostra bem o atual cenário da Cielo: os investidores sabem que a empresa apresenta bons resultados (é a líder de mercado com 50% de participação e transaciona o equivalente a 13% do PIB), mas estão preocupados com o futuro dela diante de uma concorrência mais forte de novatas como PagSeguro e Stone e também de bancos como o Itaú e o Safra.

Em janeiro, a PagSeguro abriu capital na Bolsa de Valores de Nova York e arrecadou 2,6 bilhões de dólares para investimentos. A Stone, por sua vez, conseguiu criar uma operação que é responsável por 1% de toda a movimentação do PIB brasileiro em apenas três anos de existência. Alguns dos segredos desses crescimentos foram a criação de novos serviços para pequenos e médios empresários, como a venda de maquininhas, além da diminuição da cobrança de taxas. A Cielo ainda é uma empresa de rentabilidade invejável, mas sentiu o baque.

No primeiro trimestre deste ano, a Cielo apresentou um EBITDA (lucro antes de impostos e amortizações) de 1,24 bilhão de reais, com uma margem de 44,6%. É a menor margem EBITDA da história – em 2013, chegou a 56,3%. “É uma empresa muito forte, mas os números têm ficado abaixo do esperado, o que está gerando muita apreensão”, afirma Pedro Galdi, analista da corretora Mirae Asset.

Gouveia, que foi vice-presidente de vendas da Cielo e depois comandou as operações da Multiplus e da Alelo, era visto como um executivo capaz de fazer a transformação digital da empresa e tinha o respaldo dos funcionários. “Enxergamos esta notícia como negativa, ainda mais com os desafios enfrentados pela Cielo”, dizem, em relatório, Luiz Azevedo e Silvio Dório, analistas do Safra. “Nós acreditamos que esta saída traz preocupações sobre os próximos resultados, que também deverão vir fracos.”

O banco UBS tinha previsto um período de turbulência para a Cielo. O momento da empresa foi comparado pela instituição suíça como uma “tempestade perfeita”. Mesmo com as aquisições feitas nos últimos tempos, como a de janeiro, quando comprou de 100% da Stelo, responsável pela venda de “maquininhas” para as PMEs, o UBS enxergava um inevitável enxugamento das margens. “A concorrência está apostando nos canais digitais e em descontos de preços agressivos para pequenas e médias empresas”, diz Frederic de Mariz, analista do UBS, em relatório.

A mudança de presidente ajuda a criar mais dúvidas sobre o futuro da Cielo. A justificativa de que as mudanças trazidas por uma nova liderança podem ajudar a empresa não convenceu os analistas do Credit Suisse, que nesta sexta-feira lembraram que foi o mesmo argumento utilizado quando Gouveia assumiu. Em uma conferência com analistas no início da tarde, a Cielo afirmou que a saída de Gouveia não tem ligação com os resultados do segundo trimestre (previstos para 30 de julho) e que o novo presidente pode vir do Bradesco ou do Banco do Brasil, que são controladores da companhia, mas também não descartou um executivo de mercado.

Poggetti, o presidente interino, terá um grande trabalho pela frente. Em 2018, as ações da Cielo caíram 32%. Para recuperar os números, a aposta passa por abocanhar fatias de pequenos e médios negócios, exatamente o nicho da PagSeguro. Segundo o Sebrae, existem 7,1 milhões de microempreendedores individuais e 3,9 milhões de micro e pequenas empresas no Brasil. Apenas 29% do consumo das famílias é feito por meio de cartões, seja fisicamente ou pela internet, de acordo com a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs).

Oportunidade, e competição, não faltam. Sem um presidente no comando, a vida fica ainda mais difícil.

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