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Cansado de ficar em casa, brasileiro procura lazer em hotéis nas capitais

Renda apertada faz com que hóspedes pesquisem mais; apesar da alta na demanda, queda na geração de empregos é pelo menos nove vezes maior do que em 2019

Hotéis em São Paulo e Rio percebem aumento da demanda - no entanto, muito ainda precisa ser feito para recuperar patamares de geração de emprego do pré-pandemia (divulgação/Divulgação)

Hotéis em São Paulo e Rio percebem aumento da demanda - no entanto, muito ainda precisa ser feito para recuperar patamares de geração de emprego do pré-pandemia (divulgação/Divulgação)

KS

Karina Souza

Publicado em 17 de novembro de 2020 às 08h19.

A pandemia alterou de forma radical os hábitos de consumo dos brasileiros. Com a redução de salários e a impossibilidade de sair de casa, esse setor foi o primeiro a ser cortado dos gastos no país, como aponta uma pesquisa nacional conduzida pela Boa Vista SCPC. Agora, meses depois do início da doença – e com a volta parcial às atividades, sem chance de viajar para fora do país – muitos têm recorrido aos hotéis como fonte de lazer, especialmente nas capitais.

De acordo com um levantamento feito pelo Booking.com, site de reservas para viagens, enviado com exclusividade à EXAME, quatro dos cinco destinos mais procurados pelos brasileiros em outubro foram capitais: Rio de Janeiro, São Paulo, Florianópolis e Curitiba. A única exceção é Gramado – que, ainda assim, está a pouco mais de cem quilômetros de Porto Alegre. Ainda de acordo com o Booking.com, os brasileiros são a nacionalidade campeã em atenção aos preços antes de ir viajar.

Entre os tipos de acomodação mais reservados, os hotéis são campeões, seguidos por pousadas e, por último, estão os apartamentos. Esses são os resultados brasileiros para a pesquisa, que entrevistou 20.934 pessoas em 28 países.

A mudança também foi sentida pela Zarpo, agência online de viagens focada no segmento de luxo. A companhia afirma que 50% das reservas para o réveillon estão em São Paulo e Rio de Janeiro, porcentual que era de 25% no ano passado.

A plataforma, que tem cerca de 500 hotéis cadastrados, já registra aumento de vendas em relação ao período pré-pandemia. “Vimos uma desaceleração progressiva de vendas até maio. Porém, de lá para cá, o otimismo do brasileiro voltou a subir e, em setembro, já superamos os patamares de vendas registradas no ano passado”, explica Daniel Topper, CEO da empresa, em entrevista à EXAME.

Fora do setor de hotelaria tradicional, a mudança também foi sentida de forma expressiva. Para Leonardo Tristão, presidente do Airbnb desde 2015, o tempo de estadia foi um fator importante a ser notado. Segundo o executivo, as pessoas de centros urbanos estão usando o Airbnb para fazer isolamento social – a procura por imóveis maiores e por mais tempo de estadia ajuda a confirmar essa tendência. Leia a entrevista completa com ele aqui

Da capital aos resorts: todo mundo quer ir pra perto de casa

Os hotéis trazem, na prática, o que as estimativas apontam - em maior ou menor grau. A Atlantica Hotels International, maior administradora de hotéis de capital privado da América do Sul, afirma que houve aumento de 100% da procura por hóspedes que moram na mesma cidade dos hotéis, passando de 6% para 12%. Quando a análise é da procura por pessoas do mesmo estado, o incremento também é significativo: passou de 24% no ano passado para 36% em 2020.

“Os finais de semana têm, normalmente, cerca de 25% a 30% menos ocupação do que os dias de semana em nossos hotéis. Nos últimos meses, essa diferença praticamente zerou e temos níveis de ocupação muito parecidos para finais de semana e dias de semana”, afirma Leonardo Rispoli, vice-presidente de Marketing, Vendas e Inovação da empresa.

O Grand Hyatt explica que, em São Paulo, os hóspedes paulistas chegam a representar 87% da demanda da filial paulistana; no Rio de Janeiro, a procura por hóspedes da própria Barra da Tijuca também aumentou consideravelmente. No Unique SP, 60% da demanda era formada por clientes internacionais em 2019 e, hoje, esse patamar está bem mais baixo – enquanto isso, a procura por famílias da capital compõe 80% do total de reservas do hotel. No Windsor, que tem 14 filiais no Rio de Janeiro, a expectativa é a de que os moradores de cidades mais próximas da capital representem 60% das reservas, comportamento atípico para essa época do ano.

Hotel Windsor, no Leme: estimativa de bons resultados no Réveillon (Divulgação/Divulgação)

Saindo um pouco da capital para explorar o interior, o Club Med nota que as unidades próximas ao Rio de Janeiro e São Paulo têm índices de ocupação significativamente maiores do que os de Trancoso – que exige deslocamento aéreo. Na unidade do Nordeste, 50% dos clientes vêm de São Paulo (índice menor do que o registrado em anos anteriores), enquanto a unidade carioca tem 54,4% dos clientes vindos do próprio Rio de Janeiro e a unidade próxima à capital paulista tem 90% dos hóspedes vindos da própria capital. Os índices são bastante diferentes dos registrados nos últimos anos.

Nos hotéis Accor, presentes em 132 municípios brasileiros e 25 estados do Brasil, o comportamento é semelhante. De acordo com André Sena, diretor de operações digitais e comerciais na empresa, houve crescimento constante das vendas do hotel a partir da segunda quinzena de março. “A gente vê destinos como São Paulo, Rio de Janeiro, Guarujá, Recife com aumento de clientes da própria região. São cidades em que a gente tinha uma grande concentração de pessoas viajando a negócios e que, hoje, procuram opções seguras de lazer nos nossos hotéis”, explica, em entrevista à EXAME.

Club Med: lucrando com lazer perto de São Paulo (Divulgação/Divulgação)

As estimativas também estão em linha com os dados mostrados pelo Penguim, aplicativo de turismo que conecta pessoas em busca de companhia para suas viagens, os destinos que tiveram maior crescimento percentual em relação ao mesmo período do ano passado foram: Rio de Janeiro (incremento de 96%), São Paulo (92% a mais), Campos do Jordão (crescimento de 66%) e Arraial do Cabo (crescimento de 38%).

Não foi só a taxa de ocupação que mudou - o perfil dos hóspedes também está diferente. Em São Paulo e no Rio de Janeiro, a mudança foi signitifcativa os hotéis Grand Hyatt e Unique – com foco direcionado a viagens a negócios, especialmente internacionais– e eles tiveram de se reinventar para atender à nova demanda.

Quem faz essas viagens?

Mesmo com a alta do setor, os consumidores em cada uma das regiões estão dispostos a gastar menos do que no ano passado. Uma pesquisa feita pelo IPC Maps, instituto de pesquisa especializado no potencial de consumo brasileiro, mostra o potencial de consumo da população residente em cada uma dessas regiões. O material foi feito a pedido da EXAME.

Ao analisar os quatro maiores municípios mostrados pelo estudo do Booking.com (São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Florianópolis), a região que tem a população com maior potencial para gastar é São Paulo, cuja estimativa é gerar R$4,5 bilhões com atividades de turismo ainda em 2020. Em seguida, estão: Rio de Janeiro (R$ 2 bilhões), Curitiba (R$ 902 milhões) e Florianópolis (R$ 185 milhões).

Ainda segundo o estudo, a maior parte dos gastos deve ser feita por pessoas da classe B em 2020. São Paulo, Florianópolis e Curitiba mostram essa tendência, sendo o Rio de Janeiro a única exceção (lá, a classe A deve somar a maior parte dos gastos).

Mais viagens = mais empregos no setor?

Ainda não. Mesmo com potencial de consumo maior, este ano, o setor de hotéis teve queda expressiva em geração de empregos. O saldo negativo pode ser observado nas quatro cidades – São Paulo, Rio de Janeiro, Florianópolis e Curitiba – sendo a capital carioca o principal destaque negativo.

No Rio de Janeiro, a diferença entre empregos gerados e demissões ficou em -6258 na região, número aproximadamente trinta e cinco vezes maior do que o registrado em 2019. Em seguida, está a capital paulista, com -4465, queda dez vezes maior do que a registrada no ano passado.

Por fim, aparecem Florianópolis (-1378), queda 6,5 vezes maior do que a do ano passado e Curitiba (-1146), queda 9,5 vezes maior do que a de 2019.

Os dados foram compilados pela Neoway, maior empresa de Big Data Analytics e Inteligência Artificial da América Latina, com base nas informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED) do IBGE.

Para Alfredo Lopes, presidente da Associação Brasileira de Hotéis no Rio de Janeiro, o setor deve se recuperar em torno de 15% localmente, mas a volta dos empregos deve acontecer somente em julho do ano que vem, dependendo de expectativas da vacina, carnaval e viagens internacionais. “Certo é que a gente deve ter uma recuperação nos meses de janeiro e fevereiro, mas o índice de empregos deve vir somente depois de medidas mais consistentes”, afirma.

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